O Centro Hospitalar de Gaia serve o concelho mais populoso do Norte, em tempos normais já costuma ter uma lotação na ordem dos 90% e tem limitações de infraestruturas. Foi com este enquadramento que entraram no tempo de pandemia.
“Se pensarmos que no dia em que o primeiro caso de Covid é declarado em Portugal, o nosso hospital nem sequer tinha capacidade para fazer o diagnóstico da doença, eu diria que começámos a corrida muito, muito atrás, para uma corrida muito longa e ainda por cima começámos a corrida para aí 100 quilómetros atrás”, diz Rui Guimarães, presidente do Conselho de Administração.
O que valeu ou o facto de terem diminuído, por exemplo, as vítimas de acidentes de trabalho ou de acidentes de viação. Ainda assim, “houve claramente momentos de grande desespero, de lágrimas, de ansiedade, de pânico, houve momentos muito, muito complicados”, descreve.
Rui Guimarães explica que os receios adensavam-se sobretudo quando percebiam que não tinham “armas para fazer face aquilo que eram as previsões para determinadas alturas, nomeadamente o número de doentes simultâneos que o hospital iria receber”. As piores altura foram vividas em janeiro. No dia 27 atingiam o maior número de doentes internados: 174, dos quais 145 em enfermaria e 29 em cuidados intensivos. Quatro dias, mais tarde já eram 38 nos cuidados intensivos
Se por um lado faltaram armas, por outro, sobressaiu o valor das pessoas.
“Foi um tempo extraordinário, foi um tempo em que houve muitas lideranças informais que emergiram, pessoas que foram capazes de mostrar que, apesar de não terem o cargo ou não terem a função atribuída para fazer isto ou aquilo, foram capazes de ter papéis de absoluta liderança e de conseguir montar respostas, contributos para conseguir fazer face”, diz, orgulhoso, Rui Guimarães.
E foi também em tempo de pandemia que se fez história, a construção da “unidade que é neste momento a maior unidade de cuidados intensivos do país com 28 camas, que está feita para durar as próximas décadas e foi feita em 90 dias”.
Mas nem tudo correu bem e o principal erro foi ter deixado os doentes não Covid para trás, reconhece.
“Pareceu que era desculpável ou pareceu que era tolerável, atendendo à força que a pandemia ia tendo, quer a força real, quer a força mediática, que pudéssemos deixar os outros doentes à espera, com o entendimento da população. ‘Desculpe, tem de entender, mas neste momento o seu caso não é urgente, estamos ocupados a tratar dos doentes Covid’. Isto é claramente algo que fizemos todos mal”, assegura.
Rui Guimarães garante que nunca chegaram à medicina de guerra, quando se escolhe quem vive e quem morre, lembra a solidariedade que surgiu no setor da saúde, com a partilha de doentes e fica-lhe na memória lágrimas de uma colega de Lisboa com que ia “combinando receber dois ou três doentes por dia”, de acordo com a gestão de altas e admissões. Rui recorda o telefonema que recebeu e o pedido da colega: “‘‘Eu sei que só combinámos dois, mas se conseguires receber oito, porque estou naquela iminência de ter escolher entre quem vive e quem morre’ e começa imediatamente a chorar, uma pessoa que ainda hoje não conheço fisicamente e essas coisas de facto marcaram-nos muito”, relata..
Sobre o que gostaria que ficasse desta pandemia, Rui Guimarães pede investimento no Serviço Nacional de Saúde, pede que os serviços de saúde sejam usados com moderação, lembrando que as urgências já voltaram a entupir com casos que não deviam estar ali.
Pede ainda que cada um de nós zele pela nossa saúde - não fumar, comer melhor e dar exemplos saudáveis aos mais novos.
Respostas Sociais à Pandemia é uma rubrica da Renascença com apoio da Câmara Municipal de Gaia que surge no seguimento da Conferência "Pandemia: Respostas à Crise" onde se debateu em maio de 2021 o papel das Instituições Sociais e do Poder Local.