António Guterres promete fazer tudo o que estiver ao seu alcance para garantir que a comunidade internacional exerça pressão suficiente sobre Myanmar (antiga Birmânia) para garantir o fracasso do golpe de Estado.
Numa entrevista ao jornal norte-americano The Washington Post, o secretário-geral das Nações Unidas diz esperar que a democracia possa avançar, de novo, no país, e que se alguma coisa pode ser apontada à líder do país e Nobel da Paz, Aung San Suu Kyi, agora detida, é de ter tido muita proximidade e cumplicidade com o Exército.
"Tudo vai ser feito para mobilizar os agentes da comunidade internacional para colocar pressão suficiente em Myanmar, de forma a assegurar que este golpe falhe. É completamente inaceitável reverter os resultados das eleições e a vontade do povo. Se se pode acusar Aung San Suu Kyi de alguma coisa é de ter sido demasiado próxima dos militares e de os ter protegido demais, nomeadamente, no que toca à dramática ofensiva do exército contra o povo rohingya. Aung San Suu Kyi assumiu a defesa dos militares no Tribunal Internacional”, defendeu Guterres.
Nesta entrevista ao Washington Post, o secretário-geral da ONU também lamenta que o Conselho de Segurança não tenha ainda chegado a um acordo sobre um texto comum, sobre a situação, na antiga Birmânia.
Questionado ainda sobre o que espera da nova administração da Casa Branca, depois de o democrata Joe Biden ter tomado posse, António Guterres destaca o papel essencial que os Estados Unidos desempenham para enfrentar as crises mundiais.
"Estamos a ter claras dificuldades no Iémen, como é sabido. A situação na Líbia ainda não está completamente resolvida. Estamos bloqueados na Síria, no Médio Oriente. Por isso, o envolvimento dos Estados Unidos para encontrar soluções para os mais dramáticos conflitos ou situações de guerra é extremamente importante”, referiu.
António Guterres afirma esperar que os Estados Unidos, Rússia, a União Europeia e as Nações Unidas possam reunir-se novamente nas próximas semanas, agora que há um novo presidente dos EUA.
Olhando para a anterior administração, o secretário-geral da ONU diz estar orgulhoso de ter mantido uma relação que classifica de funcional com Donald Trump.
Acrescenta António Guterres, em entrevista ao Washington Post, que os Estados Unidos devem ter também uma abordagem multilateral noutros temas como a proteção dos dados pela internet ou a segurança no ciberespaço.
Facebook denuncia bloqueio da rede social em Myanmar
O Facebook denunciou, esta quinta-feira, o bloqueio dos seus serviços em Myanmar, três dias após o golpe de Estado conduzido pelos militares, instando as autoridades "a restabelecer a conexão".
"Constatamos que o acesso ao Facebook está atualmente interrompido para determinadas pessoas", disse um porta-voz da empresa às agências de notícias France-Presse (AFP) e Efe, precisando que os operadores de telecomunicações no país "receberam a ordem para bloquear" aquela rede social.
"Instamos as autoridades a restabelecer a conexão, de modo a que os habitantes possam comunicar com as suas famílias e amigos e aceder a informações importantes", apelou o porta-voz.
O Facebook é extremamente popular na antiga Birmânia, onde é usado como principal meio de comunicação.
A rede social também é utilizada frequentemente por ministérios para publicar comunicados e tem sido usada nos últimos dias para organizar ações de desobediência civil, incluindo protestos ao som de buzinas e panelas e a paralisação de médicos e pessoal de saúde.
A organização não-governamental (ONG) NetBlocks, que denuncia restrições à internet em todo o mundo, confirmou na rede social Twitter que vários fornecedores em Myanmar estão a bloquear ou restringir o acesso ao Facebook, Instagram e WhatsApp, "com os operadores a aceitarem uma aparente ordem de bloqueio".
De acordo com a ONG, o fornecedor de internet MPT, propriedade do Estado, é responsável pela maioria dos bloqueios, recorrendo a "filtros seletivos".
A empresa privada Telenor também reduziu o acesso à rede social, segundo a NetBlocks.
Em comunicado, a Telenor, com sede na Noruega, confirmou que o Ministério de Transportes e Comunicações, controlado pelos militares, solicitou a "todos os operadores de telefone móvel e internet" que bloqueiem o Facebook.
"Apesar de a ordem ter base jurídica na legislação de Myanmar, a Telenor não acredita que o pedido se baseie na necessidade e proporcionalidade, em conformidade com o direito internacional dos direitos humanos", apontou a empresa.
A Telenor informou, no entanto, que cumprirá a ordem a partir desta quinta-feira, sublinhando ainda assim a sua "grave preocupação com a violação de direitos humanos" no país.
Com uma população de 54 milhões, Myanmar conta com cerca de 22 milhões de utilizadores do Facebook.
O partido da líder de facto do país, Aung San Suu Kyi, detida pelo Exército na segunda-feira, está a apelar à resistência pacífica, e na noite de terça-feira milhares de pessoas saíram às ruas da principal cidade, tal como apoiantes dos militares.
O grupo de ativistas Yangon Youth Network também criou o Movimento de Desobediência Civil "como resposta imediata" ao golpe.
O Exército de Myanmar declarou na segunda-feira o estado de emergência e assumiu o controlo do país durante um ano, após a detenção de Aung San Suu Kyi, do Presidente do país, Win Myint, e de outros líderes governamentais.
Myanmar emergiu há apenas dez anos de um regime militar que estava no poder há quase meio século.
Para justificar o golpe de Estado, imediatamente condenado pela comunidade internacional, os militares asseguraram que as eleições legislativas de novembro passado foram marcadas por “enormes irregularidades”, o que a comissão eleitoral nega.
Os militares evocaram ainda os poderes que lhes são atribuídos pela Constituição, redigida pelo Exército, permitindo-lhes assumir o controlo do país em caso de emergência nacional.
O partido de San Suu Kyi, que está no poder desde as eleições de 2015, venceu por larga maioria as eleições de novembro.
A vitória eleitoral da Prémio Nobel da Paz 1991 demonstrou a sua grande popularidade em Myanmar, apesar da má reputação internacional pelas políticas contra a minoria rohingya, a quem é negada a cidadania e o voto, entre outros direitos.