O relatório preliminar da comissão de inquérito à tutela política da gestão da TAP iliba o Governo no valor da indemnização que foi pago a Alexandra Reis para sair da TAP em 2022.
A relatora, a deputada socialista Ana Paula Bernardo, conclui que a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) apurou não existirem evidências de que a tutela acionista da TAP, o Ministério das Finanças, tivesse tido conhecimento do processo de saída de Alexandra Reis, não tendo existido comunicação nem por parte da TAP, nem por parte do Ministério das Infraestruturas, nem da própria Alexandra Reis.
Fica também claro, neste relatório, que Fernando Medina teve conhecimento no momento da publicação no site da CMVM do comunicado enviado pela TAP no dia 4 de fevereiro - data em que o então ministro Pedro Nuno Santos atendeu à vontade da ex-presidente executiva (CEO), Christine Ourmières-Widener, ao substituir a ex-administradora Alexandra Reis, dando “a sua aceitação ao valor acordado entre as partes”.
Quanto a Pedro Nuno Santos, o relatório conclui que nem o ex-ministro, nem o ex-secretário de Estado das Infraestruturas Hugo Mendes conheciam o clausulado do acordo, ainda que conhecessem a discriminação das várias parcelas englobadas no montante da indemnização.
O relatório conclui que o valor final de indeminização foi estabelecido entre os advogados e as partes, não tendo sido definido pelo Governo.
Daí que fique claro neste relatório que “Pedro Nuno Santos e Hugo Mendes assumiram as suas responsabilidades políticas na gestão deste processo, tendo apresentado as suas demissões em 28 de dezembro de 2022”, lê-se no relatório.
E, depois de vários meses de trabalho, a comissão e inquérito ainda não recebeu a informação formal de que Alexandra Reis já devolveu o dinheiro da indemnização, uma parte dos 500 mil euros.
O relatório que deu entrada na Assembleia da República poucos minutos antes da meia-noite conclui que ao longo de todo o processo não foi possível apurar com exatidão as razões e motivos que estiveram na base da saída de Alexandra Reis.
Apesar disso, a relatora, a deputada socialista Ana Paula Bernardo, diz que “foi visível o sentido de urgência que a então CEO imprimiu a todo o processo", o qual se encontra bem patente no curto espaço de tempo em que decorreu a “negociação” da indemnização.
Ao longo das audições, a relatora conclui que não existem evidências de que o departamento jurídico da TAP tenha sido envolvido no processo de cessação de funções da Alexandra Reis.
Fica também concluído que a forma como foi conduzido o processo de cessação de funções, a fundamentação e o cálculo do valor de compensação, não respeitou as disposições legais, nomeadamente o Estatuto de Gestor Público a que todos os administradores da TAP se encontravam, e ainda se encontram sujeitos.
Saída de Alexandra Reis da companhia e ida para NAV sem ligação
O relatório da CPI conclui ainda que não há qualquer relação entra a saída de Alexandra Reis da TAP e o convite, meses depois para a administração da NAV.
“Não existem evidências de qualquer conexão entre a saída da TAP e o convite e respetiva nomeação para a NAV”, lê-se no relatório. O documento refere ainda que "o perfil, as sólidas competências e o conhecimento profundo do setor por parte de Alexandra Reis foram os motivos apontados pelos então governantes para esta escolha”.
Não houve interferência política na gestão corrente da empresa
O relatório preliminar da comissão de inquérito conclui que não houve interferência das tutelas na gestão corrente da empresa.
“Não se registam situações com relevância material que evidenciem uma prática de interferência na gestão corrente da empresa por parte das tutelas", refere o documento.
A relatora assinala a declaração de Diogo Lacerda Machado que apontou para uma orientação de voto dada pela tutela, mas conclui que foi um caos excecional e isolado e que a norma era a da não ingerência.
O relatório conclui, porém, que foram identificadas lacunas na informação prestada pela TAP ao mercado, como a não integração da indemnização paga a Antonoaldo Neves no Relatório de Contas ou ainda sobre a informação enviada à CMVM no âmbito do processo de saída de Alexandra Reis. Contudo, não foram identificadas outras situações que comprovem a existência de informação inadequada ou imprecisa prestada pela TAP ao acionista Estado.
Pagamento de 55 milhões a David Neelman não foi consensual
Ao longo de 180 páginas, a deputada socialista Ana Paula Bernardo destaca ainda o processo de privatização no Governo de Passos Coelho, a situação financeira da companhia aérea, os fundos Airbus e a indemnização a David Neelman.
Ana Paula Bernardo escreve que o pagamento de 55 milhões de euros a David Neelman surge depois de uma negociação difícil com os acionistas privados, para que o Estado pudesse obter 72,5% do capital social. O pagamento decorre de um acordo e de uma negociação entre as partes.O relatório indica, porém, que não foi consensual a obrigação de pagamento a David Neelman, sobretudo, num contexto de alguma incerteza jurídica sobre os termos em que foi realizada a privatização em 2015, com recuso ao mecanismo “Fundos Airbus”.
Sobre os fundos Airbus, que serviram para capitalizar a TAP com dinheiro da própria companhia, o relatório conclui que a Parpublica deu anuência a este acordo, no momento da privatização da TAP, no Governo de Pedro Passos Coelho. No momento da transição de pastas para o Governo de António Costa, a CPI apurou que a informação transmitida foi semelhante à que foi entregue ao Tribunal de Contas.
Só o ano passado, a pedido da TAP, foi dado a conhecer às tutelas os resultados de uma auditoria que foi enviada pelo Governo ao Ministério Publico.
Sobre a privatização da TAP no Governo de Passos Coelho, o relatório segue a argumentação do partido socialista, dizendo que “face ao contexto político que se vivia no momento, a reprivatização não deveria ter sido concluída naquela data”.