O PS quis substituir uma lei, a oposição contestou e o presidente da Assembleia da República atirou a polémica para debaixo do tapete. No segundo dia de debate na especialidade do Orçamento do Estado, os socialistas apresentaram uma proposta fora de prazo para alterar o Fundo Social Municipal, que aumenta a margem de endividamento das autarquias, mas os vários partidos consideraram que não está em causa uma proposta de substituição, mas sim um aditamento, o que, referem, viola o prazo limite para a entrega de propostas de alteração ao OE2022.
Um dos mais críticos foi o PSD, que considerou mesmo esta uma “clara violação da Constituição”, como indicou o líder da bancada dos sociais-democratas, Paulo Mota Pinto, pedindo que não fosse aceite o requerimento do PS, indicando que esta foi uma norma que “não foi discutida e que não pôde ser discutida”.
Já PCP e Bloco de Esquerda acusaram o PS de estar a impor o peso da sua maioria absoluta, enquanto o Chega considerou que em causa está um "completo pontapé ao regimento" e mostra a posição de "quero, posso e mando" dos socialistas. Da esquerda à direita, o sentimento foi o mesmo - e até se viu intervenções do BE serem aplaudidas pela Iniciativa Liberal.
No final, Augusto Santos Silva acabou por dar razão aos socialistas e levar o requerimento socialista a votos. PSD, Chega, IL, PCP e BE votaram contra, enquanto Livre e PAN se abstiveram. Com a maioria absoluta do PS, o recurso foi rejeitado e o requerimento seguiu para votação, que contou com os votos favoráveis do PS, abstenção do Livre e contra dos restantes partidos.
E as críticas continuaram, desta vez ao presidente da Assembleia da República. Pedro Filipe Soares, do Bloco de Esquerda, questionou a “independência” da segunda figura do Estado: “A partir do momento em que a Mesa toma parte neste processo de arrogância do Partido Socialista, contra o regimento e contra a lei, a Mesa está a dizer que lhe falta a independência que garantiu no seu discurso de tomada de posse como presidente da Assembleia da República. E se é importante em todos os momentos da democracia, essa independência é ainda mais importante quando estamos perante uma maioria absoluta”,
Em resposta, Santos Silva pediu “menos divergências”: “Apelo a todos os grupos parlamentares, que têm entre si deputados muito experimentados e conhecedores do processo de discussão na especialidade do Orçamento do Estado, que se evite a repetição de divergências processuais, porque essas enfraquecem a capacidade de realizar o nosso trabalho.”
O requerimento votado esta terça-feira em plenário surgiu depois de na véspera a Comissão de Orçamento e Finanças ter decidido não aceitar a proposta de alteração do PS que introduz um artigo novo sobre aumento da margem de endividamento das autarquias.
Em causa está uma proposta do PS que introduz o artigo 95.º-A sobre o Fundo Municipal e aumento da margem de endividamento.
Segundo a iniciativa dos socialistas, "em 2022 o Governo conclui o apuramento dos montantes relativos ao Fundo Social Municipal a transferir para as autarquias que não se encontrem já previstos na presente lei".
"Em 2022 a margem de endividamento prevista na alínea b) do n.º3 do art.º 52.º da Lei 73/2013, de 7 de setembro é aumentada para 40% exclusivamente para assegurar o financiamento nacional de projetos cofinanciados na componente de investimento não elegível", prevê a proposta.
A iniciativa do PS prevê que "excecionalmente e dada a influência da receita dos impostos de 2020 relevantes para o apuramento das transferências para as autarquias locais, é suspensa a aplicação do n.º 2 do art.º 40.º da Lei 73/2013, de 7 de setembro na sua redação atual".