Debate IL vs CDU. O "paradoxo" da justiça pode-se resolver a "simplificar processos"?
14-02-2024 - 23:37
 • José Pedro Frazão , João Pedro Quesado com Lusa

Sem surpresas, um liberal e um comunista entraram num estúdio de televisão e em pouco concordaram. Se na justiça se focaram em pontos diferentes, os temas da economia e da saúde fizeram Rui Rocha e Paulo Raimundo pôr na mesa o contraste absoluto das soluções que defendem.

Paulo Raimundo e Rui Rocha foram os últimos a debater esta quarta-feira. No debate que opôs a Iniciativa Liberal à CDU antes das eleições legislativas de 2024, os dois líderes mostraram divergências nas áreas da saúde e da economia, mas começaram por falar de justiça, no dia em que os três detidos no caso de suspeitas de corrupção na Madeira foram libertados com termos de identidade e residência, após 21 dias de detenção para interrogatório.

O liberal Rui Rocha considerou inaceitável que alguém fique detido durante tanto tempo, independentemente da decisão instrutória, mas disse que quando ouve falar em "mexer na justiça" o que lhe "vem à cabeça é "intromissão do poder político na justiça".

Por isso, o líder da IL defendeu mais simplificação de processos e que é preciso "implementar as medidas que estão na estratégia anticorrupção". O presidente da IL voltou a falar de justiça administrativa para dizer que "850 dias para ter uma decisão em primeira instância", e que é preciso reduzir esse tempo "para metade".

"Como é que isso se faz? Da mesma maneira que se combate a corrupção, por exemplo, com simplificação de processos. O negócio dos corruptos é burocracia, e portanto, nós temos que simplificar processos", assegurou.

Para Paulo Raimundo, os casos mais recentes levam a uma grande desconfiança dos cidadãos em relação à justiça, um pilar sobre o qual considera que "nunca pode haver desconfiança". Mas descreve a desconfiança existente como paradoxal.

"Nós temos um conjunto de casos onde a os mais improváveis, diria assim, estão a ser chamados à justiça, pessoas conhecidas, o que dá uma sensação de que a justiça é igual para todos. Depois temos estes procedimentos e estes acontecimentos que acabam por lá está, daqui o paradoxo entre a perceção e a realidade. Esta é uma questão, é um problema que é preciso resolver", sustentou Paulo Raimundo.

O comunista destacou ainda a necessidade de mais meios e recursos na justiça, assim como de valorizar as carreiras dos profissionais do setor como solução para uma justiça mais célere.

Economia de privatizações ou de empresas públicas?

No tema da economia, as divergências foram tantas como as que seriam de esperar entre um liberal e um comunista. Rui Rocha defendeu que o Estado não deve salvar empresas com injeção de dinheiro, e que "quando as empresas correm bem, devem ter lucros, quando as empresas correm mal, devem assumir os seus prejuízos".

Paulo Raimundo contra-atacou com o argumento de que o Estado está a salvar empresas para entregar erradamente aos privados, "como se fez na Efacec", em que, diz, o Governo "limpou a empresa e depois dela estar limpa, em vez de pegar naquela naquela extraordinária capacidade produtiva", entregou a um grupo privado.

Na área fiscal, a IL defendeu a diminuição do IRS para as famílias, o aumento das isenções para atividades de trabalhadores independentes, a eliminação de "taxas e taxinhas com tributações autónomas" e a diminuição do IRC para atrair investimento estrangeiro.

Desta forma, argumentou Rui Rocha, é possível um aumento salarial de 5,5% ao ano, bruto, uma vez que, defendeu, "empresas grandes trazem inovação, tecnologia, produtividade" e também salários mais altos.
Do lado oposto, Paulo Raimundo disse acompanhar a preocupação com "taxas e taxinhas a mais" e acusou a IL de ter perdido uma oportunidade de combater o problema quando não acompanhou o PCP na proposta que levou ao parlamento de diminuir as comissões bancárias que custam aos contribuintes 6,5 milhões de euros por dia.

SNS precisa de mais profissionais, ou de mais PPP?

Sobre a saúde, Rui Rocha apontou culpas à "cegueira ideológica" do PCP pelo problema das listas de espera. O liberal disse que, juntamente com o Bloco de Esquerda, os comunistas fizeram pressão para que se acabassem com as parcerias público-privadas (PPP) no setor, levando ao "prejuízo dos utentes, dos contribuintes e dos profissionais".

O líder da IL defendeu a reativação das PPP que funcionavam bem, como o caso do hospital de Braga, citando relatórios do Tribunal de Contas, mas admitiu que nos casos em que o modelo atual dá resposta, ele deve ser mantido.

Paulo Raimundo contrapôs que o PCP não acompanhou o Orçamento do Estado em 2021, levando à dissolução da Assembleia da República, precisamente por causa dos problemas na saúde, e acusou a IL de querer dar "o golpe final" no Serviço Nacional de Saúde (SNS).

"O nosso problema no SNS é a falta de profissionais, isto é o grosso do problema", sublinhou Paulo Raimundo, acrescentando que a solução "é criar condições para fixar os médicos que existem", bem como os outros profissionais de saúde, com uma majoração salarial de 50% para os que optarem pelo regime de exclusividade no SNS.

Rui Rocha regressa aos debates esta quinta-feira, frente a Mariana Mortágua, coordenadora do Bloco de Esquerda (CNN Portugal, 18h). Já Paulo Raimundo vai enfrentar Pedro Nuno Santos no sábado, o último oponente do comunista nestes debates (SIC, 21 horas). Todos participam no debate das rádios, marcado para 26 de fevereiro às 10h, com transmissão em simultâneo na Renascença, Antena 1, TSF e Observador.