Já não escapa a ninguém o peso e importância que a inteligência artificial (IA) vai tendo no domínio empresarial, independentemente da área de negócio. Basta termos explorado recentemente o ChatGPT, sobretudo na sua última versão (4), para compreendermos a dimensão das suas possibilidades, ao alcance de todos nós.
É por isso que se deve colocar a questão sobre até que ponto estamos a lidar com uma ameaça ou oportunidade. E a resposta é dupla: ambas. Se, por um lado, irá contribuir para nos munir de conhecimento, de acesso rápido e cada vez mais completo, por outro, é o agente catalisador do declínio acelerado de algumas profissões ou formas de gerir modelos de negócio.
O ChatGPT 4 já interpreta mapas e tabelas, descodifica e resolve fórmulas, resume um PDF, analisa uma folha de Excel, transforma uma proposta draft de um site numa solução em HTML, percebe de bitcoins, analisa uma candidatura a um posto de trabalho, etc…
O seu principal mérito é o de entender cada vez melhor quem é o seu interlocutor e adaptar-se à sua linguagem. Chegará o momento em que a interação será corporizada por um avatar com rosto, imagem e som humanos. Nessa altura, estaremos perante o a antigo jogo “Eu sei tudo” numa versão “real”.
Sabe-se que, recentemente, ficou entre as melhores notas no exame da Ordem dos Advogados ou que obteve nota positiva numa dissertação de mestrado em Filosofia e que fez com sucesso um exame de mestrado de Filosofia em França.
Com tudo isto, é natural o temor resultante dos seus impactos: se a IA criar uma bitcoin através do algoritmo, talvez só a mesma compreenderá o valor do dinheiro. E se o algoritmo for programado no sentido de manipular os seus recetores, criando fake news, para formar uma opinião sobre questões políticas, sociais ou económicas, como aquelas que resultaram na falência da Cambridge Analytica, até que ponto estamos perante uma ameaça ao grau de liberdade de pensamento e escolha?
Hoje vivemos num mundo de hipercomunicação, com acesso fácil a todo e qual quer tipo de informação, por mais sofisticada e científica que seja, mas a realidade é que ainda há quem não aceite que a Terra é redonda, ou que as vacinas nos protegem das pandemias.
Na verdade, todos temos a liberdade de aceder à informação que pretendemos e aos sites que consideramos serem mais alinhados com a nossa forma de pensar. Mas todos também temos o direito de perceber se o conteúdo da informação é genuíno ou alimentado por um bot, que simula um humano.
Mas não sejamos ingénuos: para o algoritmo, o que verdadeiramente conta é a taxa de conversão (engagement). E se esta aumenta com base na especulação, no “diz que disse”, no “alegadamente” e no “parece que é”, tenhamos a certeza de que essa mensagem ganhará ainda mais força e chegará a mais alvos.
Há uma dimensão ainda mais perturbadora neste quadro. Se é verdade que todo o algoritmo da IA precisa de ser programado por humanos, não deixa de ser claro que ao darmos instruções ao ChatGPT 4, indiretamente, estamos todos a programar.
Ao comum dos mortais deixou de ser necessário conhecer a linguagem Java, C++, PHP, etc…, pois ele interpreta a direção dos inputs que vai recebendo, como se interpretasse ordens específicas de orientação da resposta.
Isso chama-se programação e todos caminhamos no sentido de construir a nossa nuvem.
Pedro Celeste, diretor do Executive Master in Strategic Marketing da Católica Lisbon Business School & Economics
Este espaço de opinião é uma colaboração entre a Renascença e a Católica Lisbon School of Business and Economics