É notório o desconforto manifestado por alguns deputados e dirigentes nacionais do PSD pela vontade inicial da direção nacional de avançar com a instalação de uma comissão parlamentar de inquérito à gestão do Eurobic e ao processo de venda do Banif.
Há duas ideias em que a bancada do PSD parece concordar: uma comissão parlamentar é uma má ideia à partida - visto que a maioria absoluta pode “sabotá-la”- e que foi um “erro” admitir sequer que essa é uma hipótese.
À Renascença, um dirigente nacional com experiência parlamentar descreve como "muito difícil" uma comissão de inquérito deste género "ter sucesso", salientando que "hoje o Banco de Portugal, que seria a fonte principal de documentos, está 500% ligado à máquina do PS" e que, sendo assim, "ninguém falaria com seriedade".
O mesmo dirigente social-democrata refere que "estamos com maioria absoluta, o PS iria chumbar o relatório", para além de que os socialistas iriam "branquear a questão: seria a palavra de Carlos Costa contra a palavra do primeiro-ministro".
Basicamente, o problema vem de raiz. "Não valerá de nada se o PSD avançar". É entendido pelo mesmo dirigente nacional que "é má ideia" o PSD ter sequer colocado a possibilidade de avançar com a proposta. "A iniciativa seria pífia", conclui.
O líder do partido, Luís Montenegro, corrigiu, entretanto, o tiro e encetou a estratégia, que para este dirigente nacional devia ter sido seguida logo de início, mal a polémica em torno do livro “O Governador”, do jornalista Luís Rosa, surgiu.
Ou seja, a de encharcar o primeiro-ministro com perguntas sobre as interferências no processo de afastamento de Isabel dos Santos, filha do ex-presidente de Angola, do EuroBic. "Deixar o primeiro-ministro em lume brando, sim, está bem, é fazer perguntas", conclui o mesmo dirigente.
Na mesma linha vai um deputado do PSD em conversa com a Renascença. “O presidente do partido abriu a porta a isso. Achei um erro”, lamenta, referindo-se a essa abertura de Luís Montenegro para instalar uma comissão de inquérito nesta fase. “Eu nunca teria entrado nessa conversa do Chega”, atira.
“Mas acabaram por fazer o que está certo”, ressalva. O que é que está certo? Fazer questões formais ao primeiro-ministro e esperar. “Só se avança com uma comissão parlamentar de inquérito depois de se esgotarem outras formas de esclarecimento”, justifica o social-democrata.
A visão é partilhada por outro deputado do PSD: “As respostas do primeiro-ministro devem ser claras e inequívocas. Se não forem, justificar-se-á a comissão de inquérito”, alinha. O gatilho só deve ser pressionado, para o partido, em último caso. “Não se pode banalizar as comissões parlamentares de inquérito, como pretende o Chega”, diz à Renascença.
Mas este parlamentar vai mais longe, e considera que o “rolo compressor da maioria” iria desvirtuar os resultados de uma comissão parlamentar de inquérito sobre o tema. Esse não é o entendimento do Chega, que já anunciou que vai avançar com a tentativa de instalar uma.
Quanto a isso, este deputado aponta para um voto contra desta iniciativa do partido liderado por André Ventura: “Faríamos má figura se embarcássemos em derivas populistas e demagógicas”. A mesma fonte finaliza que “o PSD é um partido âncora” em Portugal.
Todos parecem concordar com a ideia de que uma comissão de inquérito seria, nesta altura do campeonato, precipitada.
“Não fazia sentido fazermos uma comissão parlamentar de inquérito neste momento”, sublinha outro dirigente social-democrata em conversa com a Renascença. “Não se podem fazer comissões de inquérito por tudo e por nada”, defende, numa crítica implícita ao Chega.
Sobre essa iniciativa, vaticina que venha a esbarrar no muro laranja. “Não estou a ver que votemos a favor”, antevê.
E o caminho a seguir? Um deputado do PSD aponta as placas para o caminho que já começou a ser feito: “Vale mais fazermos perguntas, depois vemos o que fazemos em função das respostas”, explica à Renascença.
Oficialmente, Joaquim Miranda Sarmento não esclareceu qual será a posição do PSD quando chegar o momento de votar, em plenário, a iniciativa do Chega para instalar a comissão de inquérito. Em declarações aos jornalistas, esta quarta-feira, o líder parlamentar dos social-democratas deixou a questão em aberto. “Isso é uma decisão que tomaremos a seu tempo”.
A porta de instalação do inquérito já estava aberta. Esta terça-feira à noite, na Guarda, o líder do partido admitiu que abrir um inquérito parlamentar é uma possibilidade, mas não uma prioridade: “Nós até podemos vir a ter um inquérito parlamentar sobre esta matéria. Não sei. Mas nós, para já, hoje mesmo, estamos a dirigir ao senhor primeiro-ministro perguntas concretas”, disse Montenegro aos jornalistas.
Se quiser, o PSD tem deputados suficientes para instalar uma comissão de inquérito.