Há duas novidades num caso que tem sete anos. Portugal tinha sido condenado pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) em janeiro de 2020 a indemnizar o pai de um dos jovens que morreu – um pagamento que só agora foi feito. Mas a Renascença também apurou que os pais dos seis jovens que desapareceram na praia do Meco, em 2013, preparam nova ação em tribunal para responsabilizar, agora cá, o Estado.
Nove meses após ter sido condenado pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, o Estado português pagou este mês os 13 mil euros a José Soares Campos, pai de Tiago Campos a primeira vítima do caso Meco a ser resgatada do mar. A queixa tinha sido apresentada em maio de 2016 por este pai, em representação de todos os outros, alegando que “a morte do filho tinha sido causada pela falta de um enquadramento legal que regule as atividades de praxe nas universidades portuguesas” queixando-se de que a “investigação às circunstâncias da morte do seu filho não tinha sido eficaz”. Os juízes europeus não deram razão à questão da praxe, mas admitiram que existiram falhas na investigação do caso. O Estado recorreu sem sucesso e não conseguiu reverter a condenação.
“O valor dos 13 mil euros é arbitrado, foi o valor jurídico encontrado pelo tribunal para condenar o Estado nesta situação. Não está em causa o apuramento da morte dos jovens, apenas o incumprimento dos princípios da Convenção Europeia dos Direitos do Homem por parte desta investigação. Isto não é uma indemnização pela morte dos jovens, mas a condenação do Estado porque o ministério público violou a Convenção e permitiu que não fossem preservadas provas”, esclarece Vitor Parente Ribeiro, advogado que faz a defesa das famílias, acrescentando que “este processo ainda não terminou e os pais vão continuar a querer saber o que aconteceu naquela noite de 15 dezembro de 2013 na praia do Meco. A luta continua e esta foi apenas, e só, uma pequena batalha vencida. Ainda há processos pendentes e vamos continuar a lutar com todas as nossas forças”, garante.
Depois de avaliar o caso, o TEDH concluiu que a investigação não satisfez os requisitos da legislação europeia e que “uma série de medidas urgentes podiam ter sido tomadas imediatamente após a tragédia” e não foram. Sublinhou que, “para uma investigação ser eficaz, as autoridades tinham de dar todos os passos razoáveis ao seu alcance no momento para proteger as provas relacionadas com o incidente”.
Nova ação contra o Estado Português
Os 13 mil euros vão servir para pagamento de custas e taxas de justiça dos processos em tribunal movidos por todos os pais.
“Vai ser intentado um processo no Tribunal Administrativo. Aí sim, a pedir uma indemnização ao Estado pelo péssimo trabalho do Ministério Público nesta investigação”, avança o advogado.
Esta ação vai dar entrada no dia 15 de dezembro de 2020, quando se assinalam os sete anos da tragédia no Meco.
“Neste Tribunal Administrativo o que os pais querem é que o Estado seja obrigado a indemnizar os pais individualmente por tudo o que não fez, e podia e deveria ter feito, nesta investigação”, sublinha Vitor Parente Ribeiro.
Ação Cível contra Lusófona e ‘Dux’ estagnada há cinco anos
“Ainda temos uma ação, pendente há vários anos, no Tribunal de Setúbal onde demandámos João Gouveia e a Universidade Lusófona. Aqui esperamos que surjam mais factos e sejam apurados para concluir o que aconteceu naquela noite. Queremos que João Gouveia preste declarações e se possa fazer luz sobre o que os pais tanto anseiam que é a descoberta da verdade”, lembra o advogado.
Vitor Parente Ribeiro não consegue compreender tanta demora. “Continuamos há anos à espera do início do julgamento. Pelos vistos é um processo que ninguém quer pegar, o caso arrasta-se há cinco anos sem que exista julgamento ainda marcado. Primeiro foi extinto um dos juízos e o processo foi redistribuído, também já chegou a ser remetido de Lisboa para Setúbal. Tudo questões de natureza processual e depois o que verdadeiramente parece é que ninguém quer pegar no processo, parece que queima a quem lhe toca”, critica.
Seis jovens morreram em 2013
Seis estudantes da Universidade Lusófona morreram em 2013 na praia do Meco na sequência de uma praxe na madrugada de 15 de dezembro, altura em que foram levados pelas ondas de um mar revolto. João Gouveia, o ‘Dux’ (líder da praxe), acabou por ser o único sobrevivente daquela noite.
Logo a 16 de dezembro, após a descoberta do corpo de Tiago Campos, foi aberto um inquérito às circunstâncias da morte dos jovens, que viria a ser arquivado em julho de 2014 sem indícios de crime e sem culpados. A Polícia Judiciária apurou que se tratou de um acidente.
O caso foi reaberto em outubro de 2014, com João Gouveia a ser constituído arguido, mas em março de 2015 o tribunal decidiu não enviar o caso para julgamento. Após recurso das famílias o Tribunal da Relação de Évora concordou que o caso não devia ir a tribunal alegando que as vítimas eram adultas e não haviam sido privadas da sua liberdade durante a praxe, pelo que não havia responsabilidade criminal sobre João Gouveia.