É já na terça-feira que o Papa parte para uma viagem a favor da paz na República Democrática do Congo (RDC) e no Sudão do Sul.
Os dois países, dilacerados por conflitos, violência e guerra civil, acolhem Francisco com enorme esperança. Esta viagem foi anunciada e organizada para o início de julho do ano passado, mas Francisco viu-se obrigado a adiar por causa de problemas no seu joelho.
Reconciliação urgente na RDC
A RDC é o primeiro país a ser visitado, de 31 de janeiro a 3 de fevereiro, mas - ao contrário do chegou a estar anunciado - o Papa cancelou a sua deslocação à cidade Goma, no Norte Kiwu, devido ao aumento da violência causada por movimentos de guerrilha que, ultimamente têm causado centenas de vítimas civis. “Não vou lá por ter medo, mas para evitar que atirem uma bomba para o estádio e matem mais pessoas”, declarou o Papa, recentemente, a uma revista missionária.
A RDC, com 100 milhões de habitantes, é o terceiro maior país africano e o maior país católico deste continente, com quase 50 milhões de baptizados. Com 200 etnias e 400 tribos, é um país rico em matérias-primas, com diamantes, ouro e lítio e é também por isso que está devastado por interesses de poderosas multinacionais e graves conflitos entre tribos e etnias.
O país vive uma grave crise humanitária por causa da extrema violência na fronteira no leste com o Ruanda, cujo epicentro é Goma. A cidade é alvo de ataques constantes do M23, movimento rebelde tutsi, extremamente violento, que pretende controlar os acessos principais às minas que existem naquela região. Na fronteira com o Uganda, há também problemas com ataques de terroristas muçulmanos ligados ao Daesh.
Segundo o Programa Alimentar Mundial da ONU, há 26 milhões de pessoas na RDC que enfrentam fome severa.
Francisco já disse que visita a RDC “com a esperança de que cessem as violências no leste do país e prevaleçam o caminho do diálogo e a vontade de trabalhar em prol da segurança e do bem comum”.
Há 37 anos que um Papa não visita o país. João Paulo II foi lá duas vezes, em 1980 e em 1985, quando ainda se chamava Zaire.
O tema escolhido para esta visita é: “Todos reconciliados em Jesus Cristo”. A agenda do Papa inclui, além das habituais celebrações e discursos, um encontro com vítimas da violência.
No Sudão do Sul, uma unidade “a três” pela paz
A etapa seguinte é o Sudão do Sul, o país mais jovem do mundo, declarado independente pelas Nações Unidas em 2011. Trata-se de uma viagem inovadora, de 3 a 5 de fevereiro, "realizada a três” e há muito sonhada pelo Santo Padre.
Quando aterrar em Juba, o Papa será saudado, no aeroporto, não só pelo presidente do Sudão do Sul, mas também pelo arcebispo de Cantuária Justin Welby e pelo Moderador da Assembleia Geral da Igreja da Escócia, Iain Greenshields. “Juntos, desejamos unir-nos ao grito de paz da população e contribuir para o processo de reconciliação nacional”, disse Francisco no início deste ano aos diplomatas acreditados no Vaticano. E "como irmãos, viveremos uma jornada ecuménica de paz”, acrescentou este domingo, na Praça de São Pedro.
Numa declaração publicada também este domingo, o líder anglicano referiu: "esta será uma visita histórica. Depois de séculos de divisão, líderes de três realidades diferentes do cristianismo, unem-se de uma forma sem precedentes”, disse Welby.
O Sudão do Sul, com 11 milhões de habitantes e 50 por cento de católicos, vive em harmonia, sem qualquer divisão entre cristãos. O problema são as lutas internas entre clãs e as rivalidades para ocupar as zonas mais ricas. E, sobretudo, a pobreza extrema e má nutrição em que o país se encontra. 80% da população vive em zonas rurais com menos de 2 dólares por dia. Onde 3 milhões de pessoas passam fome e 105 mil crianças correm o risco de morrer de fome se não receberem ajuda imediata.
Com petróleo no norte do país, já sofreram duas guerras civis. Uma, antes da independência e a outra dois anos após a independência, quando as forças leais ao presidente Salva Kiir entraram em confronto com as forças leais ao vice-presidente Riek Machar, de um grupo étnico diferente. O derramamento de sangue transformou-se numa trágica guerra civil que matou 400 mil pessoas.
As Nações Unidas revelam que existem 2,2 milhões de deslocados internos no Sudão do Sul e que outros 2,3 milhões fugiram do país como refugiados. E, neste contexto, a própria ONU tem elogiado a Igreja Católica como uma "força poderosa e ativa na construção da paz e reconciliação em regiões devastadas por conflitos“.
Em 2018, um acordo político tentou pôr fim aos conflitos, partes deste acordo – incluindo o envio de um exército nacional reunificado – ainda não foram implementadas.
Em abril de 2019, o Papa chamou a Roma os principais líderes, para um tempo de retiro e diálogo no Vaticano. No final deste encontro, Francisco ajoelhou-se para beijar os pés dos líderes do Sudão do Sul, exortando-os a não voltarem à guerra civil.
Com o processo de reconciliação ainda em curso, a população espera que a presença do Papa ajude a pôr fim à violência entre clãs, uma vez que o actual governo ainda é o mesmo que liderou a guerra civil e continua a contar com os militares para assegurarem alguma estabilidade no país.
Um dos pontos altos desta visita será o encontro de Francisco com representantes dos mais de 30 mil deslocados internos, por causa da guerra.