Apesar das críticas da magistratura, o Ministério da Justiça (MJ) defendeu, esta quarta-feira, que não ocorreu nada que justifique adiar a entrada em vigor do novo modelo de distribuição processual, o que acontece na quinta-feira.
Em resposta à Lusa, sobre as críticas nas últimas semanas das magistraturas judicial e do Ministério Público relativamente ao impacto das novas regras de sorteio de processos, o MJ declarou que "não tendo ocorrido qualquer circunstância nova que o justifique, os novos procedimentos de distribuição instituídos pelas Leis n.º 55/2021 e 56/2021 entrarão em vigor na data prevista", ou seja, quinta-feira, 11 de maio.
Acrescenta que estão a ser desenvolvidos "trabalhos preparatórios" junto dos Conselhos Superiores da Magistratura e da Ordem dos Advogados, "designadamente ao nível da formação de todos os intervenientes, para garantir que o processo decorra de forma articulada", mas reconhece "o impacto potencial da implementação destas leis sobre o funcionamento quotidiano dos tribunais".
Esse impacto, reiterou o MJ, dará origem a "uma avaliação, por uma entidade independente, da aplicação prática do regime legalmente estabelecido, decorridos seis meses da sua total operacionalização, para identificar eventuais constrangimentos e oportunidades de melhoria".
"Foram introduzidas as alterações no sistema informático adequadas à implementação das leis, nomeadamente o sorteio dos adjuntos nos tribunais superiores. Para além disso, no prazo máximo de quatro meses, serão progressivamente disponibilizadas novas funcionalidades que permitam praticar, ou agilizar a prática, de alguns atos, nomeadamente a elaboração eletrónica da ata que documenta as operações de distribuição", precisou o MJ na nota enviada à Lusa.
Acrescenta ainda que nesses quatro meses vão continuar a ser aplicados desenvolvimentos tecnológicos, que vão permitir publicitar o algoritmo utilizado, o que não sendo uma obrigação legal, frisou o MJ, "representará um acréscimo de transparência".
Na terça-feira, o Sindicato dos Funcionários Judiciais deu conta da indisponibilidade do sistema informático dos tribunais, Citius, algo que atribuiu à entrada em vigor na quinta-feira das novas regras de distribuição processual, mas que o MJ desmentiu de imediato, o que hoje repetiu, insistindo que a paragem de cerca de 20 minutos no sistema se deveu a "um problema num equipamento" e que após a sua atualização o sistema retomou o normal funcionamento.
As leis que alteram as regras de distribuição processual foram aprovadas pelo parlamento em 2021 e esperaram mais de um ano pela portaria que as regulamenta, que foi publicada em Diário da República no final de março e entra quinta-feira em vigor.
A publicação da portaria aconteceu uma semana depois de o presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP), Manuel Soares, no encerramento do congresso dos juízes que decorreu no Funchal, ter criticado de forma veemente a ausência dessa regulamentação que estava a permitir situações "de verdadeira chicana processual", com dezenas de pedidos de recusa de juiz alegando falta de regulamentação.
No mesmo dia da publicação em Diário da República, a ASJP tornou públicas as suas preocupações com alguns aspetos da portaria, apontando-lhe questões de operacionalidade que "suscitam dúvidas sérias" e riscos novos para a tramitação processual.
Seguiu-se o apelo do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) para que fosse adiada a entrada em vigor das novas regras nos tribunais, para evitar consequências graves para o sistema.
Em causa está a nova obrigação de "reunir diariamente, em todos os locais onde ocorre distribuição, um conjunto de operadores da justiça para assistir ao ato da distribuição, que até aqui dispensava, na maioria dos casos, qualquer intervenção humana, e elaborar uma ata à qual é anexado o resultado da distribuição", segundo se lê na portaria do Ministério da Justiça.
O novo vice-presidente do Conselho Superior da Magistratura (CSM), Luis Azevedo Mendes, que hoje tomou posse, alertou na cerimónia desta tarde que o novo sistema de distribuição de processos mobiliza muitos meios e "tende a ser ineficiente e despesista", acrescentando que o novo modelo afetará "a tramitação processual" e vai gerar "muitos atrasos" exigindo regulamentação que conceda novos poderes de gestão aos presidentes dos tribunais.
Na mesma altura, o presidente do Supremo Tribunal de Justiça e, por inerência, do CSM, Henrique Araújo, manifestou preocupação com os efeitos burocráticos das novas regras e com o funcionamento do algoritmo.