Iqaluit, na ilha de Baffin, no arquipélago ártico, foi a última paragem do Papa na visita ao Canadá. Antes do regresso a Roma, Francisco encontrou-se em privado com alunos das antigas escolas residenciais. Reuniu-se de seguida com jovens e idosos da comunidade inuit, numa das praças da cidade, a quem reafirmou a dor que sente, por ter havido tantos católicos que também foram responsáveis pela política de assimilação cultural e maus tratos aos indígenas. E garantiu total empenho no caminho de reconciliação que está a ser feito.
“Há pouco, escutei vários de vós, ex-alunos das escolas residenciais. Obrigado pelo que tiveram a coragem de dizer, partilhando grandes sofrimentos, que não imaginava. Isso reavivou em mim a indignação e a vergonha, que há meses me acompanham. Também hoje, e aqui, quero dizer o grande pesar que sinto, e pedir perdão pelo mal que cometeram não poucos católicos nestas escolas, contribuindo para as políticas de assimilação cultural”, afirmou.
O Papa elogiou a capacidade que o povo daquela região tem tido para ultrapassar as dificuldades que a natureza lhes coloca sempre, e transmitir “de geração em geração valores fundamentais, como o respeito pelos idosos, um sentido genuíno de fraternidade e o cuidado pelo meio-ambiente”.
“Há uma bela correspondência entre vós e a terra que habitais, porque também esta é forte e resiliente, e responde com tanta luz à escuridão que a envolve durante grande parte do ano”. E pediu aos jovens inuit que, “apoiados pelo exemplo dos idosos”, cuidem “ da terra, das pessoas e da história”.
“Caminha para o alto, vem à luz e faz equipa”
Apresentando-se como “irmão idoso”, Francisco convidou os jovens a aceitarem três conselhos, o primeiro o de caminharem “para o alto” para “ir mais longe”, não nivelando “por baixo” o que fazem, nem desistindo dos sonhos.
“Pensa na andorinha do Ártico, que não deixa que os ventos contrários, ou as mudanças bruscas da temperatura, a impeçam de ir de uma extremidade à outra da terra; às vezes escolhe rotas que não são diretas, aceita fazer desvios, mas mantém sempre clara a meta”, disse o Papa, lembrando que o futuro está nas mãos dos jovens, mesmo quando parece difícil.
“Como posso levantar vôo num mundo que cai cada vez mais fundo, no meio de escândalos, guerras, enganos, injustiças, destruição do ambiente, indiferença pelos mais frágeis, deceções por parte de quem devia dar o exemplo? Perante estas perguntas, qual é a resposta? Quero dizer-te a ti, irmão e irmã jovem: tu és a resposta, não só porque se te rendes já perdeste, mas porque o futuro está nas tuas mãos”, disse o Papa.
Francisco avançou, depois, com um segundo conselho: “vem à luz”, pedindo aos jovens que não se rendam à escuridão, e sejam responsáveis nas suas escolhas.
“Qual é a força que nos permite separar a luz das trevas dentro de nós? Que nos faz dizer ‘não’ às tentações do mal e ‘sim’ às ocasiões do bem? É a liberdade, que não consiste em fazer tudo o que me apetece e vem à cabeça; não é aquilo que posso fazer, não obstante os outros, mas pelos outros; não é total arbítrio, mas responsabilidade”.
“Se queres fazer Deus feliz, este é o caminho: escolher o bem”, disse o Papa que, como último conselho, lembrou aos jovens a diferença que faz trabalhar em equipa.
“Os jovens fazem grandes coisas juntos. São como as estrelas do céu, que brilham de maneira esplendida. É necessário permitir que os jovens formem grupos, que tenham movimentos, e não passem os dias isolados, reféns de um telemóvel", defendeu, dando como exemplo o que acontece no desporto que ali é tão popular: o hóquei no gelo.
“Como é possível que o Canadá conquiste todas aquelas medalhas olímpicas no hóquei? É que o hóquei combina bem disciplina e criatividade, tática e força física; mas o que faz a diferença é sempre o espírito de equipa, pressuposto indispensável para enfrentar as circunstâncias imprevisíveis de jogo”, afirmou Francisco.
Com este discurso - que, para além do inglês, foi sendo traduzido também para a língua inuktitut - o Papa concluiu a sua visita ao Canadá, tendo agradecido todas as canções e danças tradicionais com que foi brindado no início deste encontro por parte de diversos elementos e famílias da comunidade Inuit.