O banco suíço Credit Suisse terá mantido durante anos fortunas de pessoas ligadas à corrupção de todo o mundo, num valor acumulado de cerca de 100 mil milhões de dólares (88 mil milhões de euros).
A revelação foi feita por um consórcio de quase 50 meios de comunicação social, coordenado pela organização sem fins lucrativos "Organized Crime and Corruption Reporting Project" (OCCRP).
O The New York Times, que faz parte do consórcio, teve acesso a dados de cerca de 18.000 contas bancárias suíças divulgadas há um ano ao jornal alemão Süddeutsche Zeitung por uma pessoa não identificada, originando uma investigação denominada "Segredos Suíços".
O informador acusou as leis suíças sobre o sigilo bancário de serem "imorais", numa nota enviada ao consórcio de comunicação social.
Investigação analisou o período entre 1940 e 2010
A fuga de informação, que se segue a outras que deram origem a investigações jornalísticas como os "Panama Papers", revela que o Credit Suisse abriu contas e teve como clientes, entre 1940 e o ano 2010, "não só os ultra ricos, mas também pessoas cujas situações problemáticas teriam sido óbvias" para quem se estivesse interessado em investigar.
O banco, segundo o jornal norte-americano, terá ignorado os alertas dos seus próprios funcionários sobre "atividades suspeitas" nas finanças dos seus clientes, que incluíam acusados de corrupção em escândalos relacionados com a companhia petrolífera estatal da Venezuela; figuras governamentais no Médio Oriente; ou altos funcionários dos serviços secretos em países que colaboram com os Estados Unidos na guerra contra o terrorismo, bem como os seus familiares.
Uma porta-voz do Credit Suisse, Candice Sun, declarou ao New York Times que o banco não só "rejeita" as alegações, como muitas das contas em questão já foram encerradas, sublinhando que a investigação faz parte de uma campanha de difamação "contra o banco e o mercado financeiro suíço, que sofreu grandes mudanças nas últimas décadas".
Em outubro, foi condenado a penalidades na ordem dos 475 milhões de dólares pelas autoridades dos Estados Unidos e do Reino Unido por empréstimos a empresas estatais em Moçambique, envolvidas no escândalo das dívidas ocultas.
Dois portugueses entre os nomes divulgados
Aparecem figuras como um antigo chefe dos serviços secretos egípcios, no regime de Hosni Mubarak, Omar Suleiman, considerado responsável por inúmeras violações de direitos humanos. Também o general argelino Khaled Nezzar, antigo ministro da Defesa, que está a ser julgado por crimes contra a Humanidade e ainda personalidades do regime venezuelano e de uma rede de tráfico de cocaína na Bulgária.
Segundo o Expresso são mais de uma centena os clientes com nacionalidade portuguesa, identificados pela investigação, mas apenas dois a contas com a justiça e nenhum deles condenado.
São eles o luso-angolano Álvaro Sobrinho, antigo presidente do Banco Espírito Santo Angola, e Hélder Bataglia, fundador da Escom, o braço não financeiro do Grupo Espírito Santo também em Angola. Estão ambos a ser investigados por lavagem de dinheiro e apropriação de centenas de milhões de euros.
Horta Osório esteve na presidência mas veio a demitir-se
O então presidente do Credit Suisse, António Horta-Osório, eleito em finais de abril no meio da agitação, lançou uma reorganização das atividades do banco com o objetivo de voltar a colocar a gestão do risco no centro da cultura da instituição.
Mas o banqueiro português, que construiu uma sólida reputação ao salvar o banco britânico Lloyds da ameaça de insolvência, foi ele próprio manchado por revelações da imprensa em dezembro sobre a quebra de regras de prevenção contra a covid-19 e demitiu-se em meados de janeiro, entregando a liderança do banco a Axel Lehmann, um banqueiro suíço conhecido pelas suas competências em gestão de riscos, que tinha entrado para o conselho de administração em outubro.
[notícia atualizada às 7h30 de 21/02/2022]