As medidas na área laboral aprovadas em Conselho de Ministros não são um "ponto de chegada" e há margem para negociar na Assembleia da República, afirma a ministro do Trabalho e da Segurança Social, Ana Mendes Godinho, em entrevista à Renascença.
O Governo procura o "o maior consenso alargado" no Parlamento em torno da Agenda do Trabalho Digno, uma arma "forte de combate à precariedade", defende Ana Mendes Godinho.
Questionado sobre a posição do Bloco de Esquerda, que considera que as suas medidas para a área laboral não foram tidas em conta, a ministra remete agora para a negociação que vai decorrer no Parlamento, numa matéria que pode ser determinante para viabilizar a proposta de Orçamento do Estado para 2022 e evitar uma crise política em Portugal.
O que foi aprovado em Conselho de Ministros na área laboral significa esgotamento das soluções ou o Governo foi até onde podia ir?
Ontem o que foi aprovado no Conselho de Ministros foi uma proposta de lei, que incorpora todas as medidas da Agenda do Trabalho Digno, que consideramos uma agenda muito forte no sentido do combate à precariedade, em procurámos incorporar e fazer a maior aproximação possível para conseguirmos o maior consenso parlamentar possível, para que seja aprovada. Esta é uma agenda que o país e os jovens precisam.
Por isso é que, ontem, em Conselho de Ministros houve a preocupação de evoluirmos em algumas matérias, como o aumento do valor das indemnizações para os contratos a termo, a reposição do trabalho suplementar acima de 120 horas, o alargamento das matérias incluídas no princípio do tratamento mais favorável ou o reforço dos mecanismos para resolver impasses na contratação coletiva e evitar situações de vazio na contratação coletiva.
Na caducidade da contratação coletiva, o Bloco de Esquerda quer o fim e não a suspensão por mais um ano. É possível acabar com esta medida?
Esta é a proposta aprovada pelo Governo. O que aprovámos ontem foi o alargamento do período da suspensão da caducidade e, por outro lado, mecanismos para evitar o vazio na contratação coletiva. Esta é uma proposta de lei que seguirá agora para a Assembleia da República e é nessa sede que as negociações vão decorrer.
O que nós estamos a procurar é o maior consenso alargado porque acreditamos que esta agenda forte de combate à precariedade, de valorização dos jovens no mercado de trabalho, é uma agenda que o país precisa. Temos 60% dos jovens com contratos não permanentes, como sociedade não podemos aceitar isto. Este é um momento e uma agenda que o país não pode perder e, convictos disso, estamos sempre prontos para conseguir chegar a bom porto.
Outra medida aprovada foi o aumento da compensação por despedimento de 12 para 24 dias por ano. O BE propõe a reposição de 30 dias por ano de trabalho. Por que não é possível chegar a este ponto?
O que nós fizemos em relação às compensações por despedimento foi repor o valor das indemnizações relativamente à cessação dos contratos a termo, como estava previsto antes de 2012, passando de 12 para 24 dias. Esta é uma medida com uma forte intenção de ser dissuasora da precariedade e aos falsos contratos a termos ou os contratos a termos usados massivamente, nomeadamente nos jovens.
Mas também tivemos a preocupação de garantir que as medidas aprovadas não geram uma distorção completa de Portugal nos rankings internacionais do mercado laboral. Essa é uma matéria crítica que tem sido muito importante na afirmação e na evolução da economia e na capacidade de recuperação do emprego.
É possível repor 25 dias úteis de férias?
A proposta irá para a Assembleia da República e procuramos encontrar aqui as melhores soluções, com espírito de diálogo para encontrar as melhoras condições que sirvam as pessoas. Este é o nosso compromisso permanente e estamos sempre a trabalhar para que isso aconteça.
A discussão pode prosseguir no Parlamento?
É uma proposta de lei que é apresentada em várias matérias e a decisão final é da Assembleia da República. Nós estamos completamente comprometidos para encontrar o maior consenso alargado a nível parlamentar para garantir que a aprovação desta Agenda [do Trabalho Digno] se faz, porque acreditamos que ela é mesmo importante.
Mas é um ponto de partida ou de chegada?
Este processo começou em julho de 2020, tem sido muito discutido, muito participado e é um processo que está em curso. Nunca poderia dizer que é um ponto de chegada porque vai para a Assembleia e é nessa sede que se vai discutir, nem um ponto de partida porque começou em julho de 2020. É mesmo um processo de construção, de diálogo em que procurámos incorporar aquilo que considerarmos crítico para garantir que respondemos ao combate à precariedade, à valorização dos jovens no mercado de trabalho, à conciliação da vida pessoal e familiar, os cuidadores informais e procurando também que o Estado, enquanto contraente, impõe o combate à precariedade.
Como responde à CIP que fala em inconstitucionalidade nas propostas do Governo, sobretudo em relação ao prolongamento da caducidade dos contratos coletivos?
Apresentámos estas normas acreditando e confiando que cumprem todos os princípios internacionais e da Constituição, porque o que estamos a fazer é reforçar o mecanismo que já existe da arbitragem necessária, permitindo que ele possa ser ativado antes de operar a caducidade de uma convenção, no fundo, para que não haja vazios e desproteção dos trabalhadores por ocorrência da caducidade sem que as partes tenham hipótese de intervir. O que nós fizemos aqui no reforço da arbitragem necessária, para dar o poder a qualquer das partes, sejam empregadores ou trabalhadores, de ativar este mecanismo da arbitragem necessária.