O Tribunal da Relação de Lisboa deu razão ao ex-primeiro-ministro José Sócrates e ao empresário Carlos Santos Silva, ao anular a decisão do juiz de instrução Ivo Rosa, que os remeteu para julgamento por branqueamento e falsificação de documentos no âmbito da Operação Marquês.
O Tribunal da Relação, "no âmbito do presente recurso limitar-se-á a declarar nula a decisão instrutória, na parte em que pronuncia os arguidos José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa e Carlos Manuel dos Santos Silva pela prática, em coautoria, de três crimes de branqueamento de capitais, (...) e de três crimes de falsificação de documento, (...) por consubstanciar uma alteração substancial dos factos", lê-se no acórdão a que a Lusa teve hoje acesso.
O coletivo da Relação de Lisboa decidiu ainda, em consequência da nulidade da pronúncia, "remeter os autos ao tribunal de primeira instância a fim de ser proferida nova decisão instrutória".
A nulidade, explicam ainda as juízas desembargadoras Maria José Cortes, relatora, e Maria do Rosário Martins, juíza adjunta, invalida a apreciação de outras questões suscitadas nos recursos do Ministério Público (MP), de José Sócrates e de Carlos Santos Silva.
Em declarações à Renascença, Ana Rita Campos, especialista em Direito Penal, diz que em causa estão apenas estes seis crimes de branqueamento de capitais e falsificação de documentos.
“O que significa esta decisão é muito simples, isto tem de ficar de fora deste processo porque se descobriu alguma coisa na decisão que fez com que a decisão instrutória fosse substancialmente diferente da acusação, neste campo.”
“O que a Relação tem de fazer é mandar baixar ao Tribunal de Instrução Criminal e dizer que tem de proferir nova decisão instrutória. Como? Expurgando a decisão instrutória que foi proferida desta ramificação. Pode acontecer é que seja extraída uma certidão e que o processo volte à fase de investigação quanto a estes factos que, aparentemente, só surgiram na fase de instrução do processo”, sublinha Ana Rita Campos.
A especialista em Direito Penal refere que não há recurso para o Supremo de uma decisão destas.
Também numa análise à notícia conhecida esta quinta-feira, Miguel Matias, advogado e penalista, reforça que a decisão do Tribunal da Relação implica um regresso à fase instrutória, e entende que não está fora de hipótese uma ida a julgamento.
“Significa que o Tribunal de Instrução Criminal, que já não será composto pelo mesmo juiz, como é óbvio, deverá apreciar os indícios que constavam da acusação, e não outros, e decidir se com estes indícios pronuncia para julgamento ou não”, adianta o especialista em Direito Penal.
O advogado Miguel Matias acrescenta que se a decisão for de não pronúncia, tanto José Sócrates como Carlos Santos Silva poderão ir a julgamento “salvo se, eventualmente, se suscitar uma outra questão relacionada com alguma eventual nulidade. Aí caberá recurso da mesma”, remata.
Na decisão de um recurso do Ministério Público, conhecida a 25 de janeiro, o Tribunal da Relação de Lisboa anunciou que o antigo primeiro-ministro será julgado por três crimes de corrupção no âmbito da Operação Marquês.
Sócrates reivindica "vitória total"
Em reação escrita enviada esta quinta-feira à agência Lusa, o ex-primeiro ministro considerou a decisão “uma vitória total”, mencionando que o acórdão lhe confere razão relativamente aos seis crimes de que estava acusado, acrescentando que quer o MP, quer Carlos Santos Silva, apenas tinham apresentado recurso relativamente aos crimes de branqueamento.
“O processo pequeno (o da pronúncia de Ivo Rosa) acaba hoje. Hoje acabam também as medidas de coação, o que quer dizer que acabou a GNR”, declarou José Sócrates, acrescentando que isto “não é pouco”.
O advogado do ex-primeiro-ministro, Pedro Delille, defendeu em declarações à Lusa que a partir de agora José Sócrates “está absolutamente despronunciado e que caiu tudo o que lhe era imputado”.
No entender da defesa de José Sócrates, o TRL, ao remeter para uma nova decisão instrutória, invalida também a decisão de janeiro da mesma instância sobre o recurso do MP que tinha ditado a ida a julgamento do ex-primeiro-ministro a julgamento por 22 crimes.
[notícia atualizada às 23h16]