A irmã Marcela Catozza, missionária italiana instalada no Haiti desde 2006, diz que o país está a atravessar um período de forte turbulência política e social, com o caos e a violência a tomaram conta das ruas dos principais bairros das cidades, onde grupos armados, verdadeiros gangues, têm vindo a impor a lei do mais forte.
“É horrível, e é o povo que mais sofre. A cidade está nas mãos de gangues. O povo está faminto, as escolas estão fechadas. Não há trabalho, os hospitais estão encerrados porque não têm combustível para os geradores. É impossível viver nestas circunstâncias”, descreve à Fundação AIS.
Nestas declarações, a religiosa, que pertence à Fraternidade Missionária Franciscana, faz o retrato de um país em implosão, onde nada funciona, onde a pobreza, que já é crónica, se agravou imenso nos últimos tempos.
“A Igreja também está a ser atacada”, refere, aludindo ao assassinato de uma irmã, também italiana, Luisa del Orto, abatida a tiro no passado dia 25 de junho.
A religiosa lembra outros ataques à Igreja nomeadamente à Catedral de Nossa Senhora da Assunção. “Deitaram fogo à catedral e tentaram matar os bombeiros que chegavam para apagar as chamas. Depois, tentaram ainda destruir as paredes da catedral com um camião”, recorda.
“Em Port-de-Paix e em Les Cayes, e também noutras cidades, atacaram edifícios da Cáritas, levando tudo, incluindo toda a ajuda humanitária, e destruindo os escritórios do pessoal”, acrescenta a irmã que está, desde agosto, em Itália e que aguarda pelo regresso ao Haiti.
A própria missão das religiosas, numa das favelas da capital, também não escapou à violência.
“Há cerca de um mês atearam fogo à nossa capela. Tudo foi queimado. O altar, os bancos... Não sobrou nada. O Santíssimo Sacramento foi salvo porque o levo sempre para um lugar seguro quando parto”, esclareceu em declarações à AIS.
Não esqueçam o Haiti
Segundo a fundação pontifícia, a favela onde está situada a missão católica era uma lixeira há cerca de 20 anos. Agora vivem ali cerca de 100 mil pessoas. É um dos bairros de lata da capital haitiana, onde as famílias moram em habitações muito precárias, sem água corrente ou eletricidade.
Mas o pior de tudo - diz a religiosa - é o alheamento do mundo face à tragédia em que o Haiti está mergulhado.
“Parece que ninguém no mundo está interessado no que o Haiti está a passar. Claro que existem muitos outros problemas, especialmente na Europa, que está concentrada no que se passa na Ucrânia e na Rússia, e dominada pelo medo. Mas não se deve esquecer os outros lugares do mundo, como o Haiti, que têm vindo a suportar conflitos quase durante toda a sua existência”, defende a religiosa.
“Por favor, rezem pelo Haiti. Peçam ao Senhor que olhe por todos os haitianos, e que dê a paz ao seu povo…”, implora a religiosa que se encontra desde agosto, em Itália, a aguardar pelo regresso ao Haiti.
“É muito difícil para um missionário estar afastado da sua missão, é muito difícil… Mas tenho a certeza de que é isto que Deus me pede agora”, diz, explicando que dada a situação de enorme instabilidade que se vive no Haiti, foi-lhe pedido que, por prudência, aguardasse um pouco antes de efetuar a viagem de regresso a Port-au-Prince.