O secretário de Estado das Finanças, João Nuno Mendes, defendeu esta sexta-feira que o Estado não pode ficar refém de posições contrárias ao interesse público, referindo-se aos ex-acionistas privados da TAP, que preferiam um apoio que Governo entendeu insuficiente.
“O Estado português não pode ficar refém de qualquer tipo de posição obstaculizadora àquilo que se entende que é o interesse público”, afirmou o secretário de Estado das Finanças, João Nuno Mendes, na comissão de inquérito à TAP, na qual está a ser ouvido na qualidade de antigo responsável pelo Tesouro.
João Nuno Mendes respondia a questões do deputado do BE Pedro Filipe Soares sobre o impasse com os ex-acionistas privados da companhia aérea, quanto à forma do auxílio a prestar à TAP, quando entrou em dificuldades na sequência da pandemia de covid-19, em 2020.
“Ficou claro que os acionistas não iriam acompanhar nenhum esforço do Estado. Não estamos a falar de ‘nós colocamos 10%, 15%, 20% do esforço do Estado’. Não, nenhum. Não havia perspetivas económicas no setor aéreo”, sublinhou o governante, que na altura coordenava o grupo de trabalho que estudou as hipóteses de apoio à TAP e que propôs ao Governo um auxílio de emergência acompanhado por plano de reestruturação.
João Nuno Mendes admitiu que naquelas negociações havia posições diferentes quanto à forma do apoio, explicando que os acionistas privados preferiam uma alternativa mais transitória, em forma de subsídios ou auxílios covid-19.
“Chegou-se à conclusão que essa modalidade de apoio podia representar um valor substancialmente mais baixo do que seria necessário."
"A elevada alavancagem financeira da empresa era tal que não era compatível com as formas que existiam nesse sentido de apoio transitório, […] era incomparável com o valor que tínhamos em cima da mesa que era necessário para seis meses, na casa dos 1.200 milhões de euros”, adiantou.
João Nuno Mendes afirmou que o grupo de trabalho tinha a convicção de que, com a forma de auxílio de emergência, o plano de reestruturação era inevitável, por causa da escala do auxílio e a escassa base de capital da empresa, que não possibilitariam a devolução do valor no prazo de seis meses.
Segundo as regras europeias, ou o valor é devolvido naquele prazo, ou é necessário executar um plano de reestruturação.
“Essa obstaculização [dos privados] à entrada do auxílio na empresa é um facto, mas o trabalho que nos competia fazer foi absolutamente fundamental”, apontou, referindo-se ao ‘chumbo’ do Conselho de Administração da companhia ao auxílio, 15 dias depois de ter sido aprovado pela Comissão Europeia, em 10 de junho de 2020.
O governante afirmou ter “total confiança” na solução encontrada pelo grupo de trabalho, de que “não havia alternativa ao auxílio de emergência mais plano de reestruturação”, para salvar a empresa.
“Sem plano de reestruturação a Comissão Europeia não tem forma de aprovar uma capitalização da empresa, que salvou a companhia de bandeira, que é a TAP”, sublinhou, acrescentando que “era uma grande aflição” se o Estado não estivesse habilitado a intervir numa empresa que tem 10.000 trabalhadores.
João Nuno Mendes disse ter plena consciência de que o modelo escolhido foi inteiramente adequado às circunstâncias.
“Há determinados momentos em que o Estado não se pode deixar atrasar, envolver em processos que sejam muito complexos, tem de tomar as suas decisões”, defendeu, deixando também uma palavra à equipa da TAP que participou nos trabalhos, que lhe deixaram uma “excelente impressão”, pela capacidade de "dar a volta às circunstâncias muito difíceis”.
Questionado pelo deputado do PCP Bruno Dias se a TAP foi sobrecapitalizada para se tornar mais atrativa numa privatização posterior, ou seja, “como vender um cofre com o dinheiro lá dentro”, João Nuno Mendes defendeu que a capitalização feita foi a necessária para garantir solvabilidade à empresa.
Já quanto aos 55 milhões de euros pagos a David Neeleman para deixar a companhia, o governante disse não ter tido qualquer intervenção no processo, uma vez que nessa altura era já secretário de Estado das Finanças, que não tutela a empresa. "Não o consigo elucidar", afirmou.