O Papa mantém o cardeal Marx como arcebispo de Munique e Freising depois da demissão que este lhe apresentou face à crise dos abusos no seio da Igreja alemã. Francisco agradece-lhe a coragem e, numa carta publicada nesta quinta-feira, confirma-o no cargo.
“Dizes-me que estás a passar por um momento de crise, e não só tu, mas também a Igreja na Alemanha. Toda a Igreja está em crise por causa do problema dos abusos”, escreve o Papa ao cardeal.
“A Igreja hoje não pode dar um passo em frente sem assumir esta crise. A política da avestruz não leva a nada e a crise deve ser assumida a partir da nossa fé pascal”, defende.
Francisco aproveita a ocasião para refletir sobre este problema que se arrasta na Igreja: “Sociologismos e psicologismos são inúteis. Assumir a crise, pessoalmente e como comunidade, é o único caminho fecundo”, porque “existe o perigo de não aceitar a crise e refugiar-se nos conflitos, atitude que acaba por sufocar e impedir qualquer transformação possível”.
Face ao crime dos abusos, não se pode ficar indiferente nem pode haver hipocrisia no modo de viver a fé. Por isso, o Papa convida a enfrentar a realidade.
“Os silêncios, as omissões, o dar peso excessivo ao prestígio das instituições só levam ao fracasso pessoal e histórico e levam-nos a conviver com o peso de ter esqueletos no armário, como diz o ditado. É urgente arejar essa realidade dos abusos”.
“Pôr a carne no assador”
“Fazer belos propósitos de mudança de vida, sem ‘pôr a carne no assador’ não leva a nada”, escreve Francisco. Por isso, pede a cada bispo que se interrogue: “o que devo fazer perante esta catástrofe?”
Apesar do ‘mea culpa’ da Igreja face a tantos erros históricos do passado, o Papa insiste na urgência de uma reforma, não apenas em palavras, “mas em atitudes que tenham a coragem de se pôr em crise, de assumir a realidade seja qual for a consequência. E, assim, toda a reforma começa por si mesma”.
E acrescenta: “Se não pusermos em jogo a nossa carne, não seremos mais do que ideólogos de reformas”.
Francisco sublinha ainda que “não são os inquéritos nem o poder ou o prestígio da Igreja” que nos salvam, nem sequer “o dinheiro ou o prestígio dos media”. O que nos salva, diz, é “o Único que nos leva a confessar ‘pequei’, ‘pecámos’… e a chorar e balbuciar aquele ‘afasta-te de mim, que sou pecador’ – herança que o primeiro Papa deixou aos Papas e aos bispos da Igreja”.
Por isso, “devemos pedir a graça da vergonha e que o Senhor nos salve de ser a prostituta desavergonhada de Ezequiel 16 [passagem bíblica referente ao pecado em Jerusalém]”, conclui.