Augusto Serafica, filipino, foi desde cedo atraído pelos negócios e pelos números. Em pouco tempo, tornou-se líder de um casino online, o que, enquanto católico, o deixou num dilema moral. Esta foi uma das histórias de transformação espiritual nos negócios relatada no 26ª Congresso Mundial de Empresários Católicos a decorrer até amanhã, sábado, na Universidade Católica, em Lisboa.
No primeiro painel dedicado à “Transformação pessoal para assumir um negócio como um chamamento”, Serafica, que agora lidera associações cristãs de empresários e outras organizações empresariais, contou como antes de 2010 trabalhava como um banqueiro de investimento. Pouco tempo depois passou a liderar um casino online.
“Isso para um cristão é um dilema, por um lado a responsabilidade para com os acionistas, do outro lado o nosso comprometimento como cristãos.”
Os amigos e conselheiros disseram-lhe que só tinha duas opções: ou deixava o lugar ou vendia a empresa. Acabou por sair para abraçar um projeto imobiliário e de energia renovável. Diz ter sido guiado por Deus. “Ele não quis que eu parasse, apenas que esperasse pela sua orientação.”
Atualmente, as renováveis que lidera estão perto de serem cotadas em bolsa e o seu plano é continuar a lutar por padrões de atuação diferente.
Antes o lucro, agora algo maior
Antes de Serafica subiu ao palco Michal Hrabovec, líder da tecnológica checa Anasoft, para partilhar que, aos 19 anos, tinha um sonho: “Queria construir uma empresa de sucesso. Pensava que seria simples porque sabia programar."
Isso foi há 27 anos, quando ligava a ideia de sucesso a ter muito dinheiro. Hoje sabe que não é assim. “O que descobrimos ao longo do processo é que ter sucesso não é ter muito dinheiro, é contribuirmos para a evolução do mundo.”
Nesse sentido, o empresário destaca várias áreas de ação, a primeira sendo atuar fora da zona de conforto, mas também assumir responsabilidades pessoais, porque um líder é a pessoa mais visível da empresa. “A cultura da companhia é baseada no que nos decidimos”, lembra.
Para Hrabovec, o empreendedorismo permite inspirar os outros, embora obrigue a evoluir todos os dias. “Os outros veem-me e eu tenho de dar o exemplo.”
Como líder tem ainda a obrigação de “promover a paz dentro e fora da empresa”. A terminar, aponta a humildade e a coragem como as outras duas características que um líder não pode perder, “para que o medo de mudar” não o congelem.
Do acidente à mudança
Amina Sansoui, muçulmana e marroquina, foi obrigada a mudar. A mudança chegou-lhe através de um acidente que lhe virou a vida do avesso. Caiu de uma ponte na Costa Rica durante umas férias. Ficou presa a uma cadeira de rodas.
Não foi o fim, mas o princípio de uma nova vida. Ela, que liderava uma empresa de comunicação, quis encontrar um propósito. E encontrou: o de alertar para os problemas que as pessoas com deficiência enfrentam no dia-a-dia em Marrocos.
Nesse contexto, Amina diz que o empreendedorismo social pode transformar a economia. “Uma empresa social põe o lucro ao mesmo nível do que o impacto social que tem.”
A empreendedora deixa um alerta para contrariar aquilo que ainda é uma realidade. “Uma pessoa com deficiência isola-se, há medo de ambos os lados. A arte de viver em conjunto é aceitar a diversidade”, lembra.
Uma proposta para gestores: amar
A proposta de João César das Neves, professor da Universidade Católica, passa pelo amor. Só esse sentimento faz fluir os negócios, na opinião do académico. “Ama o teu vizinho como a ti”, defendeu no encontro desta sexta-feira.
“O ensinamento central é o amor. Não é mais nada. Se eu for um grande líder, muito competente, mas não tiver amor, serei [Bernie] Madoff, porque só ouvirei a minha voz”, concretizou.
O professor diz que é mais fácil amar a humanidade do que o vizinho, porque esse materializa-se no cliente, no fornecedor e no acionista. “Mas é aí", ressalta, "que temos de olhar para Deus e pensar que ele ama todos de igual forma. E através do amor de Deus amar o próximo.”
No início da sessão, o Cardeal Patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, antes da oração de boas-vindas, quis sublinhar aos congressistas que um crente “sabe não estar no princípio e no fim das coisas”.
“Para um cristão o negócio é vocação e Jesus chama-nos a colaborar com ele”, rematou.