A fotojornalista Monique Jaques documentou, durante cinco anos, o dia a dia de jovens e mulheres palestinianas de Gaza. O resultado pode ser visto a partir desta sexta-feira no Parque das Nações, em Lisboa.
As jovens retratadas têm entre os sete e os 23 anos e a exposição dá o arranque ao programa "Abril em Lisboa", promovido pela empresa municipal EGEAC.
Monique Jaques - nascida nos Estados Unidos e residente na Turquia - chegou pela primeira vez àquele "sítio extremamente difícil" em 2012, "para cobrir o conflito, como qualquer outro jornalista". Aí conhece uma jovem que a convida a ficar, vive com a família dela, tornam-se amigas e é ela que a apresenta a muitas outras meninas e mulheres de Gaza.
"Apercebi-me de duas coisas: todas as imagens eram de violência e todas as imagens eram de homens", recorda. "Isto não é o que vejo", percebeu. E decidiu fazer diferente.
"É uma sociedade islâmica extremamente conservadora, se comparada com a Turquia, ou mesmo com a Cisjordânia. Há a ideia de que as mulheres não devem ser fotografadas", conta, em entrevista à agência Lusa, durante uma pausa na montagem da sua primeira exposição, em Lisboa.
De acordo com a fotojornalista, de 32 anos, o mais fácil foi fotografar as palestinianas em crianças, contrariamente ao que se possa pensar no Ocidente. "Quando são mais velhas, é mais difícil", realça, recordando a jovem que fotografou a surfar e que viu passar da infância à idade adulta. Casou-se, cobriu-se, teve um filho e nunca mais pôde deixar-se fotografar.
Alguns dos seus amigos dizem-lhe que este território palestiniano (uma estreita e sobrelotada faixa de terra encravada entre Mediterrâneo, Egito e Israel) se "está a abrir mais", e que as redes sociais trouxeram "todo um mundo para as mulheres". Mas na prática, "estão limitadas no que podem fazer, não é muito seguro saírem para se manifestarem". Mas "muitas 'blogam'", porque perceberam que "a melhor forma de contribuírem para a mudança é falarem e contarem as suas histórias", conta.
O trabalho publicado no livro "Gaza Girls: growing up in the Gaza Strip", que dá o mote à exposição, resulta do que as fotografadas registaram em diários íntimos, a partir dos quais a fotojornalista premiada trabalhou.
"É uma história universal sobre crescer e decidir que tipo de mulher, que tipo de pessoa se quer ser", resume, sublinhando que "temos todos os mesmos instintos básicos e desejos". Ser uma jovem adolescente em Gaza "é muito complicado", mas, afinal, "elas também querem viajar, ver o mundo e depois regressar a casa".
Num mundo "perfeito", Monique gostava de exibir o seu trabalho na Palestina, mas "Gaza não está preparada". Não há sequer um historial de convivência com a arte ou a fotografia no território, oprimido entre o radicalismo do Hamas e a prepotência do Estado de Israel.
"Talvez volte [a Gaza], para mais agora com os protestos... não sei. É o mesmo que abandonar a família. Trabalhei com elas cinco anos, não dá para dizer que nunca mais as verei", admite.
"É muito difícil não nos transformarmos em ativistas em Gaza, onde não há água, nem eletricidade, nem medicamentos, mas sou jornalista e foquei-me no trabalho que estava a fazer", explica. "É muito difícil ser otimista sobre a situação, porque parece que ninguém, de nenhum dos lados, quer mesmo resolver a questão. O que é triste, porque, no final do dia, são pessoas como estas miúdas que realmente sofrem, e não os políticos", critica.
Monique ainda está concentrada em divulgar este trabalho, mas depois é possível que olhe para "o pesadelo" da América, onde nasceu. E continuará a apontar o dedo ao que está mal. Por exemplo: as escolas de fotojornalismo estão cheias de mulheres, que depois não chegam a fotojornalistas profissionais. "É um clube de homens", retrata.
"Somos mais sonoras e estamos a fazer muito barulho, as pessoas estão a ouvir, porque têm de o fazer, alguns editores foram afastados na sequência do '#metoo' [movimento viral que começou em outubro de 2017 e tem chamado a atenção, através das redes sociais, para o fenómeno do assédio sexual e da discriminação laboral]", constata. "Mas acredito na ação. Não são precisas declarações, basta contratar mais mulheres", sugere.