As declarações da secretária de Estado da Proteção Civil sobre o Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP) são "contraditórias" e não correspondem à verdade, acusam operacionais envolvidos no combate aos incêndios em Leiria.
Ouvido pela Renascença, Mário Bruno, comandante da corporação de bombeiros voluntários do concelho de Alvaiázere - um dos operacionais que haviam denunciado à Renascença, na sexta-feira, que tinha havido falhas no SIRESP neste incêndio - garante que "não houve de todo mau uso do SIRESP", como Patrícia Gaspar alegou.
"Eu entrei no teatro de operações dia 9, saí no dia 12 e não vi nenhuma utilização abusiva do SIRESP. Vi foi utilizações desesperadas do SIRESP porque não obtinham resposta, o SIRESP não funcionava", garante o comandante Mário Bruno.
O responsável da corporação de bombeiros voluntários de Alvaiázere diz não compreender as declarações da secretária de Estado, que tinha "em muito boa conta".
"É alguém que foi comandante distrital, adjunta nacional, segunda comandante nacional, portanto tem conhecimento muito grande do que é a Proteção Civil e os seus operacionais e nunca a vi, enquanto ocupava cargos operacionais, a criticar os operacionais", afirma Mário Bruno.
Isso mudou com a chegada a um cargo político. "Não compreendo porque é que quando tinha cargos operacionais os bombeiros não tinham problema nenhum, sabiam usar perfeitamente o SIRESP, mas passado dois anos, que ocupa um cargo político, parece que já desaprenderam".
"Não foram os operacionais que em dois anos deixaram de trabalhar com rádios, não foram os operacionais que em dois anos deixaram de saber trabalhar com o SIRESP, se calhar foi mesmo o SIRESP que falhou".
O comandante vai mais longe: "até parece que os bombeiros usam o SIRESP para saber o número do Euromilhões ou do Totoloto. Isso não é verdade, nós usamos o SIRESP por necessidade operacional e não por outra necessidade qualquer".
"Considerar o SIRESP uma rede de comunicações de emergência é, no mínimo, rebuscado"
Já João Paulo Saraiva, da Associação de Proteção e Socorro (Aprosoc) diz que as declarações da secretária de Estado são "contraditórias".
"Por um lado diz que foi dada formação, por outro diz que houve falha operacional. Se há falhas operacionais e são recorrentes na utilização deste recurso de rádio, algo falhou na formação", aponta o líder da associação.
"Estas situações decorrem da falta de formação mas também do facto de existir uma concentração de meios muito significativa, não habitual. Em teatros de operação mais complexos, com mais meios no terreno, acontece frequentemente que o número de grupos de conversação que são disponibilizados não é suficiente", explica o presidente da Aprosoc.
João Paulo Saraiva adianta que as falhas em Leiria não são caso único.
"Estas falhas são diárias. Isto não acontece apenas nos incêndios. Isto não acontece apenas no Verão. Isto acontece diariamente, acontece diariamente a falta de cobertura e para outras situações, como sejam situações de emergência médica, onde os bombeiros e outras entidades atuam diariamente. Não é disponibilizada para uma situação de emergência médica, para um acidente onde não há cobertura SIRESP, não vai essa unidade móvel retransmissora do SIRESP e, portanto, as comunicações ali falham".
"Considerar que o SIRESP é uma rede de comunicações de emergência é, no mínimo, rebuscado, porque no dia em que desligarem a rede telemóvel, ou que falhe totalmente a rede de telemóvel, vai-se perceber que só com o SIRESP não há comunicações".