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No arranque de um processo negocial em torno do Programa de Estabilidade que Portugal vai remeter a Bruxelas, Pedro Santana Lopes admite que o Governo de Lisboa pode contar com alguma flexibilidade da Comissão Europeia em relação a determinadas metas orçamentais.
"Há uma margem que existe desde o início do Governo de António Costa. Ele poderia contar, apesar da firmeza das posições, com um ambiente político menos propenso à inflexibilidade por parte das autoridades da União. Penso que a ‘carta’ da flexibilidade deve ser jogada 'cum grano salis'[ com cuidado]", sugere Santana Lopes no programa "Fora da Caixa" da Renascença.
Resta saber se a contrapartida da flexibilidade for este conjunto de medidas, aparentemente inaceitáveis para o Governo português como a oposição ao aumento do salário mínimo. "O Governo não aceitará essa, terá que aceitar outras. As coisas também não vão ficar assim como estão. Resta saber é de tudo o que foi dito até agora que não se aceita, qual é que terá de se aceitar no final".
António Vitorino adverte que em Bruxelas tudo se negoceia , mas insiste que baixar o défice abaixo da fasquia dos 3% é decisivo para obter flexibilidade.
"O objectivo fundamental para Portugal é sair do processo de défices excessivos. Isso é que está ligado à flexibilidade. Uma interpretação mais flexível do pacto de estabilidade e crescimento depende da consistência do projecto do governo português de garantir que o défice fica abaixo dos 3%", sustenta o antigo comissário europeu.
Olho na Espanha
O jurista, profundo conhecedor das dinâmicas comunitárias, alerta Portugal para o que Espanha está já a negociar com Bruxelas sobre o seu défice. Vitorino diz que cabe ao Governo português ser "suficientemente hábil na negociação" para impedir que o país vizinho obtenha uma flexibilidade sem que Portugal seja também incluído.
"O exemplo da Espanha é importante. Espanha não tem orçamento aprovado por Bruxelas, convém recordar. Com todos os dramas, apesar de tudo, o orçamento português lá foi tolerado, não sei se foi aceite mas foi tolerado por Bruxelas. A Espanha não tem Governo. Sem Governo, já fez uma revisão do défice em alta do défice, será previsivelmente superior aquilo que estava previsto no orçamento espanhol, o qual aliás já não tinha sido aceite pela Comissão Europeia. Estamos aqui perante o risco de dois pesos e duas medidas", afirma António Vitorino.
O comentador da Renascença lembra que tal significaria que mais valia não ter Governo, pois assim sendo, as regras não são aplicadas e admitem-se prazos suplementares para o ajustamento.
"Isto não faz sentido. Mesmo o burro que não aprende línguas, não por ser velho mas por ser burro, também não deve ser demasiado burro", remata António Vitorino.