Pedro Siza Vieira diz que foi dos ministros que defendeu mais cedo o encerramento das escolas no segundo confinamento e garante que o ambiente do Conselho de Ministros é de grande abertura e cooperação
É sabido que ao longo destes meses houve tensão no governo entre os ministros mais sanitários, ou seja, que defendiam maiores confinamentos, e os que defendiam maior abertura da economia. De que lado se posicionou?
Essa visão é muito redutora.
Qual é a visão mais acertada?
Precisamos de controlar a situação de saúde para conseguirmos assegurar uma normalização da atividade económica. Isto é muito difícil. Neste momento, temos vacinas em quantidade que nos permite dizer que vamos reduzir o risco de sintomas graves ou de letalidade desta doença. Mas até aqui as nossas únicas medidas eram as não-farmacológicas: redução de atividades e de contactos e de circulação. Tivemos sempre que encontrar o ponto ótimo de equilíbrio entre vários fatores. Em janeiro, quando tínhamos de facto uma situação muito complicada no país e uma entrada muito violenta da estirpe inglesa, eu fui daqueles que defendeu no Conselho de Ministros que devíamos regressar a um confinamento muito estrito e muito rigoroso, designadamente encerrando as escolas porque percebíamos naquela altura que o confinamento resulta. E um confinamento mais estrito reduz mais rapidamente os contágios.
E as suas relações com a ministra da Saúde ao longo deste tempo estão melhores ou passaram por momentos tensos?
São excelentes. Não quer dizer que nós não tenhamos discussões vigorosas sobre alguns aspetos da ação governativa quando estão em causa interesses, não só contraditórios, mas que precisam de uma conciliação. Ao longo da minha vida profissional, sempre encorajei ambientes onde as pessoas falem abertamente, exprimam com vigor mas com correção pontos de vista que possam ter sobre os mesmos assuntos porque tenho sempre a convicção que é de uma discussão aberta e sem receios que pode surgir a melhor decisão.
E é esse o ambiente do Conselho de Ministros?
É um ambiente de muita cooperação, mas de muita abertura. É preciso ter uma excelente relação pessoal para podermos exprimir divergências de uma forma construtiva.
As pessoas não se apercebem de como é difícil trabalhar sem guião, ter que gerir uma situação em condições inéditas e para as quais não existem precedentes. Tivemos muitas vezes que tomar decisões a quente e para reagir a circunstâncias muito extremas. Nem sequer tínhamos benefício de conselho inequívoco por parte dos especialistas, não estou sequer a falar só de Portugal. Todas estas coisas tiveram que ser decididas em horas e em dias. Quando estamos a tomar decisões em contexto de muita urgência, é necessário antecipar problemas, perceber como os vamos resolver e provavelmente a primeira resposta que damos não é a melhor. Tudo isto é difícil de gerir e difícil de comunicar, gera muita tensão, obriga a ser muito humilde e a ser capaz de aprender com os erros e corrigir o curso.
O governo tem de começar a negociar em breve o próximo Orçamento do Estado. Acredita que é possível continuar a governar com a esquerda?
Para aprovar OE, precisamos de ter na AR o apoio suficiente para que sejam aprovados. Aquilo que temos indicação e que será possível é trabalhar com os partidos que nos últimos anos apoiaram e viabilizaram os OE. Vejo disponibilidade por parte desses partidos. Temos estado permanentemente envolvidos na execução das medidas do presente OE. Não vejo razão nenhuma específica para pensar que não será possível continuar a fazê-lo.
Falando das suas áreas, é mais fácil dialogar com a esquerda ou há mais pontos de convergência com o PSD?
Não tenho tido grande dificuldade em aprovar medidas à esquerda. Do lado do PSD, não tenho uma previsibilidade daquilo que podem ser as orientações a propósito de temas em concreto. É mais difícil saber com que contar. Às vezes, somos surpreendidos. Os agentes económicos precisam de estabilidade. Devemos continuar a aumentar os benefícios fiscais ao investimento ou à capitalização de empresas. Nesta altura, por exemplo, precisamos de prolongar o crédito fiscal extraordinário ao investimento que está em vigor até ao fim deste semestre. Vamos propor isso. Vai depender da AR.