Os emigrantes lesados do Banco Espírito Santo (BES) voltaram este sábado a protestar, em Paris, para denunciar "um crime" e "uma vergonha" e reclamar as poupanças que depositaram naquela instituição financeira.
"Faço um apelo ao nosso primeiro-ministro para resolver esta vergonha porque isto é uma autêntica vergonha, o que está a acontecer aos emigrantes. É um crime, é um crime. Como é que esta instância bancária (BES) continua a viver? Esta panela sem fundo já custou milhares de euros ao Estado português. Isto é uma autêntica panela rota, é uma vergonha o que está a acontecer", disse à Lusa Carlos Costa.
O português, de 49 anos, é um dos promotores do grupo Emigrantes Lesados Unidos que organizou a manifestação em frente à sede do Novo Banco, em Paris, na Avenida Georges Mandel, e lembrou que o caso dos emigrantes lesados do BES "está parado" e que o primeiro-ministro, António Costa, "fez uma promessa em Champigny, no bairro da lata, para resolver o problema rapidamente" mas "continua-se à espera".
Carlos Costa e quatro pessoas da sua família não assinaram a solução comercial do Novo Banco, apresentada em 2015, porque "tem obrigações até 2049 e 2051", o que considera ser "uma autêntica vergonha" porque "a maior parte das pessoas não estarão presentes nesta terra".
Luís Fazenda, do Bloco de Esquerda, associou-se ao protesto em Paris. Denunciou "a indignidade" de que têm sido vítimas os emigrantes lesados do BES.
"É uma indignidade aquilo que se tem vindo a passar com os emigrantes que foram lesados por produtos financeiros do Grupo Espírito Santo (GES) e, em particular, as acções do BES. Estes emigrantes estão a ser duplamente penalizados. Foram penalizados pela fraude bancária e agora estão a ser penalizados porque não há uma atenção em relação à situação particular deles", disse o dirigente bloquista.
"Negócio do crime"
Madalena Araújo, de 57 anos, uma das lesadas do BES que protestou em Paris, considera que os emigrantes foram alvo de "um negócio do crime".
Esta portuguesa explicou que não assinou a solução comercial de 2015 porque o documento começava com a frase "Afirmo que comprei acções do BES" mas ela garante que "nunca" comprou acções porque colocou o dinheiro numa conta poupança a prazo "com capital e juros garantidos".
"Para podermos ter a esperança de ir buscar as nossas economias, tivemos que por uma acção em tribunal e tudo isso está-nos a custar muito dinheiro", lançou a portuguesa, sob um coro de vozes que entoavam "gatunos!".
Glória de Jesus Santos, o marido e o filho foram ao protesto com cartazes escritos à mão em que se lia: "Meu filho é deficiente motor. Estou na miséria. Quero o meu dinheiro" e "Eu quero o meu dinheiro. Estou a passar fome".
"Nós queremos o nosso dinheiro porque estamos a passar fome e não temos mais dinheiro nenhum porque as nossas economias iam todas lá para Portugal. Agora estamos a viver com a nossa reforma, mas a nossa reforma é muito poucochinha e quero ajudar o meu neto e o meu filho e o meu dinheiro está todo lá dentro e não há meios de termos um tostão", contou à Lusa a emigrante de 65 anos.
A viver desde 1969 em França, Glória não aceitou a solução comercial do Novo Banco em 2015 e aguarda a nova proposta que, "se for boa", está disposta a aceitar porque está "a precisar de dinheiro" para ajudar o filho e o neto que têm deficiências motoras.
"Este banco foi o diabo"
Presente em várias das manifestações dos emigrantes lesados do BES em Paris, José Ferreira, de 62 anos, voltou a aparecer com um tridente vermelho porque é um símbolo "diabólico" e para ele "este banco foi o diabo" que lhe apareceu.
"Já morreram bastantes pessoas com depressões, isto é uma doença para nós. Isto é um símbolo diabólico. Foi o diabo!", exclamou, acrescentando: "Se tivermos essa proposta como tivemos em 2015, claro que não vamos assinar porque é em obrigações. O nosso dinheiro foi depositado não em obrigações, foi com juros e capital garantido.".
José da Cunha Alves esteve perto de uma "depressão nervosa", fazendo parte dos cerca de 2.000 emigrantes que não tiveram proposta do Novo Banco porque tinha uma conta Euro Aforro 10 que lhe tinha sido apresentada como "um depósito a prazo normal com juros" e agora diz que só vai aceitar uma solução comercial se lhe derem "a totalidade do dinheiro e juros".
"Trabalhei, ganhei-o honestamente e acho que mereço o que é meu. Não peço mais nada, não peço esmolas, não peço nada ao país. Estou na reforma actualmente. Contava regressar a Portugal, todos os meus projectos foram por água abaixo. Tenho sofrido muito, tenho passado muita noite sem dormir", contou o português de 61 anos.
Palmira da Silva Duarte veio de Zurique, na Suíça, até Paris para se manifestar e "fazer chegar à opinião pública, aos políticos o facto de que ainda não houve uma solução" para os emigrantes lesados do BES.
"Têm que devolver as nossas poupanças. Eu nunca assinei nada, o Banco Espírito Santo nunca me vendeu nada, nem eu nunca comprei nada", afirmou a portuguesa de 58 anos que vive na Suíça há 38.
De acordo com uma carta enviada pela chefe de gabinete de António Costa, Rita Faden, aos deputados do PSD José Cesário, Carlos Gonçalves e Carlos Páscoa - que tinham questionado o primeiro-ministro sobre a situação dos emigrantes lesados pelo BES - o Novo Banco vai apresentar uma "segunda oportunidade aos cerca de 2.600 emigrantes que em 2015 rejeitaram a proposta de solução que foi maioritariamente aceite e que está a ser executada".
Ainda segundo o executivo, "os perto de 2.000 emigrantes que não foram destinatários de proposta formulada pelo Novo Banco correspondem ao conjunto de titulares de três das apontadas sociedades veículo a que o Novo Banco não conseguiu ainda aplicar e concretizar procedimento similar às demais que foram liquidadas" e "a Administração do Novo Banco fez saber ao Governo que estimava poder em breve ter condições para apresentar a estes cerca de 2.000 emigrantes uma proposta similar à que em 2015 foi apresentada".