O ex-ministro da Defesa, João Gomes Cravinho, defendeu e promoveu Alberto Coelho, então diretor-geral de recursos de Defesa Nacional (DGRDN), mesmo depois de saber das suspeitas que recaíam sobre este, nomeadamente relativas às obras no antigo hospital militar de Belém, que custaram o triplo do valor que estava previsto.
A informação foi noticiada esta quarta-feira, um dia depois de a Polícia Judiciária (PJ) e o Ministério Público (MP) terem avançado com uma "operação de grande envergadura", batizada "Tempestade Perfeita", no âmbito da qual foram efetuadas 59 buscas que resultaram em cinco detidos e 19 arguidos.
De acordo com a edição de hoje do "Diário de Notícias", Gomes Cravinho recebeu do seu secretário de Estado, Jorge Seguro Sanches, um extenso relatório sobre as suspeitas que tinha em relação aos ajustes diretos das obras no Hospital Militar de Belém e a falta de esclarecimentos por parte de Alberto Coelho, à data DGRDN, em relação aos custos da empreitada -- que passaram de 750 mil euros para 3,2 milhões, para transformar o espaço num centro de apoio ao combate à Covid-19.
"O dinheiro não se perde"
No despacho enviado por Seguro Sanches ao então ministro da Defesa, adianta o DN, o secretário de Estado indicava que não obteve de Alberto Coelho "resposta satisfatória e exigível às questões de autorização e comunicação das adjudicações realizadas, por ajuste direto, pela Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional (DGRDN) na obra".
Face a isto, propunha a "realização de uma auditoria à conformidade legal dos procedimentos administrativos e financeiros dos ajustes diretos da empreitada". Em julho de 2020, Gomes Cravinho aprovou e assinou um "visto com elevada preocupação", tendo sido chamado pelo PSD ao Parlamento para prestar esclarecimentos sobre o assunto um mês depois.
Na audição, o ministro da Defesa disse que já tinha pedido uma auditoria às obras no antigo hospital militar e relativizou a suspeita derrapagem, invocando uma "grande satisfação com a qualidade da obra" e indicando que o "dinheiro não se perde" dada a "valorização do ativo superior ao previsto".
Também destacou que, finda a pandemia, o espaço ia transformar-se numa unidade de cuidados continuados.
Depois do gasto de 3,2 milhões de euros para acolher 657 doentes Covid-19, 12 dos quais morreram, o CAM-Covid foi desativado em março de 2021, transformando-se em dezembro desse ano num espaço de acolhimento de 133 refugiados afegãos.
"Tempestade perfeita"
A operação designada "Tempestade Perfeita", de acordo com a PJ, é "uma investigação criminal" a alegados crimes de corrupção ativa e passiva, peculato, participação económica em negócio, abuso de poder e branqueamento, "relacionados com adjudicações efetuadas, por parte de organismo da Administração Central, a diversas empresas, as quais lesaram o Estado português em muitos milhares de euros".
À Renascença, o presidente da Associação Nacional de Sargentos (ANS) diz que esta investigação deve ser "levada até às últimas consequências".
“Mais do que surpreendido, fiquei, mais uma vez, desgostoso, porque a Defesa Nacional deveria estar isenta deste tipo de situações”, reagiu António Lima Coelho, criticando o que diz ser o "aproveitamento político-partidário" da situação, dado que os casos em causa "atravessam vários governos de vários partidos com responsabilidades".
Questionado sobre esta operação, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, defendeu que se deve aguardar "serenamente" pelos resultados da investigação, "sem formular juízos prévios".