“A vitória eleitoral foi difícil, porventura a mais estreita em eleições parlamentares”, mas “talvez por isso a mais gratificante”. Foi assim que o Presidente da República desenhou os resultados saídos das eleições de 10 de março e que culminam, nesta terça-feira, na tomada de posse do novo Governo, liderado por Luís Montenegro. Marcelo não deixou de retratar também o executivo que está de saída: "o mais longo deste século", sempre "com sensibilidade internacional e europeia", uma referência que casa bem com os desejos de António Costa de continuar a fazer política ativa na Europa.
Depois de as primeiras palavras do Presidente terem sido para os portugueses — que mostraram ter fé na democracia "ao inverter a abstenção que parecia imparável", mostrando que "o voto vale sempre a pena" —, Marcelo Rebelo de Sousa analisou o significado dos resultados de 10 de março. Os portugueses "mudaram de hemisfério de Governo", concluiu o chefe de Estado, que, nas entrelinhas, fez referência, sem nunca dizer nomes, aos três grupos políticos que irão dominar o Parlamento.
Três, diz Marcelo, são também as escolhas feitas pelos portugueses com o seu voto: “Escolheram a reforçada aproximação às pessoas, escolheram mudar de hemisfério de governo, não deram maioria ao partido que a possuía, nem maioria com outros partidos do mesmo hemisfério, não deram — por diferença exígua —, a vitória ao maior partido desse hemisfério.”
E foi assim que o Presidente da República recordou o primeiro-ministro daquela que é a nova formação da Assembleia da República, um Parlamento onde Luís Montenegro não tem uma maioria clara e onde precisa de dialogar constantemente para governar com estabilidade.
Sem essa maioria parlamentar, Marcelo Rebelo de Sousa refere que o XXIV Governo Constitucional terá de negociar, quer para "convergências mais prováveis", quer para "convergências menos prováveis". Deixa, no meio deste discurso, um recado sobre os compromissos que Montenegro deve procurar, já que os portugueses "deram a vitória ao setor moderado e não ao radical".
Sobre o seu papel no futuro, e sobre a base de apoio político do executivo que agora toma posse, Marcelo garante que o novo Governo "conta com o apoio solidário e cooperante do Presidente da República, que, aliás, nunca o regateou ao seu antecessor". Mas, e voltando a olhar para a forma como os assentos parlamentares se dividiram, sublinha que Montenegro "não conta com o apoio maioritário na Assembleia da República e tem de o construir".
As convergências "mais prováveis" que o líder do PSD deve procurar são as que se referem ao regime, como política externa, financeira, ou questões ligadas à Defesa, incluindo eventuais compromissos eleitorais. As “convergências menos prováveis", e que irão exigir um diálogo "mais aturado e muito mais exigente", são sobre reformas estruturais ou questões ligadas ao Orçamento do Estado. "E, essa exigência é ainda de mais largo fôlego”, acrescenta o Presidente.
Numa altura em que a frase oficial do PS sobre o posicionamento em relação à proposta de Orçamento do Estado continua a ser que é "praticamente impossível" viabilizar. Marcelo não faz pressão sobre os socialistas, mas exige a Montenegro que mantenha aberta a porta de diálogo.
Na intervenção que durou dez minutos, Marcelo reconheceu que, para governar, Montenegro conta com o apoio popular "que lhe deu a vitória", mas avisa que essa base de apoio tem de aumentar a bem da paz social. "Terá de conquistar muito mais portugueses. Ou porque próximos nas ideias ou porque convencidos que o trabalho que faz merece esse apoio alargado".