A Associação de Médicos de Saúde Pública pede mais atenção ao aumento da taxa de mortalidade entre os idosos, numa altura em que Portugal atravessa uma terceira onda de calor.
Em declarações à Renascença, o presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública admite que, se nada for feito, podemos assistir a um novo crescimento da mortalidade.
“Se não tivermos capacidade de apoiar os mais vulneráveis, nas próximas semanas, podemos voltar a assistir a um aumento da mortalidade”, afirma Gustavo Tato Borges.
Em junho, Portugal teve a taxa mais elevada de todos os Estados-membros, tendo registado 24% - um valor quatro vezes superior à média europeia.
Gustavo Tato Borges considera óbvia a relação causa-efeito entre as vagas de calor e o aumento da mortalidade, no entanto, salienta que não será a única causa. “Encontro três razões, na área da saúde, para o aumento da mortalidade desde o início do ano: primeiro, dois picos grandes de mortalidade associados à covid (janeiro/fevereiro e abril/maio), as ondas de calor também aumentaram o número de óbitos nestes períodos em que ocorreram e, depois, uma realidade de descontrolo da maioria das doenças cronicas por força de dois anos de combate à pandemia, em que o acesso aos cuidados de saúde ficou mais restrito e foi mais difícil”, justifica.
O especialista em saúde pública alerta ainda que, além da saúde, há questões económicas que contribuem para essa mortalidade: "Estamos numa situação de recessão económica, temos a inflação a crescer, os preços dos bens essenciais sempre a aumentar e temos idosos em situação económica muito frágil que tiveram de optar entre comprar comida ou comprar medicamentos e, como é óbvio, compraram comida e a sua situação de saúde ficou ainda mais frágil”.
Para Tato Borges, a proteção deveria requerer uma surgir antes do início destas ondas de calor, através de uma intervenção mais robusta.
“A única opção que poderíamos ter, e que eu vejo, era uma intervenção muito mais incisiva e até restritiva de alguns dos nossos cidadãos, retirando-os das suas casas e colocando-os em locais de abrigo, com temperatura climatizada ou haver uma intervenção muito mais robusta, e não há recursos humanos disponíveis, para poder acompanhar os idosos mais isolados e poder levar-lhes água, medicamentos, haver apoios de cabazes alimentares, porque temos uma população envelhecida".
Segundo o presidente da ANMSP, “Portugal tem a população mais envelhecida de sempre a enfrentar ondas de calor agravadas pelas alterações climáticas”, o que se reflete numa “situação de maior fragilidade do que alguma vez tivemos”.
Sobre um eventual agravamento da mortalidade no inverno, Tato Borges refere que não crê que se verifique “um agravamento da mortalidade acima daquilo que é o normal para os meses de inverno, porque temos uma quantidade de população limitada que possa continuar a ser vulnerável a estas patologias e situações”.
“Portanto, tem de haver um momento em que a mortalidade voltará a normalizar, mas o inverno, com o frio, é sempre uma altura de maior atividade de patologias respiratórias e espera-se uma nova onde de covid”, recorda o especialista, reiterando que Portugal deveria organizar-se por forma “a prevenir estas situações nas suas diversas vertentes”.