Um ano depois, os estrangeiros que garantiam 70% da receita hoteleira ainda não regressaram a Fátima e Alexandre Marto Pereira, que dirige o maior grupo da região – Fatima Hotels – sublinha que os países têm de harmonizar regras e de as clarificar para que a operação internacional possa ser retomada.
Em declarações à Renascença, este responsável acrescenta que os católicos de todo o mundo acompanham as cerimónias virtualmente e compreendem a metodologia do Santuário, que a valorizam e pode gerar retorno.
Quanto aos portugueses, voltaram a incluir Fátima nos destinos, sobretudo nas datas aniversárias das aparições e ao fim de semana.
Os hotéis abertos ainda não muitos, mas os que se aventuraram, conseguem esgotar nessas alturas, com um incentivo da Câmara de Ourém.
“As coisas ainda estão bastante difíceis, mas claramente, a melhorar. Os peregrinos (portugueses) estão a regressar, estão a ficar e a aproveitar Fátima. São uma pequena parte das multidões que tínhamos, mas a verdade é que os fluxos nacionais estão quase normalizados; os internacionais é que ainda estão perto do zero”, explica à Renascença Alexandre Marto Pereira, presidente executivo do grupo Fatima Hotels, que agrega uma dezena de hotéis independentes da região.
Antes da pandemia, 30% da ocupação hoteleira era feita por clientes nacionais e 70%, por estrangeiros. São esses que “alimentam” a economia de Fátima e da região de Ourém.
“O problema é a total falta de funcionalidade dos fluxos internacionais, nomeadamente por não haver voos, burocracia com passagens transfronteiriças, a confusão com os testes PCR, etc. É uma confusão que impede que o turismo internacional regresse”.
Mesmo entre os países da União Europeia, as regras não são uniformes. E dá como exemplo, o facto de em Espanha os autocarros poderem circular com a lotação completa e em Portugal, apenas com dois terços. “Para um grupo da América Latina ou da Ásia, que vem à Europa fazer uma peregrinação, não funciona. Há que esperar por outro autocarro e separar o grupo. É completamente ineficiente e absurdo, um caos”, diz o hoteleiro.
Defende, por isso, a harmonização de regras, com transparência e que sejam passadas de forma clara. Marto Pereira reconhece que a Presidência Portuguesa está a fazer todos os esforços para o conseguir, “até porque o turismo é uma prioridade para o governo e para país”.
No entanto, avisa que é preciso atuar rapidamente para ter os fluxos europeus”. Já quanto à operação com países terceiros, uma das que mais interessa a Fátima, Marto Pereira dá-a como “perdida” em 2021.
“Só quando as regras estiverem muito claras é que os produtos podem ser construídos e comercializados. E não é tudo imediato. A maioria das pessoas não está com as malas à porta para sair. Estas viagens têm que ser muito planeadas”.
Esse é um dos motivos pelos quais Alexandre Marto Pereira só espera por uma certa normalização dos fluxos de peregrinos e turistas da América Latina (especialmente do Brasil), Estados Unidos, Canadá, Índia, Filipinas ou Coreia do Sul para daqui a um ano.
De preferência, já para as celebrações de maio de 2022. São mercados emissores com um peso económico muito forte. Antes da pandemia, o da Coreia do Sul foi um dos que mais cresceu e já significava 100 mil dormidas anuais, o segundo atrás de Espanha.
Regras adotadas pelo Santuário podem ter retorno
Alexandre Marto Pereira elogia a metodologia adotada pelo Santuário de Fátima na restrição das entradas dos peregrinos, sobretudo nas datas aniversárias das aparições de Nossa Senhora. E a atitude da Igreja no combate à pandemia. “Tem sido exemplar, a saúde das pessoas é essencial e prioritária”.
