Igreja procura novas formas de ajudar as famílias em crise
24-10-2016 - 16:44
 • Ângela Roque , Rosário Silva , Liliana Carona

Desde as organizações que apostam na formação de noivos aos gabinetes que intervêm mais quando existem problemas que podem levar a separação, a Igreja aposta cada vez mais em evitar as crises familiares.

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A preparação para o casamento tem sido uma das áreas a que a Igreja tem dado cada vez mais atenção e existem movimentos que cuidam especificamente desta área pastoral. Para além dos Centros de Preparação para o Matrimónio (CPM), há outras propostas, como é o caso do Movimento Encontro Matrimonial (MEM), que organiza fins-de-semana para noivos, em Fátima, duas a três vezes por ano.

Eduardo e Graciete, casados há 47 anos, são um dos casais responsáveis pelo movimento. Conheceram-se na faculdade, viram o mesmo filme – “Un homme et une femme” –, apaixonaram-se pela banda sonora e um pelo outro.

“Acho que foi o sorriso dela, que traduz completamente tudo em relação à vida”, diz Eduardo Alves, de 67 anos. Já Graciete, de 70, garante que o que a atraiu foi a capacidade de escuta de Eduardo ("como se mais nada fosse importante para ele do que aquilo que eu lhe tinha para dizer”).

São pormenores como estes que habitualmente partilham com outros casais num fim-de-semana de noivos. “Há uma equipa responsável, composta por cinco pessoas, dois casais e um sacerdote. Temos um casal júnior e um sénior, que é o nosso caso”, explica Eduardo. Graciete diz que no encontro são debatidos os mais diversos temas: “O que é ser noivo hoje, tomar decisões, fazer escolhas a dois, a importância da sexualidade, a reconciliação e o perdão, indispensável para fazer caminho”.

Se existem segredos para um casamento feliz, eles são desvendados nestes fins-de-semana de noivos. Para Graciete, o segredo é “o estar lá incondicionalmente, quando apetece, e quando não apetece, e é ai que entra a decisão de amar”. Para o marido, é “a luta diária para pôr o outro em primeiro lugar”. Ambos deixam o convite: “Os pais, os tios, os amigos dos noivos, acreditem que é uma bonita prenda de casamento oferecer-lhes um fim-de-semana para noivos através do 'site' do Encontro Matrimonial”. O próximo vai decorrer de 24 a 26 de Fevereiro.

Como acompanhar quem já casou?

A falta de acompanhamento das famílias foi uma das debilidades sublinhadas no Sínodo dos Bispos sobre a Família e é um dos desafios que se colocam à Igreja actual. Há projectos muito diferenciados, sobretudo ligados a movimentos da Igreja, mas estão a surgir novas respostas.

Na Arquidiocese de Évora foi criado, em 2012, o Centro de Apoio à Família (CAF), para dar resposta a pessoas com problemas e necessidades surgidas em contexto familiar. Manuel Vieira é pároco, capelão do hospital do Espírito Santo e responsável diocesano pela Pastoral da Saúde. Com formação em psicologia e terapia familiar, quando regressou à diocese depois dos estudos, decidiu trabalhar, também, na sua área de eleição partindo para a criação do CAF. Actualmente, a sua colaboração estende-se a outras instituições de que é exemplo a Cáritas de Évora, com quem trabalha no apoio psicológico às vítimas de violência doméstica.

A vertente espiritual pode até ser aflorada, mas o centro actua, em primeiro lugar, no exercício da psicologia e da terapia familiar. De acordo com o padre Manuel Vieira há problemas e necessidades identificados. “Questões ligadas a separações conjugais, à educação dos filhos e, curiosamente, temos muitos casos de pessoas que têm dificuldade em lidar com o luto”, adianta.

Até ao momento, o projecto está a corresponder às expectativas, embora por falta de tempo (está aberto uma vez por semana) não consiga dar resposta a todas as solicitações. Mas, apesar das limitações, o CAF está disponível para todas as intervenções neste ano pastoral que, na arquidiocese de Évora, tem como tema “Viver a fé no coração da família”.

Responder a problemas

No Patriarcado de Lisboa foi recentemente lançado, em parceria com a Cáritas Diocesana, o projecto-piloto “Famílias ComVida”, que dentro de um ano conta ter formados, pelo menos, 20 orientadores familiares. “Pretende-se criar uma rede de centros que ofereçam às famílias um acolhimento, uma orientação familiar, porque sentimos que na nossa diocese as respostas a este nível estavam muito dispersas, e nesse sentido, este projecto surge como uma espécie de congregação de esforços, de forma a que cada família possa encontrar uma resposta rápida, ágil, e fácil, quer seja de terapia conjugal, mediação familiar, questões no âmbito da gestão do orçamento familiar ou planeamento familiar”, explica o responsável pelo sector da Pastoral Familiar do Patriarcado.

O projecto não pretende ajudar as famílias financeiramente carenciadas, mas sim “atender a outros desafios e dificuldades”. O padre Rui Pedro Carvalho diz que é “uma aposta na prevenção dos problemas, e não apenas um trabalho de última linha, ou seja, quando as famílias estão em dificuldades. Às vezes um pequeno ajuste, um pequeno encontro, alguém que os escute, é o suficiente para resolver algo que depois pode ir a longo prazo desgastando e acabar em divórcio”.

O projecto destina-se a todas as famílias. “Em primeiro lugar às que queiram aprofundar a sua vivência do matrimónio, mas também aos casais que não tenham o sacramento do matrimónio, ou até famílias não católicas, ou pais e mães que vivam sozinhos com os seus filhos. Claro que sempre com uma perspectiva cristã”, explica o padre Rui Pedro. E em colaboração com outros projectos que já existem na Igreja: “A ideia não é criar uma resposta paralela, nem inventar uma coisa nova, mas é fazer parcerias com aquilo que já se vai fazendo e muito bem”.

O espaço recentemente inaugurado em Carnide, Lisboa, só vai abrir no próximo ano, mas a ideia é que haja um centro destes em cada uma das 17 vigararias da diocese. Segundo o padre Rui Pedro Carvalho, em Janeiro deverá arrancar a formação dos orientadores familiares que “poderão acolher as pessoas onde vivem, nas suas paróquias, e depois deste primeiro acolhimento encaminhar para ajudas mais específicas, ligadas a alguns movimentos e associações”.