São duas festas, a do palco e a das pessoas, diz o fundador do Rock in Rio. O publicitário Roberto Medina que sonhou há 38 anos o festival que entra na nona edição em Lisboa, acha que o mundo não é o mesmo depois da pandemia. “A gente está tendo um chamamento da Terra”, aponta Medina.
Em entrevista à Renascença no pontapé de saída da edição que foi adiada devido à pandemia, Roberto Medina lamenta que a cultura não seja ainda olhada pelo seu retorno financeiro. “Festa não é festa, é investimento”, sublinha o pai do Rock in Rio Lisboa.
Mostra-se particularmente satisfeito pelo festival ser visto como um evento de família, onde destaca a segurança. Nesta conversa depois de ver o público a entrar na cidade do Rock no Parque da Bela Vista, Medina fala dos detalhes com que ainda se preocupa na realização do evento e lembra que “A vida é ao vivo”, e não no “on-line” como muitas vezes aconteceu durante a pandemia.
Depois desta longa interrupção de 4 anos, como vê o fundador do Rock in Rio, o regresso do festival que tem como slogan 'Por um mundo melhor'?
A gente está tendo um chamamento da Terra para rever o que estamos a fazer. Com tudo o que está a acontecer no mundo, a guerra da Rússia, eu acredito que a gente não passou de graça por essa coisa ruim em que a Humanidade ficou de joelhos por uma doença. Eu acho que temos algumas coisas para a realizar que a gente ainda não fez.
Pode dar exemplos?
Cuidar mais do planeta, ser mais gentil uns com os outros. É a minha expetativa. Foi muito duro que a gente passou. Uma coisa que também vale neste enclausuramento que a vivemos, é que a vida é ao vivo! A vida é isso! Não está na tela, não é on-line. A vida é ao vivo, o pôr-do-sol é ao vivo, amor é ao vivo, abraço é ao vivo! Está faltando isso.
Hoje estamos a comemorar duas coisas, a volta do evento, mas muito mais do que isso, está na hora de sermos mais harmoniosos. Podemos ter posições distintas, mas não temos que brigar. Acho que a música tem esse papel.
Este festival representa também um retorno económico para a cidade de Lisboa?
É um ativo económico, porque estamos a vender o turismo, as pessoas ficam mais animadas! Lembro-me nas Olimpíadas do Brasil, o país vivia um momento difícil e quando houve a festa de abertura, a gente acordou campeão! Eu brincava muito com o futebol quando vim, falei, a gente no Brasil contrata a seleção, reúne todo o mundo e acha que vai ganhar! Depois a gente perde! Vocês aqui começam a perde desde que chamam a seleção! Não! Vamos ficar feliz o tempo todo. O bacana aqui é que a música não tem lado. Une todo o mundo, toca a alma da gente.
Mas há neste momento uma guerra na Europa, fruto da ofensiva russa na Ucrânia. Agravaram-se também, por causa disso, as dificuldades económicas. Até que ponto a cultura deve ser vista como facto de dinamização económica?
Infelizmente, acho que uma boa parte do mundo não entende isso. Festa não é festa, é investimento. A cultura, o teatro, o cinema é a identidade de um povo e é uma máquina. Com as dificuldades, o salário baixo, as coisas aumentando, tem de ser alegre.
Continua muito envolvido no Rock in Rio, como no primeiro dia?
Eu trabalho muito antes! O namoro é melhor do que o casamento, na minha opinião! (risos) A gente fica namorando a ideia, muito antes do dia da comemoração, de abrir o portão, a gente está discutindo a banda, se é bom, se não é bom. Eu estimulo muito a conversa antes do evento, porque acho que agente vive essa experiência toda. O teatro e o cinema têm uma tarefa a cumprir. Num momento de crise, como esse fica mais importante ainda!
Vemos entrar pela porta famílias inteiras, muitas nacionalidades, o que lhe diz a moldura humana deste festival?
Quando sonhei isso há 38 anos atrás, eu queria fazer uma coisa jovem, mas que fosse da família. Hoje a primeira pessoa que entrou era uma senhora de 70 anos, rindo, brincando. Você vê as crianças com os pais, e isso é único no mundo! A família está ali, as pessoas sentem-se seguras, e porquê? Porque a gente luta por cada detalhe. A gente quer cada coisa bem feita e cuidada. Ontem mesmo quando cheguei, a minha filha perguntou se tinha visto algo que não gostasse, e eu disse, vi as bandeiras quando você sai do aeroporto que estão velhas. Essas flores penduradas, sou eu! Eu fico atrás disso, no detalhe, não é gastar à toa. A pessoa pode não ver, mas sentem. As pessoas sentem esse cuidado que têm com elas.
Para quem ainda não comprou bilhete para esta edição, o que pode dizer?
Eu acho que as pessoas vão amar estar aqui! Vem porque é hora de abraçar! A hora é essa, não fica esperando. É hora da gente se encontrar. São duas festas, a que tem no palco e a das pessoas aqui.