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O Tribunal de Ponta Delgada deferiu um pedido de libertação imediata ("habeas corpus") feito por um queixoso, contra a imposição de quarentena em hotéis por parte do Governo dos Açores.
"A restrição desse ou outros direitos fundamentais é matéria da competência de dois órgãos de soberania, a Assembleia da República ou do Governo da República, e este se autorizado por aquela, quedando assim fora do âmbito de competências dos órgãos próprios das Regiões Autónomas, o que implica inconstitucionalidade orgânica dos normativos que a autorizam”, declara a instância judicial em comunicado.
Em causa está uma iniciativa de um queixoso que foi colocado em quarentena obrigatória numa unidade hoteleira em Ponta Delgada e avançou com um "habeas corpus", que foi entregue à juíza de instrução criminal do Tribunal de Ponta Delgada que, por seu turno, desencadeou os mecanismos legais.
O advogado do promotor do "habeas corpus", Pedro Gomes, declarou, à saída da instância judicial, que, considerando-se que se estava perante uma “detenção ilegal”, a juíza entendeu que "as quarentenas são inconstitucionais por violarem a liberdade individual dos cidadãos”.
Quando alguém interpõe um "habeas corpus" está a pedir para que lhe seja reposta a sua garantia constitucional de liberdade.
O "habeas corpus" está consagrado no Código de Processo Penal Português no artigo 220º, existindo dois tipos: o preventivo e o liberatório.
O primeiro acontece quando alguém que se vê ameaçado de ser privado da sua liberdade e interpõe um "habeas corpus" para que esse direito não lhe seja retirado.
O segundo acontece já depois da detenção e o detido pede que lhe seja restituída a liberdade, uma vez que a situação de detenção ofende o direito que lhe é constitucionalmente garantido.
A juíza de instrução criminal de Ponta Delgada, citada na nota de imprensa, considera que a situação em causa “era de privação da liberdade, entre outras razões, por nela não concorrer o consentimento do visado, decorrer em local confinado e sob vigilância policial”.
Acresce que este ocorre “fora de estado de emergência, não tem título no artigo 27.º/1/3” da Constituição da República, o que “implica inconstitucionalidade material dos normativos que a autorizam”.
Mesmo que não se verificasse uma “inconstitucionalidade orgânica”, a juíza entende que, estando declarada a calamidade pública em todo o território nacional, “qualquer cidadão nacional pode livremente desembarcar” em qualquer aeroporto do continente e da Região Autónoma dos Açores.
De acordo com o advogado, o Tribunal de Ponta Delgada “ordenou, de imediato, a libertação imediata” do autor do "habeas corpus", sendo que esta decisão “só tem efeito neste caso concreto”.
O cliente do advogado Pedro Gomes chegou a Ponta Delgada, oriundo de Lisboa, em voo TAP, tendo sido colocado em quarentena, o que constitui uma “privação ilegal de liberdade”, tendo o teste que realizou dado negativo para covid-19.
O advogado considerou que a decisão judicial “é passível de recurso pelo Ministério Público, e obrigatória para o Tribunal Constitucional, porque o juiz de instrução do Tribunal de Ponta Delgada declarou a quarentena inconstitucional”.
O advogado Pedro Gomes formalizou, entretanto, uma queixa à Provedora de Justiça por considerar inconstitucional a resolução do Conselho do Governo dos Açores sobre as quarentenas, numa fase em que Portugal já não se encontra em estado de emergência.
Desde o dia 26 de março que todos os passageiros que chegam aos Açores são obrigados a ficar 14 dias em confinamento numa unidade hoteleira indicada pelo executivo açoriano, como medida restritiva para travar a evolução da pandemia da covid-19, tendo as despesas com o alojamento passado a ser pagas pelos passageiros não residentes no arquipélago desde 08 de maio.
A Ryanair e a SATA não estão a operar entre o continente e a região, mas a TAP continua a ter ligações, embora em menor quantidade que o habitual, entre Lisboa e Ponta Delgada e Lisboa e Angra do Heroísmo.
Portugal regista este sábado 1.203 mortes relacionadas com a covid-19, mais 13 do que na sexta-feira, e 28.810 infetados, mais 227, segundo o boletim epidemiológico divulgado hoje pela Direção Geral da Saúde.
Nos Açores, verificaram-se 15 mortes.
Portugal entrou no dia 3 de maio em situação de calamidade devido à pandemia, depois de três períodos consecutivos em estado de emergência desde 19 de março.
Esta nova fase de combate à covid-19 prevê o confinamento obrigatório para pessoas doentes e em vigilância ativa, o dever geral de recolhimento domiciliário e o uso obrigatório de máscaras ou viseiras em transportes públicos, serviços de atendimento ao público, escolas e estabelecimentos comerciais.
O Governo aprovou na sexta-feira novas medidas que entram em vigor na segunda-feira, entre as quais a retoma das visitas aos utentes dos lares de idosos, a reabertura das creches, aulas presenciais para os 11.º e 12.º anos e a reabertura de algumas lojas de rua, cafés, restaurantes, museus, monumentos e palácios. O regresso das cerimónias religiosas comunitárias está previsto para 30 de maio e a abertura das praias para 6 de junho.