O crescimento pré-pandemia deverá ser alcançado em meados de 2022. É a estimativa avançada esta sexta-feira pelo Banco de Portugal (BdP), que no Boletim Económico de março mantém as estimativas de crescimento para este ano, em 3,9%, mas reviu em alta o próximo ano. Segundo o regulador, em 2022 o PIB deverá crescer 5,2%, mais sete décimas percentuais face à anterior projeção, de dezembro.
“A economia portuguesa deverá crescer acima da área do euro no horizonte de projeção (2021/2023), após uma queda mais pronunciada em 2020 e no início de 2021. No final do horizonte, o crescimento acumulado desde o final de 2019 é idêntico em Portugal e na área do euro”, refere o Banco de Portugal.
Estas contas partem do princípio de que “as restrições serão gradualmente levantadas a partir do segundo trimestre de 2021. A implementação de uma solução médica eficaz estará concluída até ao início de 2022, em paralelo em Portugal e na área do euro”, diz o relatório.
Ainda em matéria de crescimento, a instituição liderada por Mário Centeno aponta para o regresso aos níveis de 2019 a meio do próximo ano. No entanto, adverte que “embora se antecipe que o nível de atividade económica de 2019 seja alcançado em meados de 2022, existe uma perda face ao que se teria verificado na ausência da pandemia”.
Segundo o Banco de Portugal, “a crise levou à interrupção da acumulação de fatores produtivos, incluindo capital humano, e à redução da eficiência na utilização dos mesmos, motivada pelas preocupações com a disseminação e com o combate ao vírus. Existem também custos de realocação dos fatores produtivos associados ao impacto setorial diferenciado. Adicionalmente, o aumento do endividamento dos setores público e privado, já com pontos de partida elevados, colocará importantes desafios à economia portuguesa.”
Exportações e consumo das famílias puxam pela economia
A recuperação vai sentir-se a diferentes velocidades, dependendo dos setores. A atividade industrial tem sido mais resiliente, segundo o regulador, por isso, deverá recuperar mais depressa. Já nos serviços e, em particular, nas atividades ligadas ao turismo, cultura e entretenimento, o regresso à normalidade será mais gradual.
Certo é o contributo positivo, até 2023, das exportações e do consumo privado, diz o Banco Central.
“A recuperação das exportações conjuga a dinâmica favorável da procura externa de bens com a recuperação gradual do turismo e dos serviços relacionados”, avança o BdP. As exportações de bens e serviços crescem 13,7% em 2021, 11,5% em 2022 e 5,3% em 2023. Estes números reflctem a “dissipação mais lenta dos impactos diretos da pandemia nas exportações de turismo, que começam a ganhar dinamismo apenas a partir de meados de 2021, e o peso significativo desta componente, o quarto mais elevado na área do euro em 2019”.
Em 2023 as exportações de turismo encontram-se ainda ligeiramente abaixo das de 2019. “A experiência da pandemia sugere a possibilidade de uma redução das viagens de negócios nos próximos anos, o que penaliza a evolução dos setores exportadores de serviços. Por seu lado, as exportações de bens crescem 15,1% em 2021 – ultrapassando as de 2019 – e aumentam 4,9% e 3,2% em 2022 e 2023”, revela o relatório.
“A recuperação do consumo é reforçada pela tendência decrescente da taxa de poupança ao longo do horizonte de projeção. A taxa de poupança aumentou de 6,8% em 2019 para 12,0% em 2020”, refere o BdP.
Aumento da poupança é temporário
Este aumento de poupança não é explicado apenas pelos receios sobre o curo e médio prazo, o regulador diz mesmo que este nível de poupança “é superior àquele que as famílias veem como desejável para o futuro”.
“A taxa de poupança regressa ao nível pré-pandemia no final do horizonte”, segundo o supervisor. As famílias deverão manter estas reservas adicionais “num ambiente de incerteza ainda elevada, em que a taxa de desemprego permanece acima do nível pré-pandemia”.
Há ainda informação de que “a acumulação de poupança em 2020 tenha estado mais concentrada nas famílias de rendimentos mais elevados, cuja propensão marginal para consumir é menor”. São dados confirmados pelas compras com cartões bancários, segundo as quais os indivíduos de consumo alto reduziram mais acentuadamente as despesas em 2020 do que os indivíduos de consumo baixo.
O investimento cresce 5%, em média, graças aos fundos europeus. “O investimento residencial e o investimento público, menos afetados pela crise, continuarão a crescer no horizonte de projeção”. Ainda segundo o supervisor, “após a queda de 5,6% em 2020, o investimento empresarial recupera, crescendo 3,8% em média” até 2023.
Desemprego desce a partir de 2022
No mercado de trabalho, a retoma da atividade vai traduzir-se no “crescimento médio do emprego de 0,8% e redução da taxa de desemprego a partir de 2022. Subsistem margens de subutilização de recursos no mercado de trabalho e do produto, que diminuem ao longo do horizonte de projeção”.
A taxa de desemprego deverá aumentar de 6,8% em 2020 para 7,7% em 2021, antes de iniciar uma trajetória descendente até ao final do horizonte de projeção. Em 2023, deverá ser superior à observada em 2019, embora muito aquém da observada na crise de 2011-13.
As horas trabalhadas crescem 3,3%, em média, entre 2021-23. As medidas de combate à pandemia tiveram mais efeito na diminuição do emprego do que nas horas trabalhadas. “Com a recuperação da atividade antecipa-se que as empresas recorram, numa primeira fase, aos trabalhadores que têm disponíveis para dar resposta ao aumento da procura. As horas trabalhadas crescem significativamente mais do que o emprego, especialmente em 2021 e 2022”.
Destaque ainda para as diferentes evoluções por sectores. Espera-se uma evolução moderada do emprego nos segmentos mais afetados pela crise, nomeadamente “nos setores mais expostos aos contactos pessoais, mais intensivos em trabalho e com menor possibilidade de recorrer ao teletrabalho, bem como nos indivíduos mais jovens, com níveis de qualificação mais baixos e com vínculos temporários”, explica o BdP.
Salários não recuperam
O Banco de Portugal antecipa “a manutenção de um crescimento contido dos salários” até 2023, “inferior ao observado antes da crise pandémica”.
Contas feitas, “o aumento inferior a 3% dos salários no setor privado em 2020 (4,3%, em média, nos dois anos anteriores) refletiu fatores como o menor número de atualizações das tabelas salariais negociadas em sede de contratação coletiva e o impacto das políticas de proteção do emprego, nomeadamente o layoff simplificado. Estes fatores foram mitigados pelo aumento de 5,8% do salário mínimo e por efeitos de composição positivos, com a redução do emprego a ser mais concentrada nos escalões salariais mais baixos.”
O supervisor conclui que, com a recuperação da economia, “alguns destes efeitos dissipam-se (políticas de proteção) e outros têm tendência a inverter-se, como os efeitos de composição, antecipando-se um crescimento salarial médio acima de 2% no horizonte de projeção”. As atuais projeções incluem o aumento de 4,7% do salário mínimo em 2021.