A primeira sessão solene do 25 de novembro assinalada na Assembleia da República colocou a nu as divisões que existem entre a direita e a esquerda em Portugal em relação à data. Durante duas horas, os partidos deram as suas visões (muitas vezes contraditórias entre si) sobre o que se passou nesse dia de 1975. O que disseram as várias forças políticas?
PSD: novembro concretizou verdadeira promessa de abril
O deputado do PSD, Miguel Guimarães, assinala que esta cerimónia "não serve para diminuir o 25 de abril" e acredita que o 25 de novembro "concretizou a grande promessa de abril: a liberdade".
O antigo bastonário da Ordem dos Médicos lamenta a ausência do PCP na cerimónia: "Nem todos os representantes dos portugueses estão aqui presentes, fazem mal", resume.
O social-democrata afirma que "sem o 25 de novembro não haveria diversidade política em Portugal, nem direito à propriedade privada".
Miguel Guimarães recordou o "cerco que a extrema-esquerda fez ao Congresso do CDS no Porto" e o cerco à assembleia constituinte a 12 de novembro de 1975 para assinalar que o 25 de novembro desse ano permitiu ao regime democrático "viver sem medo".
PS: equiparar ao 25 de abril é reabrir "feridas saradas"
Pedro Delgado Alves, do PS, assinalou que o 25 de novembro "não foi uma vitória da direita sobre a esquerda", argumentando que foi uma "vitória da esquerda democrática" contra uma "deriva sectária e radical".
O socialista considera que a melhor forma de homenagear o 25 de novembro é "não reabrir as fraturas que sabiamente estas gerações fundadoras do regime democrático souberam superar, recusando revisionismos, vontades revanchistas ou provocações”.
Vincando o papel essencial de Mário Soares na data, Pedro Delgado Alves fez a distinção entre abril e novembro.
"O PS tem a legitimidade e autoridade histórica para recordar que, precisamente por não rejeitar por um instante o seu papel e a sua responsabilidade direta no sucesso do 25 de Novembro, a sua equiparação simbólica e cénica à comemoração da data fundadora do regime democrático é um caminho de reabertura de feridas há muito, e bem, saradas", sublinhou o deputado do PS.
Chega: 25 de novembro é "verdadeiro dia da liberdade"
André Ventura, deputado e líder do Chega começou por citar Ramalho Eanes ao dizer que "abril esqueceu-se de criar cidadãos" e lembrou as expropriações na altura do PREC.
"Criaram um país sem rei nem roque, um país que caminhava para um país soviético", assinalou André Ventura.
O líder do Chega não hesitou e afirmou: "Sem esquecermos o 25 de abril, este [25 novembro] é o verdadeiro dia da liberdade em Portugal”.
O discurso de André Ventura levou vários deputados do PS a abandonar o plenário. O deputado voltou a dizer que quer uma "nova democracia" e identificou a imigração e a corrupção como os maiores problemas da política atual em Portugal. Ventura chegou a relacionar a imigração com as violações de mulheres.
IL: data não precisa de consenso para ser assinalada
Do lado da Iniciativa Liberal, Rui Rocha, deputado e líder dos liberais, assinalou que mesmo sem consenso em torno do 25 de novembro, a data deve ser assinalada.
"Ramalho Eanes e Mário Soares não procuraram consensos com aqueles que não amavam a liberdade. Procuraram afirmar a visão do país da democracia e da liberdade e é isso que hoje aqui celebramos", afirmou.
Rui Rocha fala numa nova derrota dos "derrotados do 25 de novembro" e pede o combate feroz aos "radicalismos em nome da liberdade".
Livre: "História adulterada não pode ser arma"
A deputada Filipa Pinto, do Livre, subiu ao palanque com um cravo vermelho na mão, numa alusão ao 25 de abril.
A deputada acredita que "a história adulterada não pode ser uma arma de arremesso político. Há 49 anos evitou-se uma guerra civil. Não pela mão dos herdeiros do fascismo, mas sim pela mão de quem nos trouxe a liberdade”.
Filipa Pinto destaca que os direitos das mulheres ou a constituição de 1976 são mais importantes para assinalar do que o 25 de novembro de 1975.
Mortágua: momento "folclórico" de uma "era bizarra"
A deputada Joana Mortágua - a única bloquista presente na sessão solene - aproveitou o momento para desvalorizar o 25 de novembro e assinalar o 25 de abril.
"Quem hoje diz que o 25 de abril não deu as liberdades às pessoas, pode dizer-se um defensor de novembro, mas é um derrotado da ditadura”, atirou Joana Mortágua.
O Bloco de Esquerda diz que "o 25 de novembro foi o que foi" e critica o PSD por ter aceitado celebrar a data desta forma: "Um disparate que revela a tremenda facilidade do PSD para fazer cedências à extrema-direita”, resume.
Joana Mortágua vinca que o “25 de abril e a revolução são as fontes indiscutíveis da democracia em Portugal” e referiu-se a esta cerimónia como um " momento folclórico".
"Um disparate que revela a tremenda facilidade do PSD para fazer cedências à extrema-direita”, atirou Joana Mortágua, que terminou o discurso com: "25 de abril sempre, fascismo nunca mais".
PAN: 25 novembro para fazer contas com abril
Inês Sousa Real, porta-voz do PAN foi a primeira deputada a discursar e arrancou logo a lembrar Celeste Caeiro, a mulher que celebrizou os cravos no 25 de abril e que morreu este mês. A deputada única assinalou que o partido é o 25 de abril que deve ser assinalado
"Trincheiras entre aqueles que dizem que não têm abril e aqueles que usam o 25 de novembro para fazer contas com abril", atirou Inês Sousa Real, que partiu depois para o ataque ao Chega e aos partidos que usam discursos semelhantes aos do partido de André Ventura.
A deputada única acredita que o que era razoável no Parlamento deixou de o ser, e acusa alguns partidos de tentarem corroer as instituições.
CDS: 25 de novembro evitou que liberdade fosse perdida
"Com o 25 de abril ganhámos a liberdade, com o 25 de novembro evitámos que a liberdade fosse perdida", começou por dizer Paulo Núncio, deputado e líder parlamentar do CDS.
O centrista acredita que o "25 de abril abriu um caminho e o 25 de novembro impediu que esse caminho se fechasse" e acredita que esta segunda-feira foi celebrada a "coerência do 25 de abril".
"O que celebramos hoje é o direito de todas as forças políticas estarem aqui, mesmo aquelas que decidiram não estar aqui", assinalou Paulo Núncio, atirando ao PCP, que não está presente na cerimónia e ao Bloco de Esquerda, que só conta com Joana Mortágua na sala das sessões do Parlamento.
Paulo Núncio aproveitou para dirigir uma palavra especial para o General Ramalho Eanes, momento que mereceu um aplauso de pé de praticamente todos os partidos na Assembleia da República.
[em atualização]