A coordenadora do Bloco de Esquerda reclamou este domingo “o fim da lei dos compromissos no SNS”, criticou a Ordem dos Médicos por dificultar o acesso destes profissionais à especialidade e defendeu a criação da carreira de técnico auxiliar de saúde.
“Há uma coisa muito importante que é a capacidade de o Serviço Nacional de Saúde [SNS] usar os meios de que precisa. E foi criada uma coisa chamada leis dos compromissos, é uma lei de ‘troika’, que torna difícil os serviços públicos assumirem responsabilidades financeiras das encomendas de que precisam”, afirmou Catarina Martins durante a sessão “Vencer a Crise”, uma das iniciativas que marcou a ‘rentrée’ do BE na cidade do Porto.
Numa intervenção centrada nas “lições a tirar da pandemia” na área da saúde, a líder bloquista salientou que a lei dos compromissos “coloca problemas tão absurdos para o SNS como, por exemplo, determinadas unidades de saúde poderem encomendar medicamentos”.
Considerando essencial “retirar da lei os entraves burocráticos a que as instituições de saúde façam o que precisam”, Catarina Martins disse que tal deve ser feito “seja com o fim da lei dos compromissos no SNS, seja com a autonomia das instituições para contratarem os profissionais de que precisam”.
Na sua intervenção, a coordenadora do Bloco defendeu ainda a necessidade de aumentar o número de médicos em Portugal, nomeadamente de médicos de especialidade, cuja falta considera ser “um enorme problema” no país, em parte devido à atuação da Ordem dos Médicos.
“Em 2019 já havia mais de 1.000 médicos à espera de terem acesso à especialidade. É absurdo faltarem especialistas e termos tantos médicos formados à espera de acesso à especialidade”, afirmou, considerando que “um dos problemas tem sido a Ordem dos Médicos, que acha sempre que não se pode abrir ensino de especialidades, mesmo em unidades que são reconhecidas internacionalmente como referências nessa área”.
Avisando o Governo que “não tem de obedecer à Ordem dos Médicos e pode e tem de abrir mais especialidade”, Catarina Martins reiterou que “nada é mais absurdo do que um país que precisa de médicos e médicos que não têm acesso à formação, querendo fazê-la e querendo trabalhar no SNS”.
“É certo que podemos formar mais médicos. Mas o que é mais absurdo é que temos formado médicos a quem depois não damos acesso à especialidade e que servem para ser contratados à hora, prestadores de serviços, para ir dar uma perninha nas urgências. Estamos a desperdiçar médicos que podiam ter a sua especialidade e estar a trabalhar no SNS, onde fazem falta, e que, na verdade, são médicos que andam a trabalhar de recibo verde em recibo verde, um pouco por todo o país”, sustentou.
Outra das prioridades apontadas pela coordenadora do BE foi a criação da carreira de técnico auxiliar de saúde, no âmbito de uma estratégia para “valorizar, captar e fixar recursos no SNS”.
“Precisamos mesmo de gente a trabalhar no SNS. Portugal tem profissionais do SNS muito competentes, muito qualificados, muito maltratados. Tantos acabam até por emigrar. E há uma categoria de trabalhadores que não tem sequer carreira, a que se chamam assistentes operacionais, e que têm das tarefas mais duras nas instituições de saúde, correm riscos para a sua saúde todos os dias, não estão com a família e ganham pouco mais do que o salário mínimo nacional”, disse.
Avançando serem “mais de 28 mil os assistentes operacionais do SNS hoje sem carreira específica”, Catarina Martins sublinhou que, “se há coisa que a covid mostrou, é como em Portugal trabalhadores fundamentais têm salários de miséria”.
“Lutaremos por todos eles”, garantiu, defendendo, “desde logo, [que] no SNS tem de existir uma carreira de técnico auxiliar de saúde, porque é isso que são e é essa a carreira e o respeito que merecem”.
Ainda apontada pela líder do Bloco foi a necessidade de “o SNS chegar a áreas onde nunca chegou”, defendendo um “reforço das respostas” a nível da saúde mental, do acesso a dentistas e oftalmologistas, do acompanhamento ao envelhecimento da população e da internalização de análises e exames.
“Estamos empenhados em encontrar soluções, num país que percebe que nada pode ser como dantes, que sabe que vamos ter de viver com uma pandemia durante mais algum tempo e que compreende que uma sociedade fragilizada, precária e muito desigual é também um dos maiores problemas quando enfrentamos esta pandemia”, sustentou, acrescentando: “Temos de ser criteriosos a usar os recursos públicos, porque não queremos uma resposta à crise que mais uma vez salva o sistema financeiro e deixa o povo para trás”.