Foi louvável e oportuna a iniciativa do Conselho Económico e Social de promover uma conferência, no dia 29 de novembro último, na Fundação Oriente, que serviu para esclarecer a sociedade civil quanto às alternativas aeroportuárias para Lisboa.
De facto, para além das cinco alternativas apontadas pelo Governo, a comissão técnica, que já foi nomeada, pode apresentar outras propostas, poder este que lhe foi conferido pelo executivo.
É do conhecimento público que a proposta do Hub Alverca-Portela é uma candidatura certa a esta modalidade e é natural que a proposta da Ota (por ter sido desenvolvida no passado) também o seja. Que tenha sido anunciada até à data, não se conhece mais nenhuma proposta para esta modalidade de inclusão no estudo a efetuar, em 2023, a pedido do Governo.
Certamente que, sendo conhecedor daquelas duas candidaturas credíveis, o CES alargou o convite à sua participação na referida conferência, que foi, provavelmente, até hoje, a mais completa aclaração do quadro decisório do aumento da capacidade aeroportuária de Lisboa.
Finalmente, num só encontro, os proponentes das soluções aeroportuárias baseadas em ampliações duais e em infraestruturas de raiz, o direto representante da população de Lisboa e o potencial financiador da infraestrutura (VINCI), expuseram os seus pontos de vista e ouviram as opiniões de um painel de especialistas. Que no fim teve a conclusão do então ministro das Infraestruturas.
Sem tibieza, o CEO Thiérry Liggoniére matou as ilusões sobre eventuais investimentos “faraónicos” em infraestruturas de raiz à custa da VINCI. No painel de convidados, os presidentes das Câmaras de Lisboa e Porto não hesitaram no apoio inequívoco à manutenção da Portela num formato reduzido e ambos disseram ser impensável um aeroporto à distância de Santarém. O engenheiro João Cravinho pôs a nu, com a frontalidade que se lhe reconhece, alguns dos misteriosos contornos da apressada decisão de aeroporto CT Alcochete, por uma comissão de um organismo público (LNEC).
A solução Portela principal + Montijo low cost abordou este último como negócio. Numa seguinte oportunidade, certamente que o proponente da solução abordará a vertente técnico-ambiental Montijo e, sobretudo, como enquadra o reforço da Portela, que o presidente da Câmara (anterior e atual) se recusa a aceitar.
A envolvente da apressada substituição da hipótese Ota por CT Alcochete foi mais esclarecida.
A solução Alcochete continua igual desde 2007.
A solução Santarém apresentou apenas um projeto virtual, sem nada de concreto. Mas, importante, confirmou que será faseado, assentando o seu estudo de viabilidade em mais de 150 milhões de passageiros.
A solução Alverca-Portela apresentou, em pormenor, os principais aspetos técnico-ambientais da proposta.
A hipótese Montijo principal + Portela continua sem patrono, registando “falta de comparência”.
Foi muito útil, mas levantou novas dúvidas. É preciso mais. E Portugal merece mais.
Merce ser compensado dos (muitos) atropelos que foram cometidos pelas mais diversas entidades envolvidas neste processo ao longo dos últimos anos. Citam-se alguns dos que reputamos mais gravosos:
- A concessionária, a quem o Estado tinha dado a exclusividade na apresentação de alternativas ao NAL, não encorpou a associada responsabilidade de ser ela a fazer uma aprofundada due diligence das possíveis alternativas. Nas três identificadas bases aéreas, limitou-se a observar as pistas existentes.
- Ao verificar que o tráfego aéreo em Lisboa estava a ter um enorme crescimento, antecipando em muitos anos as expetativas aquando da assinatura do contrato de concessão, apressadamente deu por encerrada a due diligence, apresentando a solução HUB Portela + Montijo como a única que estava dentro dos limites financeiros que poderiam ser disponibilizados pelo upside (de receitas) esperado. Ora, esse upside financeiro dependerá da solução. Por exemplo, na solução em que se veio a fixar (Portela 75% do tráfego, Montijo 25%), a ANA-VINCI refere cerca de € 1.400M.
- Conhecida mundialmente por promover a responsabilidade social, em Portugal parece ter posto esta vertente totalmente de lado. Como se explica que tenha insistido, ao longo dos últimos anos, na solução Portela (75%) + Montijo (25%), já conhecendo o extraordinário nº de pessoas afetadas por ruído excessivo em Lisboa e Loures (e que ainda pioraria com o futuro aumento do tráfego aéreo)? Para já não falar da perigosa pista que propunha para o aeroporto do Montijo e dos graves problemas ambientais nas imediações deste aeroporto, também sobejamente conhecidos e denunciados por muitos, a começar pelas organizações ambientalistas. Podemos estar enganados, mas só vislumbramos uma razão: o receio de incumprimento contratual, com eventuais consequências financeiras desastrosas. Daí ter surgido uma solução que se “vendeu” como única, sobretudo em termos de rapidez e de custo, e que foi rapidamente “comprada” pelos principais responsáveis do turismo e hotelaria. E até pelo governo de então.
- Mais: fugiu sempre à elaboração de uma Avaliação Ambiental Estratégia (AAE), que teria que envolver forçosamente a Portela e o Montijo – e não apenas o Montijo, como veio a acontecer com o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) que a concessionária apresentou e que, apesar das centenas de limitações que lhe foram impostas, lá acabou por passar, contra as expetativas de muitos peritos.
- Neste intervalo de tempo, a ANA-VINCI conhecia pelo menos mais uma alternativa, a do HUB Alverca-Portela, que encaixava, com folga, no seu teto financeiro (1.400M€), e que lhe foi apresentada pelos proponentes desta solução, tal como todos os seus desenvolvimentos posteriores.
O certo é que factos supervenientes vieram dar um novo rumo ao processo, a começar pela decisão da Assembleia da República de obrigar à realização de uma AAE do conjunto dual, o que levou as “carpideiras” do costume a dizer que o processo voltava à “estaca zero”, em vez de gritar alvíssaras, na sequência de, pela primeira vez na história recente de Portugal, na conceção de um grande empreendimento público, ser dada oportunidade à sociedade de também poder apresentar soluções e a garantia de estas serem avaliadas em pé de igualdade por uma Comissão Técnica independente.
É um passo HISTÓRICO, que nos aproxima das sociedades mais modernas, onde esta política está há muito implementada, com retorno positivo. No tempo, pode-se de facto dizer que voltámos à “estaca zero”, mas desta vez virtuosa. Será que este novo conceito também não poderá ser implementado no projeto da Alta Velocidade? Só tem menos tempo que o aeroporto porque a tecnologia dos comboios apareceu mais tarde!
*Luís Janeiro, Professor da Católica Lisbon School of Business & Economics
Este espaço de opinião é uma colaboração entre a Renascença e a Católica Lisbon School of Business and Economics