A alpinista de competição Elnaz Rekabi foi recebida como uma heroína no regresso a Teerão esta quarta-feira, após ter competido na Coreia do Sul no fim de semana sem o "hijab", o véu islâmico de uso obrigatório para todas as mulheres da República Islâmica, incluindo em competições desportivas.
A decisão de não usar o "hijab" no evento desportivo em Seul, no domingo, surge no contexto de protestos em massa no Irão, em curso desde 16 de setembro, na sequência da detenção e morte sob custódia policial da jovem Mahsa Amini, de 22 anos, por não ter usado o "hijab" de forma correta em público.
Os protestos acabam de entrar na quinta semana consecutiva e têm juntado raparigas e rapazes em idade escolar, trabalhadores petrolíferos e outros iranianos em mais de 100 cidades do país, representando o maior desafio ao regime teocrático desde as manifestações em massa de 2009, na sequência das eleições presidenciais.
Amigos e familiares de Rekabi estavam preocupados com a segurança e o bem-estar da atleta, que esteve incontactável entre domingo à noite e ontem. Esta manhã, após aterrar no aeroporto de Teerão, Rekabi repetiu uma explicação já dada num vídeo no Instagram, assegurando que o não uso do "hijab" se deveu a um "esquecimento" e não a uma tomada de posição política.
"Como estava ocupada a calçar-me e a equipar-me, esqueci-me de pôr o hijab quando fui competir", disse a alpinista de 33 anos. "Volto ao Irão com paz de espírito, apesar de toda a tensão e stress. Até agora, graças a Deus, nada aconteceu."
Nas mesmas declarações aos jornalistas e à multidão que a recebeu no aeroporto, Rekabi também repetiu que o seu voo de regresso decorreu como e quando previsto, apesar de "fontes bem informadas" terem adiantado ontem à BBC que a atleta tinha embarcado num voo de Seul com destino a Teerão nessa manhã.
Outra fonte citada pela BBC Persa -- que apesar de estar proibida de operar no país tem uma extensa rede de contactos e fontes no Irão -- tinha adiantado ontem ao canal que, antes desse voo, Rekabi foi levada para a embaixada iraniana, onde lhe confiscaram o passaporte e o telemóvel.
Não é certo o que aconteceu entre o alegado voo de terça de manhã e a chegada de Rekabi a Teerão nesta quarta-feira. Também não é claro para onde foi transportada à saída do aeroporto, onde entrou numa carrinha, acenando aos apoiantes que a receberam, gritando o seu nome e classificando-a de "heroína".
O IranWire, um site anti-regime fundado pela jornalista canadiana-iraniana Maziar Bahari (em tempos detida no Irão pelo seu trabalho), alega que Rekabi terá sido imediatamente levada para a famosa prisão de Evin, centro de detenção de opositores e dissidentes que, no fim de semana, foi palco de um enorme incêndio de origem desconhecida que provocou pelo menos oito mortos.
"É nosso entendimento que ela voltou ao Irão, vamos continuar a acompanhar a situação após a sua chegada", disse em comunicado a Federação Internacional de Alpinismo Desportivo, organizadora do evento deste fim de semana na Coreia do Sul. "É importante sublinhar que a segurança dos atletas é primordial para nós e que apoiamos quaisquer esforços para manter seguro um elemento da nossa comunidade nesta situação."
Contactada pela Associated Press, a Federação adiantou que está em contacto tanto com Rekabi como com as autoridades iranianas, embora se tenha escusado a adiantar pormenores desses contactos. A organização desportiva também se recusou a comentar a alegada publicação da atleta iraniana no Instagram e as alegações nela contidas, que Rekabi voltou a repetir esta manhã.