“Uma medida injusta e discriminatória para as famílias com menos rendimentos. Com a inflação, é impossível comprar um carro mais recente”. As palavras são de Susana Jesus, uma das duas mil pessoas que marcaram presença no desfile de motas contra o aumento do Imposto Único de Circulação (IUC), que decorreu ao final desta manhã, entre a 2.ª Circular e o Palácio de Belém, em Lisboa.
Susana anda todos os dias de mota na capital e, pela primeira vez, vai ter de pagar imposto. “É um esforço gigante, a juntar ao aumento das despesas familiares nos últimos anos”, explica à Renascença, enquanto cola na parte da frente da viatura um cartaz onde se pode ler “IUC a aumentar e o povo a pagar”.
A alguns metros de distância está Fausto Rebelo. É de Lisboa e apaixonado por motas desde sempre, principalmente porque “facilitam e muito a mobilidade na cidade”. Diz não compreender as razões do governo para aumentar o imposto – e garante que a subida é mais prejudicial para si do que para quem conduz carros.
“Nós temos duas rodas e pesamos 200 quilos. Os carros têm quatro rodas e pesam duas toneladas. Nós desgastamos menos a via, provocamos menos engarrafamentos e poluímos muito menos - e até comparando com alguns veículos de transporte público. No entanto, estamos a pagar muito mais proporcionalmente”, critica.
Fausto garante ainda que quem faz coleção de motas e carros antigos vai ficar “muito prejudicado” com a nova medida do governo, uma vez que é “provável” que o montante do imposto seja superior ao valor do carro. E dá-nos o seu caso como exemplo.
“Eu tenho uma mota que guardei por estimação e o valor do IUC vai subir 50 por cento. Isto afasta qualquer vontade de preservar e cuidar dos veículos mais antigos. No final do dia, é um acumular de despesas enorme”, afirma, já sentado em cima da mota e pronto a arrancar para o desfile.
Ali bem perto, António Manuel Francisco pendura bandeiras portuguesas nas motas que vão a abrir o desfile até ao Palácio de Belém. É o porta-voz do Grupo Ação Motociclista (GAM), responsável pelo protesto, e garante que “não vai desistir até o Presidente da República levar a questão ao Tribunal Constitucional”.
Olha para a medida como “um castigo para os mais pobres”, principalmente num momento em que “ainda não se sabe muito quais os apoios às rendas para o próximo ano”.
No seu caso, o IUC vai aumentar quase trezentos euros, juntando a mota ao do carro. Um peso no orçamento que preocupa António, principalmente porque o teto de 25 euros ao ano é uma “farsa”. “O valor total do imposto rapidamente sobe e os nossos salários não. Estou preocupado com a minha vida”, remata.
“Esta carga fiscal é para ricos, não é para a classe média”
Tiago Leal não anda de mota, mas é apaixonado por carros antigos. Tem 25 anos, a mesma idade do carro que conduz no buzinão desta tarde, na Praça do Marquês de Pombal, em Lisboa. No último ano, o maior aumento nas despesas foi na alimentação e nos combustíveis. A estas duas, junta-se agora uma terceira: o aumento do IUC. A consequência? Adiar os planos para começar uma vida a dois.
“Saio prejudicado só porque gosto de carros antigos. Atualmente pago 46 euros, mas com os aumentos de 25 euros todos os anos rapidamente vou ficar a pagar perto de 200. Isto é especialmente injusto nesta fase da minha vida. Estou a lutar para ter uma casa e me juntar com a minha companheira. Não consigo e agora ainda tenho de pagar este aumento de selo”, lamenta, durante um dos poucos momentos em que não está a buzinar.
Já Bruno Costa classifica a subida no IUC como “exorbitante”, principalmente quando a “as despesas com carros a combustão são cada vez mais, nomeadamente com a taxa de carbono”. Mas Bruno deixa um aviso – este protesto não é contra os veículos elétricos.
“Se eu tivesse dinheiro, já tinha comprado um elétrico. Não só porque não pagava imposto, mas porque gosto de carros elétricos. Essas viaturas são muito mais disponíveis e permitem mais velocidade. Mas não tenho dineheiro para isso. Esta carga fiscal é para ricos, não é para a classe média”.
Diogo Rosa partilha da mesma opinião. Olha para a decisão do governo como “absurda” e critica o teto anunciado pelo governo: “Até podem ser 25 euros ao ano, mas não preciso de ser vidente para perceber de que daqui a três anos não vou estar rico para pagar 300 euros de IUC”.
Diogo lamenta que não se perceba que ter um carro “implica muito mais” do que pagar um imposto e combustível. “Há manutenção e prestações incontornáveis”, enumera. E quando a pergunta é sobre o que espera do governo, a resposta é rápida: “Estamos a buzinar, mas o que queremos mesmo é um travão neste imposto”.