Depois de anos de seca, chuva no inverno impede falta de água no verão
21-03-2023 - 18:03
 • Renascença

Chuvas das últimas semanas fizeram com que albufeiras recuperassem para níveis regulares. Depois de vários de anos de seca, Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos antecipa um verão sem problemas de água. Mas sul do país ainda preocupa.

A falta de água tem sido uma preocupação nos últimos anos, mas as albufeiras recuperaram os níveis da água e 2023 pode vir a ter alguma tranquilidade nas perspetivas de reservas de água para o verão. Ainda assim, o sul do país continua a preocupar.

“Houve uma recuperação bastante significativa dos níveis das albufeiras e, portanto, atualmente a situação, na generalidade do país, é regular. Tirando a zona sul, no barlavento algarvio, onde ainda há uma ou outra albufeira com os níveis abaixo do que será ideal", afirma em declarações à Renascença Carlos Coelho, presidente da Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos (APRH), que está a promover o 16º Congresso da Água, de 21 a 24 de março, com o tema “Viver com a água”.

O especialista em recursos hídricos não consegue garantir que não se sintam constrangimentos, até porque muito depende dos níveis de precipitação dos próximos meses, mas afirma que “não se perspetiva que haja grandes problemas", após as chuvas das últimas semanas.

“A situação que vivemos no verão passado, retratava já um acumular de vários anos secos consecutivos, e este ano tivemos um inverno, que felizmente, teve a ocorrência de precipitação elevada e, portanto, as coisas estão mais equilibradas e, assim não estamos com o mesmo problema", diz, descartando uma repetição do cenário de seca do último ano


De acordo com um estudo da Fundação Calouste Gulbenkian, a agricultura é responsável por 75% do consumo de água em Portugal, um valor acima da média da EU (24%) e do mundo (69%), devido à persistência da cultura de regadio. Neste setor “há vários pontos que têm sido salvaguardados ao longo destes tempos, tem sido um trabalho em várias vertentes, no sentido de tentar melhorar a eficiência hídrica”, refere o presidente da APRH.

“A questão das perdas de água nos serviços de abastecimento, seja para a povoação, seja para o regadio, é uma das vertentes que tem sido trabalhada. A monitorização, a digitalização, tentar pôr novas tecnologias ao serviço dos recursos hídricos, tudo isso são abordagens que têm sido seguidas e que têm preparado Portugal para as situações de seca, ou por vezes também, de precipitação mais intensa em períodos curtos. Tem havido um esforço de preparar o país para a adequação ao futuro", refere.

No entanto, Carlos Coelho aponta que a questão que se coloca não é a falta de água, mas sim a sua gestão. "Às vezes pensamos que cada vez há menos água disponível, mas não. Há é cada vez mais uso, ou seja, a quantidade de água que usamos é maior e a que está disponível é mais ou menos a mesma. É essa gestão que temos de otimizar, de forma a precaver o futuro", explica.

No mesmo estudo da Gulbenkian, uma projeção do World Resources Institute aponta para a cada vez maior pressão hídrica sobre alguns países, incluindo Portugal, mas o líder da associação de recursos hídricos considera que todas as medidas para mitigar esse cenário estão já identificadas, como "redução dos consumos”, "reuso da água”, “redução de perdas”, "monitorização para se saber onde é que a água está a ser gasta e onde é que está ser perdida” e a “utilização da eletrónica para gerir melhor a água”. Os últimos anos de seca vieram, na sua perspetiva, “acelerar o processo de tratar destes assuntos de precaver e planear para o futuro”.

O professor aponta assim que o principal desafio na gestão da água passa por "manter um equilíbrio entre disponibilidade hídrica e consumos".

Carlos Coelho alerta também para a necessidade de uma maior articulação entre políticas públicas, apontando que “tem de ser conjugada a eficiência hídrica à eficiência energética” e que a pouca precipitação pode não ser o único motivo para a falta de água.