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Abastecer o automóvel ou comprar gás em Espanha é um hábito antigo para quem vive perto da Fronteira de Vila Verde da Raia, em Chaves.
Numa antecipação à medida anunciada pelo Governo, que vai limitar a circulação de pessoas nos próximos 15 dias, para reduzir os contactos e conter a epidemia de Covid-19, muitos foram os portugueses a dirigirem-se, esta sexta-feira manhã, para Espanha.
Rodolfo Gonçalves, de 59 anos, veio de Vidago e aguarda na fila no posto de combustível, em Feces de Abajo, para ser atendido. “Aproveitei para vir cá hoje, porque vão fechar as fronteiras e fechando um mês já fico governado”, diz à Renascença.
Além de abastecer o automóvel, Rodolfo vai “comprar tabaco e duas botijas de gás”. “Tenho lá cinco e fico com sete, já dá para me governar, sem precisar de comprar lá [em Portugal], que é mais caro”, explica, acrescentando que em duas garrafas de gás poupa 19 euros. “Em gasóleo, tabaco e gás, ganha-se quase o dia, vale a pena”, afirma.
Também António Borges, de 63 anos, vem abastecer o automóvel e levar duas botijas de gás para o filho. Já veio antes, conta à Renascença, abastecer outros automóveis.
“Agora encho este depósito e levo o gás para o meu filho, mas já tenho os três automóveis com o depósito cheio, o que me dá para um mês”, afirma este habitante de Vilarelho da Raia que compreende as limitações para conter “esta doença terrível”, embora lamente não poder deslocar-se a Espanha, “onde é tudo mais barato”.
Apreensão do lado português com a medida “necessária”
A contrastar com a azáfama no posto de combustível, em Feces de Abajo, observamos o silêncio e a falta de movimento do lado português, onde os comércios junto à fronteira, na sua maioria na área do mobiliário, se mantêm de portas encerradas.
Já em Vila Verde da Raia, onde cafés e restaurantes vão servindo para fora, teme-se o futuro e o agravar das dificuldades com a ausência de espanhóis.
Susete Grilo servia no seu restaurante, em média, 120 refeições diárias, agora conta pelos dedos da mão o número de clientes. “Os espanhóis deixaram de vir quase há um ano. Estamos a servir meia dúzia de refeições e agora ainda vai ser pior. Não sei até que ponto isto se vai aguentar”, desabafa.
O mesmo desabafo é expresso por Alexandre Martins, de 21 anos, que antes acolhia no café muitos espanhóis e agora vive apenas dos poucos clientes da aldeia que serve à porta, mas apenas com produtos de padaria ou pastelaria.
“O controlo na fronteira não vai fazer muita diferença, porque há muito que os espanhóis não vêm, a não ser um ou dois trabalhadores transfronteiriços, mas isto está a ficar muito mal e eu temo pelo futuro, porque isto vai gerar uma grande crise económica”, diz.
Por perto está Olímpia Paiva, de 59 anos, a conversar com uma amiga sobre as limitações à circulação. “Isto é muito complicado, porque estamos habituados a ir ao lado de lá às compras, sobretudo ao gás e ao gasóleo e não vamos poder ir”, diz à Renascença.
Mas este não é o maior inconveniente para esta habitante de Vila Verde da Raia. O maior mesmo é “não poder ir fazer limpezas ao outro lado”. “Tenho pena de não ir fazer as limpezas, porque me dava muito jeito, mas a saúde está em primeiro lugar”, remata.
“É preferível estarmos agora durante um longo tempo fechados, e depois ir libertando aos poucos e abrirem-se as portas a novas perspetivas, do que andar a fechar aos bocadinhos”, defende Carlos Areias.
O empresário do ramo da pastelaria considera mesmo que a decisão de condicionar as fronteiras “peca por ser tardia”. “Devia ter sido há mais tempo. Estamos sempre à procura do prejuízo. Deixamos agravar as coisas e depois é que encerramos. Devíamos jogar por antecipação, como se faz no futebol”, conclui.
O Governo vai limitar a circulação de pessoas nos próximos 15 dias, através das fronteiras terrestres, aéreas e fluviais, salvo situações excecionais.
Entre as exceções à regra está a “circulação de trabalhadores transfronteiriços, mercadorias internacionais e viagens impreteríveis por motivos de saúde ou regresso a casa de cidadãos que vivam em Portugal”.
A medida que entra em vigor às 00h00 do dia 31 de janeiro, visa reduzir os contactos e a conter a epidemia de Covid-19.