Portugal tem neste momento a terceira maior média mundial de novos casos de Covid-19 e, se os números não baixarem, os hospitais podem vir a viver "uma situação de aperto". A média de casos subiu 50% desde 22 de abril, o dia em que máscaras deixaram de ser obrigatórias em espaços fechados.
Em declarações à Renascença, o presidente da Associação de Médicos de Saúde Pública, Gustavo Tato Borges, diz ser expectável que os casos continuem a aumentar, especialmente com a realização de eventos como as festas populares dentro de um mês, esperando uma subida dos convívios ao nível pré-pandémico que levará a um aumento da incidência.
“Aquilo que estava previsto era que descêssemos ao nível zero de restrições quando atingíssemos o limiar de mortalidade de 20 óbitos por milhão de habitantes, o que significava que a incidência tinha baixado de forma considerável. A verdade é que há uma grande pressão por parte da sociedade para o levantamento das medidas, tendo em conta a perceção que as pessoas têm de que esta doença se tornou ligeira e pouco grave”, diz, alertando para a situação dos mais vulneráveis e recordando que os mais idosos receberam a última dose de reforço da vacina contra a Covid-19 há mais de cinco meses.
“É preciso voltar a alertar as pessoas que a pandemia não acabou e que, se não tivermos cuidados agora, podemos vir a ter um verão com uma quantidade de casos substancialmente superior ao do ano passado”, avisa.
Tato Borges lamenta ainda o fim da gratuitidade dos testes nas farmácias e considera que o levantamento das medidas antes de atingirmos aquele que era o objetivo foi “precoce”. “Devíamos ter tido um pouco mais de paciência e um pouco mais de resiliência nesta luta contra a pandemia”, defende.
O responsável da Associação de Médicos de Saúde Pública defende ainda o uso de máscara em locais fechados e o teletrabalho sempre que possível.
Casos subiram 50% desde o fim do uso obrigatório de máscara
O alerta chega após a subida do número de casos de Covid-19 desde que caíram as últimas medidas restritivas da pandemia, como o uso de máscara em espaços fechados.
Desde 22 de abril que o instrumento de proteção só é necessário em serviços de saúde e transportes públicos e a data coincide com a subida do número de infetados diários: na passada quinta-feira foram confirmados mais de 15 mil casos num dia pela primeira vez desde o início de março.
Em pouco mais de duas semanas, a incidência a 7 dias subiu 50% - era de 594 casos por 100 mil habitantes no dia em que o uso de máscara deixou de ser obrigatório e é agora de 890 casos por 100 mil habitantes em sete dias. Para encontrar uma média semanal de casos superior é necessário recuar até ao dia 21 de fevereiro.
Ao mesmo tempo, a mortalidade tem-se mantido estável e até desceu ligeiramente: a 21 de abril, o indicador estava nos 13,6 óbitos por milhão de habitantes a sete dias, baixando para os 12,6 no passado domingo.
O último relatório semanal, com dados até ao dia 2 de maio, dá conta de 1.119 doentes internados com Covid-19, menos 89 em relação à semana anterior. Na altura estavam internados em unidades de cuidados intensivos 60 doentes - uma subida de 11 doentes em relação à semana anterior.
Já a atualização do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge indica que a taxa de ocupação de camas em UCI no continente está atualmente a 24%, quando o nível de alerta é 75%. Os casos mais preocupantes descritos no relatório semanal aconteciam em Centro, Norte e Lisboa e Vale do Tejo, com ocupações de 32%, 31% e 30%, respetivamente.
O grupo etário com maior número de casos de COVID-19 internados em UCI é o dos 60 aos 79 anos, seguido da faixa etária entre os 40 e 59 anos.
São João regista recorde de admissões em urgências num dia
Apesar da subida de casos ainda não se refletir no aumento de internados por covid-19, o Hospital de São João, no Porto, registou esta segunda-feira o maior número de sempre de admissões nos serviços de urgência, com fonte hospitalar a avançar que foram admitidos 1.022 doentes, um número nunca antes alcançado.
O diretor do serviço de urgência do hospital, Nelson Pereira, confirma que as doenças respiratórias e infeções com Covid-19 estão a aumentar a procura pelas urgências e que existe uma “disfunção crónica da rede urgência”, indicando que a linha SNS24 está a enviar doentes para os hospitais em contínuo “por falta de opções de realização de testes”. O serviço da triagem digital covid-19, portal criado pela DGS face ao elevado volume de chamadas de casos suspeitos da covid-19 para a linha SNS24, esteve mesmo indisponível.
Na última semana, Portugal foi o país com a 3.ª maior média mundial de novos casos, com 1.154 novos casos por milhão de habitantes por dia, apenas atrás de Austrália e Nova Zelândia, que registaram uma média de 1.632 e 1.477 novos infetados por milhão de habitantes.
Estes números do início de maio são os mais altos da Europa, superiores aos 827 casos por milhão de pessoas na Alemanha, a Finlândia (com 766) e Itália (696). A média diária da União Europeia está nos 447 novos casos, por milhão de habitantes a sete dias, menos de metade da incidência registada por Portugal, enquanto a média mundial está nos 64 - cerca de 18 vezes inferior à do nosso país.
Portugal é também o oitavo país da UE e nono país mundial com a média de mortes por Covid-19 mais alta, registando dois óbitos por milhão de habitantes nos últimos sete dias.
A Finlândia é o país que mais mortes diárias regista por milhão de habitantes em todo o mundo (5,4), seguida de Grécia (3), Nova Zelândia (2,8), Reino Unido (2,7) e Eslováquia (2,6). A média na União Europeia de novas mortes é de 1,43 novas mortes diárias com covid-19 e a mundial é de 0,2.