Está a aumentar o número de mulheres assassinadas em Portugal vítimas de violência doméstica. Nos primeiros seis meses deste ano, 19 mulheres foram assassinadas. Destas vítimas, 15 foram mortas no contexto de relações de intimidade, mais do dobro das sete mortes registadas no ano passado.
Os dados foram contabilizados pelo Observatório de Mulheres Assassinadas e pela UMAR - União das Mulheres Alternativa e Resposta.
À Renascença, Cátia Pontedeira, investigadora da UMAR e especialista em criminologia, sublinha que os dados, apesar de serem ainda preliminares, já são um sinal de alerta.
"É obviamente um aumento que nos preocupa. Nem que tivesse sido apenas mais um caso seria preocupante. Importa dizer que estes são dados preliminares e pode acontecer que no segundo semestre haja menos assassinatos, mas estes já são dados muito preocupantes porque representam mais do dobro dos assassinatos registados em igual período de 2021."
Para Cátia Pontedeira, da UMAR , os dados são um grito de alerta para que "nem mais uma mulher seja assassinada" e exigem "uma ação urgente" por parte do Estado.
"É preciso haver um investimento. Não só em termos financeiros, mas também um investimento de tempo, um investimento de recursos, um investimento de prioridades, sobretudo porque sabemos que estas mortes podiam ter sido prevenidas. Temos todas as indicações de que alguns ofensores já tinham feito não só ameaças à vítima como também tinham dito a outras pessoas que iriam fazer mal à vítima. Portanto, estão aqui todos os indicadores para podermos intervir atempadamente e prevenir estes desfechos letais, mas é preciso este olhar de equipas especializadas, de quem percebe do fenómeno."
A especialista em criminologia sublinha, ainda, que é "inadiável" que se reforcem as medidas de combate à violência doméstica, impondo desde logo o afastamento do agressor com “mais condenações efetivas".
"A pessoa agressora é sempre perigosa quando ameaça a vítima, quando existe violência psicológica, física, violência prévia, às vezes ao longo de anos. Portanto, precisamos de considerar estas pessoas como perigosas e afastá-las efetivamente da vítima, mesmo que isso passe pela prisão preventiva, pela questão de durante a investigação afastar forçadamente aquela pessoa da própria vítima."
Além destes casos, acrescenta Cátia Pontedeira, é essencial que outras pessoas que têm conhecimento de situações de violência doméstica as denunciem e continuem a acreditar que "o sistema funciona e age quando existem denúncias".
"Eu como pessoa pertencente à sociedade, como profissional, como amiga, como familiar, como colega de trabalho... se tomar conhecimento de uma situação de violência, devo ‘ligar os pontos’, que é o mote da campanha que lançamos hoje e perceber que é importante colocar-me ao lado daquela vítima, ajudando-a a denunciar e a procurar ajuda especializada", apela.
O aumento de casos mortais de violência doméstica é conhecido no dia em que foi lançada a campanha de sensibilização do FEM-UnitED para prevenção do femicídio, um projeto que envolve oito entidades de cinco países (Portugal, Espanha, Alemanha, Chipre e Malta).
O tema da campanha é "O femicídio pode ser prevenido: liga os pontos". O objetivo é "destacar a importância de identificar, reconhecer, validar e valorizar os diversos sinais de alerta da existência de uma relação abusiva que poderão contribuir para colocar a vítima numa situação de perigo".