E acrescenta que na qualidade de hoteleiro, contacta com operadores de todo o mundo que lhe dão conta da forma como os católicos que agora acompanham as celebrações virtualmente, olham para Fátima e compreendem o que está a ser feito. “Compreendem, valorizam e acredito que a médio e longo prazo, vai beneficiar Fátima e o país”.
Um primeiro teste é o Workshop Internacional de Turismo Religioso que, este ano, vai decorrer nos dias 24 e 25 deste mês, mas de forma virtual. Face à impossibilidade de viajar, a ACISO – Associação Empresarial de Ourém-Fátima – montou uma “máquina” para que as centenas de hosted buyers que costumavam vir a Portugal possam reunir-se on-line. Marto Pereira admite que não vai ter a mesma visibilidade de outros anos, mas poderá ser muito proveitoso.
O destino convidado é o Rio de janeiro, “pela forte religiosidade do povo brasileiro e a grande devoção a Nossa Senhora, o que faz com que Fátima conste no roteiro de quase todos os brasileiros que vêm à Europa”, refere o comunicado da ACISO. Em 2019, garantiram 60 mil dormidas nas unidades hoteleiras da região, posicionando o Brasil como terceiro mercado emissor.
Câmara de Ourém incentiva portugueses a irem até Fátima
Fátima é o centro económico do município de Ourém. Da cidade do Santuário depende boa parte da economia e do emprego da região. Por isso, agora, a autarquia está a “devolver” a ajuda com incentivos à pernoita dos portugueses. Com o programa “10001 noites”, lançado em abril, a autarquia oferece uma segunda noite a quem reservar a primeira num hotel da cidade, a que acrescenta um voucher para usar na restauração. Mais de um quarto das noites já estão reservadas e Marto Pereira prevê que “lá para julho as 10001 noites já estejam esgotadas”. Diz também esperar que a Câmara possa acrescentar mais alguma coisa ao investimento inicial de 750 mil euros.
E não hesita em classificar este programa como “muito mais eficaz e amigo da economia local” do que o novo IVAucher lançado pelo governo. “É um modelo que poderia ser replicado noutros municípios e até a nível nacional”, diz à Renascença.
As ruas de Fátima já se veem mais movimentadas, em especial ao fim de semana. Ou como aconteceu por altura do 13 maio, em que houve peregrinos que nem conseguiram entrar na Praça, para assistir às celebrações.
Por isso o hoteleiro aconselha a que, sempre que possível, as pessoas venham em alturas de menor concentração, por exemplo, durante a semana: “o Santuário está mais vazio, a espiritualidade vive-se de forma diferente, mais pessoal. E acho que isso, de certa forma, está a acontecer. Pelo menos este ano, façam mais um sacrifício e visitem Fátima de outra forma. Por todos”, apela.
Empresas precisam de apoio imediato e pessoal qualificado
Alexandre Marto Pereira, que também é vice-presidente da AHP – Associação da Hotelaria de Portugal vê o Plano “Reativar o Turismo; Construir o Futuro” como positivo, embora ainda não se conheça em detalhe.
A intenção é ajudar as empresas com os problemas de tesouraria, mas “espero que a forma de aceder a esses fluxos financeiros, o custo do financiamento, os prazos em que a liquidez vai ser transmitida, a taxa de juro implícita, sejam controlados e possam ser suportados pelas empresas para atravessarem uma ponte que ainda existe, estamos a meio da ponte”.
Outra fragilidade sentida pelo setor é a falta de trabalhadores, especialmente, qualificados. “O choque da pandemia obrigou as empresas a deixar sair as pessoas, que – naturalmente – agarraram outras oportunidades em setores que floresceram durante nesse período, como a saúde, imobiliário ou na área digital”.
Para Marto Pereira, o problema é “voltar a trazer essas pessoas, que já tinham formação específica, quando os hotéis ainda estão muito debilitados economicamente”. Para retomar a atividade precisam das pessoas, mas ainda não têm “músculo” para pagar acima do mercado, diz o hoteleiro de Fátima.