O ano 2020 foi “foi mais desafiante da nossa vida individual e global”, diz a presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens, no dia em que é divulgado o relatório anual da atividade das Comissões de Proteção de Crianças e Jovens.
De acordo com este documento, no ano passado foram comunicadas mais de 41 mil situações de perigo (41.337), menos 2.459 do que em 2019, mas mais do que em 2018.
O destaque vai para a violência doméstica, com 13.363 casos comunicados, o que significa um aumento de 7,6%. Os restantes diagnósticos – perigo na infância e juventude (5.594) e negligência (11.955) – registaram uma diminuição.
No que diz respeito à violência doméstica, as situações mais comunicadas foram "ofensa física em contexto de violência doméstica" – cerca de 97% das situações de perigo nesta categoria.
No que se refere à negligência, as situações de perigo mais comunicadas são a exposição a comportamentos que possam comprometer o bem-estar e desenvolvimento da criança (25%) e a falta de supervisão e acompanhamento familiar (perto de 21%).
As situações de perigo comunicadas referem-se, sobretudo, a crianças nas faixas etárias entre os 6 e os 17 anos de idade (70%), com valores ligeiramente mais elevados no escalão etário dos 11 a 14 anos.
De acordo com o relatório divulgado nesta quarta-feira, 473 do total de situações comunicadas corresponderam a crianças já em acompanhamento.
Reinventar para nenhuma criança ficar para trás
A presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens garante que as comissões de proteção conseguiram reinventar-se para que nenhuma criança ficasse para trás.
“O ano de 2020 foi o ano mais desafiante da nossa vida individual e global [devido à pandemia], aprendemos a viver na vulnerabilidade, incerteza, complexidade, ambiguidade, ter que todos os dias acertar a bússola para perceber o caminho, mas também nos ajudou a uma capacidade de resiliência e reinvenção extraordinária”, disse Rosário Farmhouse à agência Lusa.
Apesar de “todos os ventos e marés, [as comissões de proteção] conseguiram reinventar-se”, assegura.
No âmbito da prevenção, explicou, chegaram a mais de um milhão de pessoas, transformando atividades presenciais em atividades virtuais “para garantir que as crianças e famílias se sentiam acompanhadas”.
Já no que respeita à proteção, apesar de um número mais reduzido de crianças acompanhadas e de comunicações de perigo, “garantiram que nenhuma criança ficava para trás mesmo com equipas mais reduzidas”.
As equipas tornaram-se mais coesas e mais criativas, “com dedicação extrema para garantir que a prevenção e proteção estavam a acontecer”, refere Rosário Farmhouse, considerando também que a pandemia exigiu que a sociedade ficasse mais atenta.
“A pandemia que trouxe tantas coisas menos boas, tantas mortes, isolamento, desemprego, problemas de saúde mental, também trouxe estas capacidades de esperança de nos reinventarmos, ser resilientes, de estar atentos e responder aos desafios que estão a nossa volta”, disse.
O que diz a lei?
A Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (LPCJP) diz que, sempre que os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto ponham em perigo a segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento, ou quando esse perigo resulte de ação ou omissão de terceiros ou da própria criança ou do jovem tem lugar a intervenção para a promoção dos direitos e proteção das crianças e jovens.
Caso sejam confirmadas as situações perigo comunicadas a intervenção das CPCJ só pode iniciar-se com o consentimento expresso dos pais, do representante legal ou da pessoa que tenha a guarda de facto, e a não oposição da criança com idade igual ou superior a 12 anos.
A legitimidade de intervenção da CPCJ pode cessar a todo o momento, caso os pais ou responsáveis legais ou quem tenha a guarda de facto retirem o consentimento à intervenção, ou a criança/ jovem expresse a sua oposição. Nestes casos, o processo de promoção e proteção será remetido para o Ministério Público.