A população da China praticamente parou de crescer, à medida que menos casais têm filhos, segundo dados do Governo chinês difundidos nesta terça-feira, indicando uma inversão da pirâmide demográfica que pode ter implicações para o país.
A população aumentou em 72 milhões de pessoas, nos últimos 10 anos, para 1.411 milhões, em 2020, segundo o Gabinete Nacional de Estatísticas (GNE) da China.
O crescimento médio anual fixou-se em 0,53%, em termos homólogos, uma queda de 0,04%, em relação à década anterior.
A China praticou um rígido controlo de natalidade, entre 1980 e 2016, em nome da preservação de recursos escassos para a sua economia em expansão.
A queda na taxa de natalidade é vista agora, no entanto, como grande ameaça ao progresso económico e à estabilidade social no país asiático.
A política de filho único foi abolida em 2016, mas os casais permanecem reticentes em ter mais filhos, face aos elevados custos de vida e discriminação das empresas contra as mães.
"A mão de obra ainda é abundante", disse o diretor das estatísticas chinesas, Ning Jizhe, em conferência de imprensa.
A percentagem de crianças na população aumentou ligeiramente, em comparação com 2010, mas a percentagem de população acima dos 60 anos aumentou mais rápido.
O grupo de pessoas em idade ativa, entre os 15 e os 59 anos, encolheu para 894 milhões, uma queda de cerca de 5% em relação ao pico de 2011.
As mudanças nos limites de natalidade e outras políticas "promoveram uma recuperação da natalidade", disse Ning.
No entanto, a mesma fonte disse que nasceram 12 milhões de bebés, no ano passado, uma queda de 18%, em relação a 2019, quando nasceram 14,6 milhões.
A China, junto com a Tailândia e alguns outros países asiáticos em desenvolvimento, enfrenta o risco de envelhecer antes de enriquecer. Alguns especialistas consideram que o país asiático enfrenta uma "bomba-relógio demográfica".
Refletindo a sensibilidade da questão, o gabinete de estatísticas da China tomou a decisão invulgar, no mês passado, de reagir a uma notícia do jornal “The Financial Times”, que avançou que o último censo tinha revelado um declínio demográfico.
"Estamos mais preocupados com o rápido declínio da população em idade ativa", disse Lu Jiehua, professor de estudos populacionais da Universidade de Pequim.
A população em idade ativa cairá de três quartos do total, em 2011 para pouco mais da metade, em 2050, de acordo com Lu.
"Se a população envelhecer, vai ser impossível resolver o problema por meio da imigração", disse Lu.
Poucos apoios à família
Os casais que desejam um filho enfrentam grandes desafios. Muitos dividem apartamentos com os pais em cidades densamente povoadas no litoral do país.
Os cuidados infantis são caros e a licença de maternidade curta. A maioria das mães solteiras está excluída do seguro médico e dos pagamentos da previdência social.
Algumas mulheres temem que o parto possa prejudicar as suas carreiras.
Demografia e economia
Japão, Alemanha e alguns outros países ricos enfrentam o mesmo desafio de sustentar populações envelhecidas com menos trabalhadores, mas podem recorrer ao investimento em fábricas, tecnologia e ativos estrangeiros.
Em contraste, a China continua a ser um país de renda média, com agricultura e manufatura intensivas em mão-de-obra.
O declínio da população em idade ativa "vai pôr um limite no crescimento económico potencial da China", disse Yue Su, da Economist Intelligence Unit, num relatório.
Trata-se de um "incentivo poderoso para introduzir reformas que aumentem a produtividade".
O Fundo Monetário Internacional prevê um crescimento económico de 8,4% para este ano, após uma recuperação da pandemia do novo coronavírus.
O Partido Comunista Chinês estipulou como meta dobrar o PIB (Produto Interno Bruto), por pessoa, até 2035, face aos níveis de 2020, o que exigiria um crescimento económico anual de cerca de 4,7%.
A política de filho único, imposta através de ameaças de multas ou perda de emprego, levou a abusos, incluindo abortos forçados.
A preferência por filhos homens levou os casais a abortar meninas, gerando um desequilíbrio entre o número de homens e mulheres, o que poderá alimentar a tensão social.
Os dados revelados nesta terça-feira mostram que a China tem 105,7 homens e meninos para cada 100 mulheres e meninas, ou cerca de 33 milhões a mais de pessoas do sexo masculino.
Alguns investigadores dizem que a população da China já está em queda.
Yi Fuxian, cientista em obstetrícia e ginecologia da University of Wisconsin-Madison, diz que a população começou a cair em 2018.
No seu livro "Big Country With An Empty Nest", argumentou contra a política de "um só filho".
"As políticas económica, social, educacional, tecnológica, de Defesa e externa da China são construídas com base em números errados", disse Yi.
Reguladores chineses falam em aumentar a idade oficial de reforma para os 55 anos, para aumentar o número de trabalhadores.
Os dados mais recentes colocam a China mais perto de ser ultrapassada pela Índia como o país mais populoso do mundo, o que deve acontecer até 2025.
A população da Índia no ano passado foi estimada pelo Departamento de Assuntos Económicos e Sociais da ONU em 1.380 milhões. A agência afirma que a Índia deve crescer 0,9% ao ano até 2025.