A pandemia levou a que se fechassem inúmeras fronteiras. Muitos imigrantes pretendem regressar aos seus países de origem, apesar de os serviços de saúde terem uma limitada capacidade na maioria desses países. Nesta fase de crise aguda mundial, numerosos imigrantes querem estar com as suas famílias – só que mais de dois milhões, porventura muitos mais, não o conseguem agora fazer.
António Vitorino, diretor-geral da Organização Internacional das Migrações, com sede em Genebra, chamou a atenção para este problema inédito, apontando a retoma da circulação das pessoas à escala global como o desafio do futuro.
Por outro lado, a Comissão Europeia apresentou uma nova proposta para a UE enfrentar, tão unida quanto possível, a imigração ilegal.
Em 2015, registaram-se quase dois milhões de entradas ilegais na Europa comunitária. Nessa altura, Merkel mostrou-se recetiva a receber na UE esses migrantes. Pouco depois teve que recuar, dada a forte reação de hostilidade a imigrantes da parte de vários Estados membros e da própria opinião pública alemã.
A Comissão anterior tentou fazer aprovar um plano que envolvia quotas. Mas países como a Hungria, a Polónia, a República Checa, a Áustria e outros recusaram terminantemente receber imigrantes.
Hoje, o afluxo ao território europeu de migrantes ilegais é bem menor do que era há cinco anos – 142 mil em 2019. Mas a tragédia do incêndio no maior campo de refugiados do mundo, em Mora, na ilha grega de Lesbos, veio mostrar que a situação atual não é aceitável.
Daí a recente proposta da Comissão, a qual, basicamente, visa a que todos os países da UE contribuam para atenuar a crise da imigração clandestina. Uns, recebendo refugiados, outros contribuindo financeiramente, e não só, para repatriar ilegais, uma tarefa complexa. O embaixador polaco na UE já torceu o nariz à proposta da Comissão, dizendo não aceitar medidas obrigatórias, como os repatriamentos.
Veremos qual o destino desta nova proposta – as perspetivas não são favoráveis. Até certo ponto é compreensível a hostilidade dos países do antigo império soviético a receber estrangeiros. A maioria desses países apenas depois da I Guerra Mundial se constituiu como Estado; têm, por isso, problemas de identidade nacional, que, por exemplo, nós, portugueses, não temos, além de não sermos alvo de uma significativa massa de imigrantes ilegais.
A Itália nasceu como país na segunda metade do séc. XIX. Talvez por causa dessa situação, acrescida pela circunstância da grande vaga de migrantes ilegais atravessar o Mediterrâneo, o líder da Liga, Salvini (que dominava o anterior governo italiano), fez da recusa à entrada de migrantes a sua grande causa política.
Ora, nas recentes eleições municipais e regionais em Itália, em 20 e 21 de setembro, Salvini sofreu uma pesada derrota; já se fala na sua possível substituição na liderança da Liga (partido de extrema-direita que ainda há poucos anos defendia livrar-se da Itália do Sul e constituir um novo país, a Padânia, na Itália do Norte). A hostilidade a imigrantes era a principal bandeira dos partidos eurocéticos de extrema direita, que Salvini, com Marine Le Pen, capitaneava.
Na Suíça também um partido de extrema–direita há anos que combate a imigração. Mas num referendo realizado no passado domingo uma maioria expressiva rejeitou a proposta de cessar o acordo suíço com a UE sobre livre circulação de pessoas. Uma boa notícia para os portugueses que trabalham e vivem na Suíça, onde são a terceira maior comunidade estrangeira.
Os extremistas de direita parecem não se dar bem com estes tempos de pandemia. Ao menos o coronavírus não tem só inconvenientes.
Por último, saliente-se a elogio a Portugal, da presidente da Comissão, Ursula von der Leyen, durante a sua visita a Lisboa, quando saudou “a decisão histórica do Governo de conceder direitos temporários de cidadania aos migrantes e aos requerentes de asilo, para que pudessem ter acesso à segurança social ou aos cuidados de saúde”.