Foi um dos pontos-chave da passagem de Barack Obama pela Alemanha. O Presidente dos Estados Unidos sublinhou a importância das relações comerciais transatlânticas e mostrou esperança num fecho do novo tratado - o TTIP - até ao fim do seu mandato, mas António Vitorino não acredita muito: “É excesso de optimismo. Não será assinado até ao fim do mandato de Barack Obama. Não creio que estejamos em condições de fechar as matérias que estão em cima da mesa”, declara o antigo comissário europeu.
“Nas negociações internacionais, há sempre uma hipótese de fechar a um quarto ou a metade para satisfazer a dinâmica negocial. Mas, para ser sincero, o essencial do TTIP não vai ficar fechado até ao final do ano, mesmo que se chegue a um acordo parcial, intercalar, que será a meio caminho ou um quarto de caminho”, sustenta Vitorino na Renascença.
Pedro Santana Lopes é da mesma opinião, apesar de estar optimista em relação ao acordo final: “ É difícil estar pronto antes do final do mandato. E há o hiato depois da posse, a necessidade de esperar pela entrada da nova administração americana”, complementa o antigo Chefe de Governo português.
Tratado muito criticado nos dois continentes
As resistências que o tratado vai encontrando na Europa estão a travar o processo negocial, admite António Vitorino: "A questão do comércio é muito importante para os dois lados do Atlântico. E temos que ser suficientemente realistas para reconhecer que em importantes países europeus, como a Alemanha ou a França, há uma posição das respectivas opiniões públicas muito negativa em relação ao tratado de comércio que está a ser negociado com os Estados Unidos”, afirma o antigo comissário europeu.
António Vitorino sublinha alguns “ sinais muito preocupantes” que vêm dos Estados Unidos, no contexto das primárias para as nomeações dos candidatos dos partidos republicano e democrata à Casa Branca. "Donald Trump e Bernie Sanders fazem um discurso demagógico contra o comércio livre. E curiosamente a senhora Clinton já começa a dar alguns sinais - pode ser táctica eleitoral, mas é um tema suficientemente sensível para ela começar a dizê-lo - que não está de acordo com o TTIP na sua formulação actual. Deixa ali uma pequenina porta aberta para vir a rever essa posição”, observa o antigo ministro socialista.
Obama contra o Brexit “pode ser um tónico neste momento para toda a União Europeia"
Pedro Santana Lopes e António Vitorino analisam também as mensagens deixadas pelo Presidente dos Estados Unidos na visita da última semana a Alemanha e a França, marcada pela defesa da unidade europeia e pelo apelo à manutenção do Reino Unido na União Europeia.
O antigo Primeiro-ministro Santana Lopes encara o apelo de Barack Obama contra a saída do Reino Unido da União Europeia como uma declaração de estímulo para toda a Europa e considera que mensagem trazida pelo Presidente dos Estados Unidos a Londres, no quadro da sua recente visita à Europa, pode ter ressonância continental.
“A declaração foi surpreendente pela força e assertividade. Barack Obama pode não ser forte a decidir mas, como sabemos, é forte a falar. Trazia a mensagem estudada, que reflecte a posição da administração norte-americana e foi muito clarificadora. Pode ser muito importante. A declaração é até um tónico, em certa medida, para este momento da União Europeia, realçando a importância da permanência do Reino Unido na União Europeia”, afirma Santana Lopes na Renascença.
António Vitorino subscreve a importância da declaração do Presidente norte-americano, mesmo na sequência de muitas outras feitas no mesmo sentido pela administração americana. "Desta vez teve o efeito de ser feita no próprio Reino Unido, várias vezes e de forma muito enfática. O que é também um sinal da necessidade que havia dessa declaração. Manifestamente, o primeiro-ministro Cameron estava numa posição de alguma fraqueza. E já as sondagens desta semana notam uma ligeira vantagem a favor da permanência do Reino Unido”, observa o ex-ministro do PS.
Para o antigo comissário europeu, Obama acaba de retirar aos defensores da saída do Reino Unido uma tese baseada numa relação especial alternativa do Reino Unido com os Estados Unidos.
“Aquela frase brutal do Presidente Obama, dizendo que se saírem da União Europeia vão para o fim da fila em termos de tratados de comércio, é uma frase que dita assim, a frio, é de uma enorme brutalidade. E é um seríssimo revés para aqueles que defendem a saída do Reino Unido da União Europeia”, complementa Vitorino.