João Gouveia, ex-"Dux" da Universidade Lusófona, e a própria instituição foram absolvidos pelo tribunal de Setúbal do pagamento de indemnização aos familiares das vítimas da tragédia no Meco, em 2013.
A informação chegou através de comunicado do Tribunal da Comarca de Setúbal, no qual se lê que a juíza titular do processo declara “totalmente improcedentes os pedidos deduzidos nos autos pelos autores [pais das vítimas], absolvendo-se os réus”, universidade e "Dux", na altura dos acontecimentos.
“Declara-se improcedente o pedido de condenação dos autores por litigância de má fé”, acrescenta a nota.
Lusófona e João Gouveia são, assim, absolvidos neste julgamento através do qual os pais dos estudantes que perderam a vida na praia do Meco na sequência de uma praxe pretendem assacar responsabilidade à universidade e a João Gouveia.
Em causa estão seis petições iniciais – o número de vítimas – na quais se pedia uma indemnização no valor global de cerca de um milhão e 350 mil euros .
Vítimas recorrem. “Vamos ganhar este processo”
O advogado dos pais das vítimas, Vítor Parente Ribeiro, afirma não estar surpreendido com a decisão do tribunal de Setúbal e lamenta ainda ter sido notificado e saber da decisão pela comunicação social.
“A postura do tribunal desde o primeiro dia dava a entender esta decisão e até já tinha alertado os pais”, reconhece, em declarações à Renascença.
“Os magistrados são pessoas com convicções pessoais e vida para lá dos tribunais, e veem os acontecimentos de modo muito próprio, que não é aquela com que os pais e eu, como advogado, os vejo”, explica.
“Os factos dos pais tinham de ser dados como provados. Não fico surpreendido, mas custa-me a perceber como um juiz parcial e isento proferiu esta decisão. É perfeitamente natural estas discordâncias e por isso vamos recorrer”, avança, considerando que tal “é inevitável”.
“Agora para a Relação, porque o procedimento assim o obriga. O processo é para levar até ao fim”.
Vítor Parente Ribeiro mostra-se confiante. “Nós vamos ganhar este processo no Supremo Tribunal de Justiça, onde os juízes são mais experientes. Não tenho dúvida nenhuma”.
“Aquilo que está em discussão neste processo tem uma abrangência social tão grande que os juízes não podem todos estar com os olhos vendados”, justifica.
Tragédia tem quase 8 anos
Foi em dezembro de 2013 que seis estudantes da Universidade Lusófona na praia do Meco, na sequência de uma praxe que decorreu na madrugada de dia 15. O mar estava revolto e os jovens foram levados pelas ondas.
João Gouveia acabou por ser o único sobrevivente daquela noite.
Logo a 16 de dezembro, após a descoberta do corpo de Tiago Campos, foi aberto um inquérito às circunstâncias da morte dos jovens, que viria a ser arquivado em julho de 2014 sem indícios de crime e sem culpados. Segundo a Polícia Judiciária, tratou-se de um acidente.
Mas o caso foi reaberto em outubro de 2014, com João Gouveia a ser constituído arguido. Em março de 2015, o tribunal decidiu não enviar o caso para julgamento.
Após recurso das famílias, o Tribunal da Relação de Évora concordou que o caso não devia ir a tribunal, alegando que as vítimas eram adultas e não haviam sido privadas da sua liberdade durante a praxe, pelo que não havia responsabilidade criminal sobre João Gouveia.
Em 2016, as famílias dos seis jovens falecidos interpuseram seis ações cíveis contra o ex-"Dux" e a COFAC – Cooperativa de Formação e Animação Cultural, CRL (Universidade Lusófona).
Em cada uma delas é pedida uma indemnização de cerca de 225 mil euros, o que perfaz um valor global de 1,35 milhões de euros.
Nesta sexta-feira, o tribunal emitiu uma decisão, absolvendo João Gouveia e a universidade.
Uma única vitória
No final do ano passado, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos deu razão aos pais e o Estado português pagou, em outubro de 2020, os 13 mil euros a José Soares Campos, pai de Tiago Campos – a primeira vítima do caso Meco a ser resgatada do mar.
A queixa tinha sido apresentada em maio de 2016, em representação de todos os outros pais, alegando que “a morte do filho tinha sido causada pela falta de um enquadramento legal que regule as atividades de praxe nas universidades portuguesas”.
José Soares Campos queixava-se ainda que a “investigação às circunstâncias da morte do seu filho não tinha sido eficaz”.
Os juízes europeus não deram razão à questão da praxe, mas admitiram a existência de falhas na investigação do caso. O Estado recorreu sem sucesso e não conseguiu reverter a condenação.