Partidos reprovam vandalização da estátua do padre António Vieira
12-06-2020 - 19:29
 • Renascença com Lusa

Uns falam de "vandalismo ignorante" ou "ideologia intolerante", outros dizem que alguém tentou descridibilizar o movimento antirracismo e ainda há quem peça a criação de uma "equipa policial especial" para impedir que o episódio se repita.

A maioria dos partidos com representação no Parlamento já condenou a vandalização, com a palavra "descoloniza" grafitada a vermelho, da estátua do padre António Vieira, em Lisboa.

No espaço de comentário do programa As Três da Manhã, da Renascença, o socialista Fernando Medina, presidente da Câmara de Lisboa, salientou que foi um ato de "vandalismo ignorante".

"Se há figura que espelha, muito fora dos ares do seu tempo, uma dimensão humanista e de tolerância, num tempo em que isso não era de todo regra com os índios, é precisamente o padre António Vieira, que é uma figura maior do nosso pensamento e da nossa história", salientou o autarca.

Medina acrescentou que “sobre outras figuras pode haver até bastante mais debate, sobre o padre António Vieira não”, pois “está muito documentado, muito consolidado, muito entendido para quem conhecer”.

O vereador social-democrata João Pedro Costa classificou, no Facebook, a vandalização da estátua como um “ato criminoso, de uma ideologia intolerante” e anunciou que o PSD vai apresentar uma moção de condenação, na próxima reunião da Câmara.

“Algum peixe, provavelmente um torpedo (um peixe que faz tremer o braço aos pescadores), quis lembrar quanto o Sermão de Santo António aos Peixes é atual", escreveu o vereador.

BE, CDS e PCP em harmonia por razões diferentes


Em Braga, à margem de uma reunião com a Comissão de Trabalhadores da Bosch, a coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, sugeriu que, na verdade, a "pichagem" da estátua pode ter sido uma tentativa de "descridibilizar o movimento antirracista, que é um movimento muito sério, muito necessário, pela igualdade e pela dignidade".

“Não faço a mínima ideia de quem é que achou boa ideia fazer uma pichagem na estátua. Essa seria sempre a pior forma de lançar o debate”, criticou.

Catarina Martins preferiu enaltecer os "milhares de jovens que saíram à rua pelos direitos humanos, para combater o racismo, pelos milhões que em todo o mundo querem que as pessoas sejam respeitadas, querem direitos humanos iguais".

O presidente do CDS, Francisco Rodrigues dos Santos, repudiou a vandalização da estátua do "maior vulto da língua portuguesa do século XVII" e garantiu que o seu partido estará sempre "na linha da frente na proteção da História e da memória coletiva, contra julgamentos morais sobre o passado, contra o vandalismo e este tipo de manipulações".

"O CDS repudia veementemente a onda de vandalismo e terrorismo cultural que, infelizmente, parece ter chegado a Portugal pela mão de uma extrema-esquerda mimada, ignorante e que não dá a cara", salientou, à margem de uma visita a uma unidade hoteleira na Marina de Vilamoura, no concelho de Loulé.

Rodrigues dos Santos lamentou a "agressão perpetuada por estes grupos movidos pelo ódio, pelo radicalismo e pelo terrorismo cultural que pretendem julgar a história com base em ideologias recentes e reescrevê-la baseada em anacronismos".

O líder do CDS insistiu que "deve ser exercida a lei e a ordem", para que estes comportamentos "sejam censurados do ponto de vista público e não se voltam a repetir".

O PCP também condenou o ataque à estátua do padre António Vieira, pelo ato de vandalismo em si e por “exacerbar sentimentos e conflitos” que “só servem objetivos reacionários”.

“Importa não permitir que este ato sirva para animar e inculcar na sociedade portuguesa um clima de conflitualidade racial sem sentido, iludindo o que o colonialismo representou do ponto de vista económico e de classe em toda a sua dimensão”, lê-se num comunicado do gabinete de imprensa dos comunistas.

Para o PCP, “impõe-se hoje, como no passado, combater os fenómenos racistas e xenófobos e não alimentar atitudes que invocando combatê-los só contribuem para os promover” e “garantir os direitos económicos e sociais para todos, independentemente da sua etnia ou nacionalidade".

“Esta é uma luta dos trabalhadores e do povo que exige unidade e convergência e não elementos de divisão e conflitualidade que só contribuem para a enfraquecer”, concluem os comunistas.

Chega quer "equipa policial especial", PAN reprova vandalismo


O deputado único do Chega perguntou ao Governo que medidas prevê para "reprimir e prevenir" atos de vandalismo a estátuas e monumentos "de elevada simbologia histórica e cultural", e questionou se está em perspetiva criar uma "equipa policial especial" para lidar com este fenómeno, "sem dar hipótese de réplicas".

Numa pergunta entregue no Parlamento, e dirigida aos gabinetes do primeiro-ministro e do ministro da Administração Interna, André Ventura, que é também líder demissionário do Chega, refere que os atos em causa são "inspirados em movimentos internacionais completamente alheios à realidade portuguesa".

"Alguns grupos de ativismo fanático ou pura e simplesmente marginais, insistem num ataque sem precedentes à nossa memória coletiva, perpetrando ações vergonhosas contra a nossa história, para além dos avultados prejuízos materiais", refere Ventura, para quem cabe ao Estado o dever de "proteger e valorizar o património cultural do povo português".

Em comunicado por vídeo, a líder parlamentar do PAN, Inês Sousa Real, sublinhou que "jamais obteremos uma resposta naquele que foi um ato absolutamente censurável como vandalizar a estátua do padre António Vieira”.

A deputada do PAN lamentou o “ato de vandalismo”, um crime e “um atentado” ao “património histórico e cultural do país”.

“Assenta num erro profundo de desconsiderar aquela que foi a luta de padre António Vieira contra a forma como os escravos negros eram tratados no Brasil e eram tratados também os povos indígenas”, afirmou.

Inês Sousa Real sublinhou que “não se combate qualquer forma de racismo, de violência, xenofobia com este tipo de atitudes”: “Deitar abaixo estátuas não é o caminho."