Se, como se espera, o Conselho Europeu aprovar uma proposta de diretiva da Comissão, a partir de 1 de janeiro de 2022 as autoridades fiscais dos 27 países da UE vão contar com uma nova base jurídica harmonizada para realizar auditorias conjuntas a empresas ou contribuintes singulares que sejam de “interesse comum ou complementar” para dois ou mais países membros. Esta informação chegou-me pelo “Público”, num texto de Pedro Crisóstomo.
Assim, o fisco português já poderá pedir ao fisco de outro Estado-membro que faça um controlo tributário a um determinado contribuinte, poderá enviar inspetores a outro país, poderá obter informações fiscais se as pedir, etc.
Uma vez aprovada esta diretiva, passará a haver regras comuns para cooperar. É um passo na crescente luta europeia contra a corrupção em geral e a fuga aos impostos em particular.
Em Portugal, fala-se muito contra a corrupção, mas as autoridades governamentais não parecem empenhadas num combate sério a essa ferida da nossa sociedade. Um caso típico é a criminalização do enriquecimento ilícito. Se uma pessoa ostenta uma vida de luxo, tendo embora rendimentos legais incompatíveis, por serem baixos, com os gastos de uma vida desse tipo, há motivos para desconfiar.
Simplesmente, não é juridicamente aceitável a chamada inversão do ónus da prova, que seria forçar a pessoa em causa a provar que não cometeu qualquer crime. Provar que não se infringiu a lei é “diabólico”, diziam os romanos.
Há décadas que entre nós se discute como superar este problema, mas os governantes, com destaque para o PS, nunca quiseram avançar com medidas concretas nesta matéria. Basta lembrar como foram metidas na gaveta algumas medidas propostas por João Cravinho (pai).
O atual Governo apresentou recentemente uma estratégia de combate à corrupção. Mas, como denuncia o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, dessa estratégia não faz parte colocar na lei penal o enriquecimento ilícito. O sindicato até avança com uma sugestão para os titulares de cargos públicos: passarem a ter que declarar a aquisição de património durante o exercício do cargo, e não apenas no início do mandato, criminalizando a falta dessa declaração – “não por se presumir ter enriquecido ilicitamente, mas por ter enriquecido sem o declarar e justificar”.
Por outro lado, a associação dos juízes considera incompreensível que a proposta estratégia de combate à corrupção não tenha uma palavra para o financiamento dos partidos. Daí o lamento dos juízes de que esse combate “foi sempre uma prioridade no discurso, mas nunca foi uma prioridade na ação”.
Interrogada pelos jornalistas sobre aquela omissão, a ministra da Justiça respondeu com displicência que, talvez, o financiamento dos partidos venha a ser incluído na estratégia governamental contra a corrupção. Um assunto secundário, como se vê.