Um dia depois de a subida das águas ter deixado um cenário devastador em Espanha, as buscas de salvamento continuam: o número certo de desaparecidos não é conhecido e o das vítimas mortais continua a aumentar. Mas a ajuda não está a chegar a todos os lugares. Em Alfafar, município de Valência, o autarca lançou um grito desesperado de ajuda: "Há pessoas a viver com cadáveres."
No mais recente balanço, os números oficiais apontam para 158 mortes, a maioria na região de Valência, embora também haja vítimas mortais em Castela - Mancha.
No entanto, a cada nova contagem, as vítimas aumentam.
Quanto aos danos materiais, e numa altura em que não há sequer estimativas, as imagens mostram que há milhares de carros destruídos — muitos deles foram arrastados vários quilómetros pela força das águas — e estradas cortadas em vários pontos de Valência. Além disso, a lama tomou conta das ruas e os deslizamentos de terra deixaram muitos edifícios danificados.
A falta de água potável e de eletricidade é outros dos problemas: serão mais de 75 mil as pessoas afetadas pela falta de energia, segundo o El Mundo.
No terreno, estão várias forças conjuntas: cerca de 1.200 militares (destacados pelo Ministério da Defesa para ajudar nos trabalhos) juntaram-se às equipas de Proteção Civil, bombeiros e forças policiais.
Em Alfafar, os vizinhos ajudam-se uns aos outros
Juan Ramón Adsuara, o autarca de Alfafar, garante que a comunidade local está organizada, muito embora isso não chegue. Bombeiros e equipas de emergência ainda não apareceram, há falta de eletricidade e os saques já começaram, contou ao El Mundo.
Alfafar, que tem cerca de 21 mil habitantes nos seus dez quilómetros quadrados, foi engolida pela lama.
“Estamos a organizar-nos da melhor forma que podemos e com os meios que temos, porque aqui não recebemos viaturas de emergência de nenhuma instituição ou de forças e órgãos de segurança do Estado. Só temos a polícia local e uma patrulha policial regional. Estamos numa situação extrema”, sublinha.
Além disso, Adsuara conta que foi necessário recorrer aos produtos armazenados num supermercado para ajudar a população. “Tivemos de esvaziar um supermercado e distribuí-lo entre a população e, com máquinas e tratores dos populares, tentar chegar a um bairro que fica em Paiporta, Orba, onde ninguém conseguiu entrar.”
Oito pessoas encontradas mortas numa garagem
Durante a manhã desta quinta-feira, num dos primeiros balanços do dia, a imprensa espanhola dava conta de terem sido encontradas nove pessoas mortas na cidade de Valência.
Oito destas vítimas foram encontradas numa garagem (e entre elas estava um agente da polícia), enquanto que a oitava vítima, uma mulher, foi encontrada em casa, segundo informou a presidente da câmara María José Catalá, citada pela agência espanhola Europa Press.
Quando o nível da água começou a subir, aquelas pessoas, vizinhos, correram para a garagem para tentar salvar os carros. Mas a rapidez com que a água subiu foi fatal, relata a imprensa espanhola.
“A água passava pela rua com muita força e o nível subia muito rapidamente. De repente, o portão da garagem cedeu e entrou nas duas caves, impossibilitando a saída", conta o pai de uma das vítimas mortais.
"Absolutamente intolerável": MP pede prisão preventiva após pilhagens
Durante a noite de quarta-feira, foram detidas 39 pessoas por pilhagem, entre elas vários menores, segundo anunciou a Polícia Nacional. Quatro delas já ficaram em prisão preventiva — algo que a Procuradoria Provincial de Valência fez questão de pedir.
O Ministério Público valenciano considerou “absolutamente intolerável moral e criminalmente” que os detidos atuem com impunidade, numa altura como a atual, considerando as pilhagens como atos de "desprezo" pelas vítimas.
Várias regiões de Espanha estão desde terça-feira sob a influência de uma "depressão isolada em níveis altos", um fenómeno meteorológico conhecido como DANA em castelhano e como DINA em português.
O fenómeno causou chuvas torrenciais em diversos pontos de Espanha, sobretudo na costa do Mediterrâneo.
A região mais afetada foi Valência, no leste do país, com chuvas com níveis inéditos, que fizeram acionar os alertas e avisos mais graves da proteção civil e da meteorologia na terça-feira à noite.
Trata-se de um dos fenómenos extremos mais graves dos últimos 75 anos em Espanha, ultrapassando mesmo as inundações de Biescas (Huesca) em 1996, com 87 mortos, e as inundações de Turia em 1957, em que morreram entre 80 e 100 pessoas.
(última atualização às 19h20)