A surpreendente vitória dos talibãs no Afeganistão e a trágica situação junto ao aeroporto de Cabul levantaram um receio na Europa: o receio de que se repetisse uma grande invasão de refugiados, como aconteceu em 2015 com a crise na Síria.
Há seis anos A. Merkel começou por defender uma política de portas abertas aos refugiados, sendo depois obrigada a moderar essa abertura. Agora, Macron manifestou preocupação quanto a uma possível vaga de deslocados do Afeganistão.
A concretizar-se, uma tal vaga iria expor mais uma vez o falhanço da UE em matéria de asilo. Vários países comunitários, como a Hungria, reusam receber imigrantes. E os países membros da UE mais atingidos pela entrada de refugiados, que arriscam a vida no Mediterrâneo, não têm a solidariedade dos outros Estados no acolhimento a esses refugiados.
É o caso, nomeadamente, da Grécia, onde se situa o maior campo de refugiados do mundo. O resultado está em que os imigrantes mal sobrevivem aí, dadas as condições desumanas em que se encontra aquele mais do que sobrelotado campo.
Macron e outros políticos europeus receiam, também, o efeito de uma nova vaga de refugiados por causa do previsível impulso que ela daria aos partidos xenófobos, como o de Marine Le Pen. Esses partidos farão campanha agitando o fantasma dos refugiados como uma ameaça.
Não parece provável que a tal grande vaga se concretize, até porque os talibãs não deverão facilitá-la. Um outro problema de ordem humanitária se levanta no Afeganistão.
António Vitorino, diretor-geral da Organização Internacional das Migrações (entidade integrada na ONU) disse em entrevista à SIC Notícias que antes da saída dos militares americanos se registava no Afeganistão uma intensa migração interna e alguma saída para o estrangeiro. No Paquistão já se encontram cerca de um milhão e 400 mil afegãos e no Irão 780 mil. Daí que Merkel tenha alertado para a necessidade de apoio europeu aos países vizinhos do Afeganistão.
O problema é que, segundo referiu A. Vitorino, cerca de dez milhões de afegãos, um terço da população, vivem à beira da fome, não sabendo se amanhã terão comida. Este desastre humanitário já existia antes da saída das tropas da NATO, mas certamente que essa saída agrava o problema.
Em 2015 os países ocidentais suspenderam o auxílio humanitário aos sírios. Ora o mesmo não pode agora acontecer com os afegãos, por muito que sejam detestáveis as atitudes dos talibãs, os quais poderão impedir ou dificultar a atividade no país dos elementos das organizações internacionais. E não haverá muito tempo para socorrer os afegãos – no inverno o país ficará intransitável.