O teletrabalho que está a repovoar o interior e as ilhas. E os "Migrantes 2.0": Trabalham no estrangeiro mas vivem em Portugal.
Onde fica a empresa que o contratou? Há cada vez mais portugueses a responder: "O que é que isso interessa?"
A internet garante o teletransporte, sobretudo nas áreas tecnológicas, como é o caso da "7 Graus", uma "publisher" - uma produtora de conteúdos para todo o mundo, a partir de Portugal.
"Estamos localizados em Matosinhos, mas a localização deixou de ser relevante porque temos pessoas a trabalhar em vários pontos do país", explica Rui Marques, o CEO da empresa, que também não precisa de saber onde mora o funcionário.
A "7 graus" tem escritórios, mas só lá vai quem quer: "É opção de qualquer colaborador. Se quiser trabalhar remotamente, pode ser, mas se preferir trabalhar nos escritórios da empresa, também pode".
Leonardo Oliveira é um dos funcionários desta empresa e mal conhece a "casa-mãe". Foi "telecontratado" no inicio do ano para teletrabalhar, a partir do Funchal. "Estou na empresa há sete ou oito meses e só fui uma vez aos escritórios, em Matosinhos", conta.
Já André Alves é o exemplo de um regresso a casa, sem perder o emprego: "Eu estava a viver no Porto há cerca de seis anos, desde que tive uma oportunidade de trabalho na '7 Graus', e, a partir do momento em que começou a pandemia, tomei a decisão de voltar à minha terra-natal, que é Tomar, e agora estou aqui muito bem, com um estilo de vida diferente da que tinha na rotina diária de uma grande cidade, como é o Porto."
A pandemia devolveu André a Tomar, que já decidiu não voltar ao norte. É só vantagens: "Melhor qualidade de vida, perto da família e a um menor custo também", enumera.
André não está sozinho nesta aposta, longe disso. Há muito que Tomar não assistia a tantos regressos: "Eu consigo dar-lhe um exemplo muito prático, desta cidade do interior: muitas pessoas tinham deixado Tomar para trabalhar fora, em grandes centros como Lisboa ou Porto. O que acontece é que muitas dessas pessoas estão a voltar porque conseguem trabalhar de qualquer lado. Tu podes trabalhar a partir de qualquer ponto para uma grande cidade...até mesmo para Londres ou Paris, que têm salários muito mais elevados do que em Portugal."
E esses são os "Migrantes 2.0", os que trabalham no estrageiro sem ter sair de casa, em Portugal. Não se pense que é coisa do futuro, ficção. Já entramos na era das "migrações digitais", sublinha o CEO da "7 Graus": "Isso já é uma realidade. Não é uma coisa que, se calhar vai acontecer...não. A emigração digital já é uma realidade, hoje em dia. Principalmente nas áreas tecnológicas", afiança.
Mas isto também tem custos, para as empresas tecnológicas, onde a concorrência é feroz. O que se ganha lá fora passou a ser relevante, para Rui Marques, na hora de pagar, cá dentro, pagar salários: "Neste momento, não há qualquer tipo de vantagem financeira. Pelo contrário, esta questão do trabalho remoto trouxe uma desvantagem financeira porque da mesma forma que podemos contratar pessoas onde, à partida, os salários médios serão mais baixos, também há empresas estrangeiras a contratar em Portugal. Ou seja, nós tivemos que que aumentar salários aos nossos colaboradores por causa da concorrência de empresas estrangeiras."